Quando o cardeal Jorge Mario Bergoglio foi eleito o chefe supremo da Igreja Católica, não se podia imaginar qual seria o seu programa de governo, que atitudes tomaria para conter e punir os casos de abusos sexuais a menores, como interviria na política de administração financeira do IOR (Banco do Vaticano) e se conseguiria vencer os obstáculos instaurados pela própria burocracia curial romana. Mas a surpresa na escolha do nome comprovou que o purpurado argentino era o melhor candidato para suceder Bento 16; um sacerdote que escolhe o exemplo de humildade de São Francisco de Assis para mostrar que a igreja, mesmo com algumas evoluções e maior sensibilidade comunicativa para alcançar os fiéis, necessitava resgatar a importância da mensagem original do cristianismo. O Papa Francisco, muitas vezes comparado a alguns de seus predecessores, exibe um carisma que se estampa num sorriso de avô ou que se conecta paralelamente com o jovem via rede social e quase sempre bendize crianças em suas caminhadas com o papamóvel. Ele atinge a todas as idades, recebe elogios de católicos e não católicos; converge sobre sua imagem um montante de admiradores recentes e extasiados.
A conta do sumo pontífice no Twitter é a segunda com o maior número de seguidores e seus tweets são retuitados em média 11 mil vezes. É uma maneira simples e objetiva de alcançar as pessoas. Mas além disso, a simples presença do bispo de Roma que deveria encantar pela carga de tradição existente em sua posição hierárquica na igreja e por ser ele o depositário da fé, surpreende também pelo ineditismo da escolha do Sacro Colégio em dar ao mundo o primeiro papa chamado Francisco, latino-americano e jesuíta. Existem surpresas que não se dissipam apenas com o passar dos dias; parece que o tempo somente colaborou para a aceitação desta nova e emblemática figura da igreja. E sua primeira viagem internacional acontece justamente no Brasil.
É fácil notar que as grandes emissoras de televisão – com exceção da TV Record, por motivos muito óbvios –, construíram em pouco tempo a imagem deste argentino que chegava ao país para participar da Jornada Mundial da Juventude. Como em março, por motivo da cobertura do conclave, os apresentadores dividiam a tela com teológos e sacerdotes para reconstruirem as simbologias da igreja. O Papa Bergoglio foi mostrado apenas por seu lado espiritual, em detrimento do poder temporal e político também representado na pessoa do chefe da Cidade Estado do Vaticano.
As críticas explícitas e veladas aos gastos públicos com a viagem do papa ao Brasil desapareceram como fumaça no ar. Estas críticas têm destino certo e não incomodam ao papa. Muito pelo contrário. Ele incita os fiéis a protestarem e saírem às ruas. Diz isso não com a ignorância de quem pouco sabe da realidade latino-americana, mas como alguém que conhece as dificuldades dos países ao sul do continente. Acolhido com graças pelos brasileiros, Bergoglio entra para a história. Recebe como prêmio um evento da magnitude da JMJ, a facilidade de ser visto através dos meios em convergência e a satisfação de visitar o país hermano.
ESTILO BERGOGLIO
A vanglória de todo e qualquer brasileiro é ser representado como um sujeito hospitaleiro e que adora receber as pessoas, mesmo com todas as adversidades. A favor deste argumento certamente estará o papa e seu séquito composto por cardeais, prelados, camareiros e jornalistas italianos. Hão de recordar pelos próximos dias em programas especialmente da TV pública italiana (RAI) as conquistas e satisfações da mensagem comunicativa de Francisco nesta viagem não somente ao Brasil, mas ao mundo. Não basta a um papa ser apenas pop. Para ele, mais importante que a presença dos fiéis para vê-lo, é a presença dos fiéis que desejam ouvi-lo. A comunicação neste pontificado, embora ainda muito cedo para a análise, rompe alguns paradigmas que sempre cercaram a figura introspectiva dos papas. O momento é de renovação, não somente porque há um novo homem a dirigir a igreja, mas justamente porque este homem sabe a quem e como enviar sua mensagem.
O mundo somente costuma julgar um pontificado quando ele chega ao fim e seu espólio desce até as catacumbas vaticanas, no entanto, Francisco exige dos homens de imprensa, dos religiosos e das pessoas comuns um parecer, um pequeno relatório dos primeiros cinco meses de seu ministério. Destacar sua luta ferrenha contra os abusos sexuais, a reforma da cúria romana e do IOR, o zelo ao sentido de humildade e os olhos voltados aos excluídos. Passa pelo Brasil e deixa um rastro carismático, midiático e espiritual. O mundo, a partir desta viagem, o verá com outros olhos, com outras câmeras, posts e matérias.
Mailson Ramos é bacharelando em Comunicação Social, habilitação em Relações Públicas pela Universidade do Estado da Bahia e colunista do Observatório da Imprensa.