Não é desta maneira tosca e atrevida que o país e a sociedade encontrarão o caminho; o Brasil não necessita de jornalistas incapazes de analisar os fatos sob a ótica de sua profissão e experiência; o país que tem problemas estruturais relacionados à segurança pública não pode ser acometido pela idealização do caos, de que tudo está totalmente perdido e as instituições não podem resolver mais nada; o poder de resolver estaria nas mãos dos cidadãos para prender e matar tão logo se sinta aviltado.
Rachel Sheherazade fugiu à regra não apenas profissionalmente. Seu comentário representou um cisma de classe, uma ojeriza disfarçada, uma ironia sem precedentes na TV brasileira. O Estado de Direito foi colocado sob o jugo de alguém que pelas convenções deveria criticá-lo com respeitabilidade e a responsabilidade de um bom jornalista. Sheherazade não foi e talvez não seja uma boa jornalista não apenas por ter criticado o Estado – passível de crítica – mas por ter debochado dos direitos humanos.
O povo brasileiro independe de análises como estas para formar suas opiniões, pois cada um sabe dos problemas da sociedade e como devem proceder para solucioná-los ou até mesmo conviver com eles. Os apresentadores de telejornais – insensíveis e robóticos em sua maioria – talvez ainda imaginem que suas palavras causem um efeito devastador. Não é verdade. Com o desenvolvimento do senso comum, o aumento da escolaridade, não mais um comentário infame como este poderia incitar discussões a não ser por sua irrelevância. É verdade que um jornalista não é pago para analisar aquilo que já foi exaustivamente analisado ou criticar superficialmente aquilo que dezenas de outros jornalistas tentam esquecer, mas brincar com assunto sério somente para demonstrar a incapacidade dos governos diante duma crise na segurança pública – coisa que estamos carecas de saber – não merece sequer adjetivação.
Questionou-se naturalmente a que interesses Rachel Sheherazade serve, quais são seus planos e se ela algum dia chegará à Globo ou a alguma dessa corporações do obscuro que insistem em implantar o terror no país. Será que qualquer dia desses nos depararemos com o olhar sarcástico da apresentadora do Jornal do SBT numa dessas edições de algum telejornal global? Até quando a emissora de Silvio Santos e seu diretor de jornalismo comprarão as brigas pelos comentários da extremada jornalista do noticiário noturno? Se não fosse a população capaz de discutir o que interessa e o que não interessa nas notícias que nos flecham o dia inteiro, talvez o discurso de Sheherazade fosse válido. Não é. Jamais será enquanto necessitarmos colocar em primeiro lugar o direito de homens – não em sua maioria – que se entregaram ao mundo do crime pelas chances que o sistema não lhes deu. Não necessitam de adoção. Necessitam de discussões mais sérias e pautadas na realidade brasileira, nada maquiada, distante de um estúdio de TV onde a máscara do politicamente correto provoca asco.
Mailson Ramos é estudante de Relações Públicas e autor