Como sabem, sou Juiz de Direito e membro do Poder Judiciário do Estado da Bahia. Tenho um orgulho muito grande de ser magistrado e não consigo me imaginar em outra profissão. Diferentemente de outros colegas que ingressaram na mesma época, alguns já perto da promoção para Desembargador, resolvi construir minha carreira em Comarca do interior, pois gosto da vida interiorana e de me relacionar com a comunidade.
Sofro todas as angústias próprias de um juiz. A vontade de resolver todos os casos, de levar a paz à comunidade, de ver todos felizes e fartos… mas a realidade e estrutura que disponho não me permite isso. Tenho a consciência de que não sou um super-homem, mas apenas um Juiz de Direito com todas as limitações de um ser humano. Mesmo assim, não meço esforço para fazer o máximo possível, mas também não me acomodo diante da precariedade do Poder Judiciário da Bahia e mantenho minha postura crítica com relação ao Tribunal de Justiça da Bahia. Nada pessoal. Minha crítica se dirige à instituição.
Digo isso porque me sinto profundamente constrangido quando ouço coisas do tipo “a justiça da Bahia é a pior do Brasil”, “pense em algo absurdo, acontece no TJBA”, “existe a justiça ruim e a da Bahia” etc. O mais constrangedor de tudo isso, no entanto, é saber que, de fato, o Judiciário Baiano é o mais moroso do Brasil e que sempre fica nas últimas colocações com relação ao cumprimento das metas do CNJ que dizem respeito à produtividade.
Há poucos dias, por exemplo, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) divulgou o relatório do cumprimento das metas nacionais do Poder Judiciário de 2009 a 2012. (acesse aqui). Com relação às metas relacionadas ao julgamento de processos entrados e arquivados, a situação do judiciário baiano não é das melhores.
Com relação à meta 02/2009 (Identificar os processos judiciais mais antigos e adotar medidas concretas para o julgamento de todos os distribuídos até 31.12.2005 em 1º, 2º grau ou tribunais Superiores), o TJBa cumpriu irrisórios 58,20% da meta, em ultimo lugar.
Em 2010, a meta 02 determinava o julgamento de todos os processos de conhecimento distribuídos até 31.12.2006. Mais uma vez, o TJBa foi um dos ultimos colocados com o cumprimento de apenas 54,99% do meta.
Em 2011 não houve meta especifica para julgamento de processos e em 2012 a meta 01 estabelecia que os tribunais deveriam julgar quantidade maior de processos de conhecimento do que os distribuídos em 2012. Para não variar, o TJBa foi novamente o ultimo colocado com o cumprimento de apenas 66,73% da meta.
Por conta de tudo isso e muito mais, a Corregedoria Nacional de Justiça, órgão do CNJ, deu início nesta semana a uma nova correição nas unidades administrativas e judiciais do Tribunal de Justiça da Bahia, sob argumento de que o Tribunal não teria cumprido “determinações da Corregedoria ao TJBA após inspeção realizada em julho do ano passado”. Leia mais aqui. É um vexame atrás do outro…
A questão agora é entender as razões que levam o judiciário baiano a este vexame nacional. Sei que esta não é tarefa para um magistrado, mas para uma equipe capacitada em gerenciamento, orçamento, administração e outros conhecimentos necessarios para radiografar o Poder Judiciário da Bahia e detectar seus males.
O que sei, e nem preciso de uma equipe capacitada para isso, é que sem democratizar o poder jamais sairemos da “lanterna” no cumprimento das metas e continuaremos sendo o pior do Brasil. De nada adianta a boa intenção do próximo presidente se ele continuar sendo escolhido apenas pelos próprios pares e sem qualquer discussão com os juízes e servidores. Como se diz por aí, de boa intenção o inferno está repleto!
Por fim, além de criticar e mostrar esta realidade, o que posso contribuir agora é fazendo minha parte no cumprimento das metas que me são cobradas. Em 2012, por exemplo, a Comarca em que atuo como juiz titular recebeu 2.155 processos novos e foram arquivados 2.012 durante o ano. Assim, a Comarca de Conceição do Coité (juiz e servidores) cumpriu 93,36 % da meta enquanto a média baiana foi de 66,73%.
* Juiz de Direito (Ba), membro da Associação Juízes para a Democracia (AJD) e Porta-voz no Brasil do movimento Agentes da Lei Contra a Proibição (Leap-Brasil).