A ideia de que os usuários das redes sociais conferem às suas identidades no ciberespaço aspectos inerentes à identidade real decaiu há muito tempo; não somente os teóricos podem perceber que atualmente estas identidades assumiram valores interdependentes e retornaram a um patamar de opacidade, onde se deseja muito mais a privacidade do que exibição de suas particularidades em timelines. Existe de certa maneira um eu oculto que tende a se esconder cada vez mais, fugir de posições conflitantes, criar mecanismos para evidenciar uma diferença entre a icônica personalidade de um avatar e a imagem concreta.
Todas as mídias sociais atravessaram ou ainda atravessam este momento de reafirmação das identidades. Mas os exemplos mais claros destas transformações podiam ser vistos no Twitter e Facebook, onde os usuários criaram a metodologia da exibição da vida real no ciberespaço, calcada no detalhamento de cada ação do cotidiano. Fundamentou-se um hábito e até então se imaginava que para isto serviam as mídias sociais. Com o aperfeiçoamento e amplificação dos interesses, sobretudo comerciais, as mídias sociais invadiram o mercado e atribuíram à boa imagem (organizacional ou pessoal) um fator positivo como quesito de competitividade.
Mas a grande virada das mídias sociais foi a percepção do poder de mobilização política imbricada em seus espaços aglutinadores: comunidades e grupos. A partir desta perspectiva e mesmo possibilidade foi possível compreender o fenômeno das multidões que foram às ruas no mês de junho. Cada vez mais os usuários têm se apropriado das mídias sociais como espaço de discussão política como jamais se viu. A questão suscita desdobramentos. Os usuários se sentiram encorajados a se manifestarem com o auxílio das mídias sociais ou elas foram apenas canais de comunicação para a transmissão da mensagem? De que maneira as mídias sociais foram tão preponderantes e indispensáveis para esta manifestação, se há vinte anos, por ocasião do impeachment do presidente Collor, houve também manifestações de proporções imensuráveis e sem a existência das redes?
As possibilidades comunicacionais baseadas em ferramentas das mídias sociais são incontáveis. Mas o sentido de observação deve ser muito mais amplo. Navegar nas redes todos os dias é momento oportuno para traçar um paralelo das alterações, das percepções, compreender o mundo através de um olhar mais crítico. Não é possível rechaçar as mudanças tecnológicas tampouco as novas linguagens baseadas em signos e códigos digitais. Por estes canais transitam a política, a identidade e mesmo a história de uma nação. O ciberespaço exige do usuário uma sensibilidade crítica da qual muitos deles fogem aqui fora. E aparentemente a pressão tende a aumentar.
Mailson Ramos é bacharelando do curso de Comunicação Social | Relações Públicas pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB). É colunista do Observatório da Imprensa e do portal Calila Noticias. Criou e administra o blog Opinião & ComTexto. É autor do livro Anjo Devasso e Outros Contos, publicado pela Livraria Saraiva.