Como soe acontecer ao longo da história, graças a fatos lamentáveis, o Brasil se reencontra com processos de mobilização popular. Diferentemente da campanha das Diretas Já e do impedimento de Collor, desta feita as Ruas não são ocupadas por multidões, que optam pelas redes sociais. Mas nem por isso se pode dizer que é menor o poder de pressão das pessoas.
Muitos fatores explicam essa mudança de estratégia. Seguramente, não se pode desconsiderar o impacto negativo que a experiência do luloptismo no Poder trouxe a Nação, reproduzindo as velhas práticas que tanto condenou quando estava na oposição. A repetição do mais do mesmo desencantou as formas tradicionais do se fazer política.
Reproduzindo em Terras brasilianas o que já se verificou em diversos Países do Mundo, os movimentos sociais vêm perdendo sua verticalidade. Nesta perspectiva, o espaço fluído da internet é o cenário apropriado para que os grupos de pressão assumam a plenitude de sua horizontalidade. E daí tem-se as adesões maciças as petições públicas, como nos casos da eleição de Renan Calheiros para a Presidência do Senado ou de Marcos Feliciano para a Presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados.
Conquanto essas petições públicas sejam manifestações do empoderamento nacional, numa clara prova de que ainda nos resta capacidade de indignação, é preciso refletir sobre sua eficácia em médio e longo prazo. Deve-se indagar se a indignação está corretamente canalizada. Não se discute que os dois personagens em questão são a mais eloqüente caricatura da decomposição moral da ação política. Porém, se foram alçados a postos tão importantes no Congresso Nacional, é porque antes de mais nada foram investidos de mandatos populares por seus concidadãos. E não são eles os únicos exemplares de “políticos menores” que tem assento no Legislativo. E, com isto, pode-se desapeá-los dos seus cargos, mas sem a garantia de que sejam substituídos por gente de melhor envergadura.
Daí o risco de se fulanizar a indignação coletiva, pois, ao trocar seis por meia dúzia, poder-se-á chegar a conclusão de que, na prática, não valeu a luta. É o mal que nos vem da cultura personalista e do imediatismo de nossas ações.
Longe de mim pecar contra essas manifestações. Ao contrário. Foi graças a elas que aprovamos uma Lei que pune a compra de votos e, mais recente, a Lei da Ficha Limpa. Entretanto, por sua horizontalidade, esses movimentos padecem de maior consequencialismo. Insurge-se contra certos fatos, mas as ações não são direcionadas ao combate as suas raízes.
Temos uma extensa pauta a enfrentar, a fim de que sejam extirpados os vícios de nosso sistema político. Porém, temo que movimentos horizontais consigam empreender marchas sem perda de rumos. Entretanto, força é reconhecer a crise de lideranças vivida pela sociedade. Nenhum processo histórico ocorreu sem algum grau de dirigismo. A questão, pois, é a legitimidade para dirigir o atendimento de uma agenda nacional.
A experiência das leis de iniciativa popular acima indicadas é reveladora de que as instituições e não pessoas são os melhores timoneiros de transformações sociais. Sem diminuir a importância dos movimentos horizontais, se entidades como OAB, ABI, CNBB, dentre outras, não assumirem papel proeminente em uma agenda reformadora, corremos o risco de ver o que ainda resta de indignação popular terminar como as primaveras árabes. Fica, porém, uma alerta: para legitimarem-se para ser interlocutoras da população, as instituições devem merecera sua confiança, pois a crise de representatividade de nossa democracia é antes de mais nada uma crise moral.
MARIO LIMA
ADVOGADO E PROCURADOR DO ESTADO DA BAHIA