O Juiz de Direito de Conceição do Coité, Gerivaldo Neiva, negou o pedido do Sindicato dos Servidores Municipais que pretendia o bloqueio de R$ 347.658,97 (trezentos e quarenta e sete mil, seiscentos e cinquenta e oito reais e noventa e sete centavos) da conta em que são depositados os recursos de Fundo de Participação dos Municípios, através de Mandado de Segurança. Além do bloqueio, o Sindicato pediu também à Justiça que o valor fosse colocado à disposição dos professores da rede municipal de ensino e servidores da Secretaria de Educação, sendo em seguida partilhado entre aqueles servidores que teriam ficado sem receber integralmente o salário do mês de dezembro de 2012.
Segundo a decisão do Juiz, o Mandado de Segurança não pode substituir a Ação de Cobrança, conforme Súmula do Supremo Tribunal Federal, pois o deferimento da liminar para bloquear os valores poderia gerar uma intromissão indevida na execução do orçamento municipal e quebra na ordem de pagamento dos Precatórios.
A decisão do Juiz não significa que os professores da rede municipal e demais servidores não teriam o direito ao recebimento do salário não pago pela gestão anterior, mas que devem ingressar com a Ação de Cobrança e se submeterem a ordem de pagamento dos precatórios.
Eis a decisão do Juiz:
Processo Número: 0000527-88.2013.805.0063 e outros
Impetrante: Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Conceição do Coité – Ba.
Impetrado: Prefeito do Município de Conceição do Coité – Ba.
O Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Conceição do Coité – Ba., qualificado nos autos, ingressou com quatro (04) Mandados de Segurança Coletivos, em favor de parte de seus associados, sendo todos com o mesmo objeto e causa de pedir. Por esta razão, de logo, determino a reunião dos referidos processos.
Pretende o impetrante – Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Conceição do Coité – Ba. -, alegando pagamento incompleto dos salários do mês de dezembro de 2012, o bloqueio de R$ 347.658,97 (trezentos e quarenta e sete mil, seiscentos e cinquenta e oito reais e noventa e sete centavos) da conta referente ao Fundo de Participação dos Municípios (FPM) “e que seja posta à disposição dos representados, sendo partilhado conforme tabela demonstrativa de crédito dos representados”.
Juntou procuração e centenas de documentos.
Da atenta leitura dos autos e documentos, depreende-se, sem sombra de dúvidas, que o impetrante utiliza-se do presente Mandado de Segurança como instrumento de cobrança de parte dos salários de seus representados referente ao mês de dezembro de 2012, visto que requereu liminarmente o bloqueio do valor em conta de FPM e a disponibilidade e partilha em favor dos servidores elencados em planilha oferecida. Ao final, requereu a confirmação da medida liminar.
Assim, antes de adentrar ao mérito para discutir se os salários dos representados foi pago a menor pelo impetrado, impõe-se discutir se a via eleita – o Mandado de Segurança – é a apropriada para o caso.
De início, portanto, torna-se obrigatório citar as seguintes Súmulas do Supremo Tribunal Federal:
Súmula 269 – O mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança.
Súmula 271 – Concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria.
Sendo assim, sob este comando sumular, não seria possível substituir a Ação de Cobrança, tendo como objeto salários pagos a menor, por Ação de Mandado de Segurança.
Neste sentido, o Tribunal de Justiça da Bahia decidiu recentemente:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. SENTENÇA JULGANDO PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO MANDAMENTAL, DETERMINANDO QUE AS AUTORIDADES IMPETRADAS INDIQUEM AO IMPETRANTE, MEDIANTE COMUNICAÇÃO ESCRITA, A SUA LOTAÇÃO E INDIQUEM SUAS ATIVIDADES FUNCIONAIS. IMPOSSIBILIDADE DE PAGAMENTO DE VENCIMENTOS ATRASADOS, POIS O MANDADO DE SEGURANÇA NÃO PODE SER UTILIZADO COMO SUBSTITUTIVO DE AÇÃO DE COBRANÇA. INEXISTÊNCIA DE CONTROVÉRSIA ACERCA DA CONDIÇÃO DE FUNCIONÁRIO PÚBLICO CONCURSADO DO IMPETRANTE. DIREITO DO SERVIDOR CONCURSADO EXERCER AS SUAS FUNÇÕES. 1. Sendo o impetrante servidor público concursado, somente por processo administrativo disciplinar, assegurando o contraditório e a ampla defesa, poderia a Administração Pública afastá-lo de suas funções. REEXAME NECESSÁRIO CONHECIDO E IMPROVIDO.
Reexame Necessário: 0000369-84.2009.8.05.0253 – Relatora: Maria Marta Karaoglan Martins Abreu – 1a C. Cível. – J. 19.11.2012.
No mesmo sentido, o Superior Tribunal de Justiça decidiu:
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. LEI 8.880/94.
TRANSFORMAÇÃO DE CRUZEIROS REAIS PARA URV. EFEITOS FINANCEIROS PRETÉRITOS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 269/STF. 11,98%. PERDAS SALARIAIS NÃO COMPROVADAS DE PLANO. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE.
I – É inviável no âmbito do mandado de segurança a pretensão de pagamento de perdas salariais decorrentes da conversão dos salários dos servidores públicos em URV, porquanto o mandado de segurança não substitui ação de cobrança. (Súmula 269/STF).
II – Se ausente prova documental incontrastável das perdas decorrentes da conversão salarial, não se admite o mandado de segurança, porquanto nesta via é inadequada a dilação probatória.
Recurso ordinário desprovido.
(RMS 22.343/AM, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 12/09/2006, DJ 09/10/2006, p. 318)
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSUAL CIVIL.
COBRANÇA DE VALORES PRETÉRITOS.
1. A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça e do Pretório Excelso recolhem o mandado de segurança como ação constitucional, destinada à proteção de direito líqüido e certo contra ato abusivo ou ilegal de autoridade pública, não podendo ser utilizado como ação de cobrança, sob pena de desvirtuamento da sua essência constitucional.
2. Recurso improvido.
(RMS 11.493/ES, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, SEXTA TURMA, julgado em 11/10/2005, DJ 12/12/2005, p. 422)
Não é do desconhecimento deste juízo, por fim, que existe precedente no STJ acerca questão (MS 12.397 – Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, em 09.04.2008), embora anterior a vigência da nova Lei do Mandado de Segurança, admitindo a possibilidade de cobrança de salários por via do Mandado de Segurança. No entanto, observa-se no referido acórdão que o eminente Ministro justificou sua decisão, flexibilizando a aplicação das Súmulas do STF, alegando que a “alteração no texto constitucional que excluiu do regime de precatório o pagamento de obrigações definidas em lei como de pequeno valor aponta para a necessidade de revisão do alcance das referidas súmulas e, por conseguinte, do disposto no art. 1º da Lei 5.021/66, principalmente em se tratando de débitos de natureza alimentar, tal como no caso, que envolve verbas remuneratórias de servidores públicos”.
No presente caso, porém, pretende o Imperante o bloqueio de verba pública no montante de R$ 347.658,97 (trezentos e quarenta e sete mil, seiscentos e cinquenta e oito reais e noventa e sete centavos). Sendo assim, portanto, não se pode flexibilizar as Súmulas do Supremo Tribunal no presente caso, sob pena de indevida intromissão na execução do orçamento municipal e violação do Direito (Súmulas do STF e artigo 14, § 4o, Lei 12.016/09) ao se permitir a substituição da Ação de Cobrança por Mandado de Segurança para recebimento de salários pretéritos recebidos a menor e quebrar a ordem de pagamento dos precatórios.
Por todo o exposto, tem-se que o Impetrante utilizou-se de via não adequada para o fim pretendido e, neste caso, conforme o disposto no artigo 10 da mesma Lei (“A inicial será desde logo indeferida, por decisão motivada, quando não for o caso de mandado de segurança ou lhe faltar algum dos requisitos legais ou quando decorrido o prazo legal para a impetração”.), INDEFIRO de plano a Inicial e determino o arquivamento dos presentes autos.
Sem custas e sem honorários.
Publique-se. Registre-se. Intime-se.
Conceição do Coité, 28 de fevereiro de 2013.
Bel. Gerivaldo Alves Neiva