Há cerca de dois anos estive pela última vez na Europa. Visitei a França e a Bélgica. Somando-se a outras viagens internacionais, tive como comparar a nossa realidade com aquilo que se vive no Velho Continente.
Lá, as coisas funcionam como deveria ser por aqui. As pessoas aprendem nas escolas, dirigem seus carros em estradas conservadas e vivem em cidades cuja infra-estrutura foi concebida para fornecer às pessoas o melhor conforto possível. Os sinais de trânsito são obedecidos e os carros param para os pedestres na faixa a estes dedicada. Quando algo sai da normalidade, a estrutura judiciária age e, por incrível que nos pareça, corrige, pune o infrator.
O Metrô de Paris transita com pontualidade “britânica”. Nas estações, há cronômetros indicando, em segundos, a chegada do próximo trem e, quando o cronômetro zera, o trem chega! As pessoas são respeitadas, inclusive pelas outras pessoas. Nos hospitais há médicos e enfermeiras capacitados para atender os pacientes.
Se o turista compra qualquer produto, ele tem o direito de receber de volta o imposto que está embutido naquele bem, sabe porquê? Porque os europeus entendem que o turista não usou o serviço público disponível e, por isso, deve receber de volta o imposto, que, em tese, deve reverter em um serviço público de qualidade.
É incrível, não? Mas é verdade. Eles nos devolvem o imposto, em dinheiro vivo, na saída do continente. Basta você pedir ao comerciante um documento chamado de “tax free” (livre de taxa), apresentá-lo na aduana, no aeroporto e eles lhe entregam o dinheiro. Que beleza…
Por aqui, a realidade é bem outra.
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário – IBPT, a arrecadação federal apresentou, em 2010, crescimento nominal de R$ 137,13 bilhões (18,05%), enquanto a arrecadação dos estados foi de R$ 50,77 bilhões (17,51%) e os tributos municipais cresceram 14,27%, em termos nominais (R$ 7,14 bilhões). A carga tributária per capita do período cresceu 17,45% (nominal).
Para o presidente do IBPT, João Eloi Olenike, nos últimos dez anos os governos retiraram da sociedade brasileira R$ 1,85 trilhão a mais do que a riqueza gerada no País. “O agravante é que esses recursos não foram aplicados adequadamente, no sentido de proporcionar serviços públicos de qualidade à população. Todos nós precisamos cobrar da administração pública uma redução imediata da carga tributária, com a diminuição das alíquotas dos principais tributos, medidas que venham a ‘desafogar’ os cidadãos brasileiros, que estão no seu limite de capacidade de pagamento de tributos”.
O total da arrecadação em 2010 foi de R$ 1.290,97 trilhão, contra uma arrecadação em 2009 de R$ 1.095,92 trilhão, com um crescimento nominal de R$ 195,05 bilhões. Os tributos que mais contribuíram para tal crescimento foram: ICMS (R$ 40,72 bi), INSS (R$ 32,87 bi) e COFINS (R$ 21,80 bi) e Imposto de Renda (R$ 16,60 bi).
No ano de 2010, cada brasileiro pagou aproximadamente R$ 6.722,38, representando um aumento aproximado de R$ 998,96 em relação a 2009.
Isso mesmo, você pagou em 2010, como representante do brasileiro médio, R$ 6.722,38.
Esse imposto está embutido em tudo o que se compra: um pote de margarina que custa R$ 2,50, sem impostos, custaria R$ 1,50 e um quilo de açúcar que custa R$ 1,80 sairia por R$ 1,00.
Agora, sejamos francos, tudo isso que foi arrecadado pelo Poder Público, em todas as suas esferas, tem retornado de forma satisfatória para a sociedade?
No âmbito municipal, a sua cidade tem um serviço público de saúde que satisfaça as suas necessidades? As escolas públicas municipais ou estaduais funcionam a contento? Há rede de esgoto em sua rua? Aliás, a sua rua tem pavimentação satisfatória? O Trânsito funciona a contento? As leis são cumpridas? O Poder Judiciário lhe presta um serviço de qualidade?
A felicidade dos nossos governantes é que o povo, em sua esmagadora maioria, não tem como saber como deveriam funcionar as coisas por aqui. Não há referência para comparação.
Estamos tão acostumados a não ter nada, que qualquer coisa nos serve de bálsamo. E quando se cobra algo, os atuais governantes vêm com a mesma desculpa de sempre: Você está reclamando de quê? Antes você não tinha nada e agora reclama de “barriga cheia”.
A nossa referência para comparação não pode ser o passado, mas o que os outros países, desenvolvidos, apresentam para os seus cidadãos. Esse deve ser o nosso ideal. É assim que deve ser. Afinal de contas, não está faltando dinheiro para o governo, porque a cada ano ele arrecada mais.
Antes, nós não tínhamos estradas, hoje, as estradas que são reformadas não têm acostamento e se dissolvem com a primeira chuva. Mas, está tudo bem, pelo menos estão tapando os buracos, o que antes não se fazia… Ora, não se deveriam construir estradas com maior qualidade?
Antes, não tínhamos faculdades suficientes, hoje temos uma profusão de escolas superiores, mas privadas, subsidiadas com dinheiro público (FIES, etc.) e com uma qualidade de dar dó! Formam-se doutores, que são verdadeiros analfabetos funcionais.
Triste sina essa nossa. Sina de povo pobre, que não tinha nada e, por isso, qualquer coisa que vier será lucro. Sina de quem se deseja nivelar por baixo.
Meu sonho, como advogado, é ver pessoas processando o Estado por danos morais, quando tiver que penar na fila do hospital, sem atendimento adequado; ajuizando ações contra a Fazenda Pública, quando entender que a escola do seu filho não atende aos requisitos mínimos para que este possa ter uma educação de qualidade; quando tiver o seu carro danificado por culpa de uma estrada deficiente ou um buraco aberto na avenida e coisas semelhantes.
Mas aí você pode me refutar dizendo, como uma comentarista de outro artigo meu, processar usando um Poder Judiciário ineficiente e moroso? Pois é… Triste sina essa nossa, de País Pobre metido a “besta”, que não pode confortar o seu povo, mas quer fazer festa pro mundo inteiro ver.
Por: Carlos Cléber Couto Advogado
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