Umburanas, na microrregião de Senhor do Bonfim, uma das mais de 200 cidades baianas assoladas pela seca deste ano. Lá, 31% dos 17 mil moradores são analfabetos, de acordo com o IBGE. Nenhuma das nove unidades públicas de saúde locais tem equipamento de hemodiálise, serviço de emergência, internação ou UTI.
E, mesmo no ranking dos 20 municípios do estado com os piores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH), terá uma campanha a prefeito quase cinco vezes mais cara que a de Salvador, na proporção custo por habitante.
Os dois únicos candidatos de Umburanas declararam à Justiça Eleitoral a intenção de gastar R$ 1,3 milhão na campanha. A previsão de Roberto Bruno (PRP) foi de R$ 1 milhão. A da adversária, Mirian da Silva (PDT), mais R$ 300 mil. O que resulta em um gasto médio de R$ 76,47 por habitante.
Para efeito de comparação, em Salvador, a média declarada pelos seis prefeituráveis foi de R$ 15,80 por pessoa. Confrontado com os índices, Roberto Bruno contemporiza: “Foi um valor alto, que o representante da coligação daqui colocou. Devemos gastar 25% desse valor”.
Briga de milhões
Entre as 20 cidades que estão na rabeira do IDH baiano, Umburanas é a campeã no gasto de campanha. Mas não está sozinha. Juntos, os candidatos dos municípios menos desenvolvidos planejam gastar R$ 21,6 milhões nas eleições, média de R$ 45,74 por pessoa. Na maioria dos municípios da lista, apenas dois postulantes concorrem e, em 13 deles, a população não passa de 20 mil.
É o caso de Santa Brígida, com 15 mil moradores. Os dois concorrentes da cidade, situada na divisa com Sergipe, planejam gastar R$ 49,80 por habitante. E, assim como em 18 outros municípios com baixo IDH, Santa Brígida integra o rol dos assolados pela seca, com 86,5% da população afetada, de acordo com a Defesa Civil do estado.
Para chegar ao poder, sete candidatos das cidades menos desenvolvidas da Bahia estimaram gastos dignos de uma campanha nas maiores cidades baianas. Em Araci, no Nordeste baiano, a prefeita Maria Edneide Pinho (PSD) pretende gastar R$ 1,7 milhão na disputa pela reeleição no município de 51,2 mil habitantes. O valor é R$ 200 mil a mais do que foi previsto pelo seu único concorrente, o fisioterapeuta Antônio Carvalho Neto (PDT).
Ambos planejaram desembolsar mais do que o prefeito de Feira de Santana, Tarcízio Pimenta (PDT), que previu gastos de R$ 1,2 milhão. Com a diferença de que a população de Feira é dez vezes maior que a de Araci. E, para completar, tem fatores que encarecem uma campanha, como os custos com a produção de propaganda na TV e no rádio.
“Existem urgências aqui, com as quais esse dinheiro poderia ser gasto”, opina o vendedor Antonio Brito, morador de Araci há 36 anos. Para Brito, a educação é a maior necessidade do município, onde apenas três escolas públicas têm ensino médio e nenhuma delas é municipal.
Coordenadora de uma escola particular de Araci, Manuela Teixeira acredita que a grana da campanha seria melhor investida se aplicada na formação dos professores municipais. “Se esse dinheiro fosse empregado na saúde ou na educação seria insignificante, mas para uma campanha é alto”, avalia.
Tem razão: De acordo com o portal da prefeitura, de janeiro a junho de 2012, os gastos em saúde e educação somaram R$ 6,4 milhões e R$ 18,1 milhões, respectivamente.
Previsões milionárias
Entre os prefeituráveis das 20 cidades baianas que figuram no pódio do baixo desenvolvimento humano, o recordista em previsão de gastos de campanha eleitoral é José Valdo Evangelista (PSC), que disputa a prefeitura de Monte Santo, no Nordeste baiano. Zé Valdo, como é conhecido, informou à Justiça Eleitoral que pretende gastar R$ 1,9 milhão na disputa.
A previsão de investimento na campanha feita por seus três outros concorrentes foi mais modesta: R$ 750 mil. “Acho que eles vão gastar até mais do que o planejado”, opina o comerciante Dellano Santana, morador de Monte Santo, quinto pior IDH da Bahia.
Para Santana, o dinheiro teria melhor destino: a melhoria do sistema educacional da cidade, cuja taxa de analfabetismo passa de 40%, e dos estabelecimentos de saúde públicos, já que apenas uma das 17 unidades possui leitos para internação.
O administrador João Alfredo (PSB) também está na lista dos candidatos que pretendem gastar milhões na disputa. O prefeiturável de Itapicuru, município com o pior IDH do estado e com um dos 100 mais baixos do país, planeja gastar na eleição até R$ 1 milhão.
A cidade, situada na divisa com Sergipe, tem apenas 8,6% dos domicílios com saneamento considerado “adequado” pelo IBGE. A professora Madalena Sergino, moradora de Itapicuru há 40 anos, reclama das deficiências na educação e na saúde. Madalena conta que sempre se desloca para Salvador quando precisa de atendimento médico específico.
Com 32,2 mil habitantes, o município só possui oito estabelecimentos públicos de saúde, sendo que apenas um oferece atendimento de emergência e nenhum dispõe de aparelho de hemodiálise, mamógrafo ou ultrassom. Contactado, João Alfredo disse não ter nada a dizer sobre sua previsão de gasto de campanha. Em Jeremoabo, no Nordeste baiano, se os três candidatos juntassem o que pretendem gastar na campanha teriam R$ 2,4 milhões.
Para a professora Maria Tereza Vasconcelos, coordenadora de reforço escolar do município, os educadores de Jeremoabo “se esforçam, mas têm dificuldades”. O maior problema para os estudantes, segundo ela, é o acesso às salas de aula, já que 54,5% dos endereços da cidade estão na zona rural.
“Os alunos têm dificuldade de locomoção, principalmente na época de chuva”, conta. Com metade desse dinheiro daria para comprar dez unidades de ônibus escolar de ponta, como o Marcopolo Volare W8, com 24 lugares.
Fonte: Correio