A morte de Eduardo Campos, candidato do PSB à presidência, acirrou a disputa pelo mais alto cargo da república brasileira. A trágica partida transformou o ex-governador de Pernambuco num ícone, um objeto de transferência simbólica especialmente para a imagem de sua sucessora no pleito, a então vice-candidata, Marina Silva. Apenas um evento catastrófico e inesperado poderia combalir as estruturas pré-estabelecidas que davam à atual presidente, por exemplo, a tranquilidade de mais uma vitória eleitoral. As estruturas foram abaladas pelo óbvio da dor da despedida, pela referência diária da imagem de um homem que poderia assumir o país e que faleceu numa fatalidade, deixando à sua sucessora um poder político incalculável até a decisão final em Outubro próximo. Mas o que fará Marina Silva deste poder? Que cartas deverá utilizar neste jogo de interesses pela boa imagem? Que atitude serão tomadas pelos outros candidatos nesta peleia?
Dilma Rousseff, candidata do PT, se vencia com os pés amarrados nas costas, sofreu com a interferência do destino uma queda natural. Esta queda pode representar números negativos. No entanto, é a candidata com potencial para vencer as eleições, talvez até no primeiro turno, não pé possível mais prever. Aos idílicos teóricos da conspiração, o resultado das últimas pesquisas mostra o quanto a tragédia que se abateu sobre Eduardo Campos foi devastadora para seus adversários, na questão humana e na política; com a morte do candidato do PSB, o cenário foi alterado de tal forma brusca que assassiná-lo, teria representado um tiro no pé, de cada partido, de cada candidato. Poderiam ter entregado nas mãos de Marina Silva o poder simbólico que ela sozinha não poderia criar. Atualmente ela possui este poder duplicado: o país a reconhece e reconhece, sobretudo, o legado de Campos que ela carrega consigo.
Em outras palavras, Marina Silva não poderá relegar ou fugir da responsabilidade de conduzir consigo os ideais de Eduardo Campos. Todo e qualquer atrito com sua imagem será relacionado a futuras quebras com o pacto de campanha e programa de governo. Até as eleições, quando o voto decidir quem deverá ocupar a presidência ou ainda uma nova disputa de segundo turno, Marina Silva deverá seguir à risca os desígnios do partido e dos assessores de campanha ainda muito acostumados ao estilo de Campos. No entanto, em certo momento da campanha, não será mais a essência do ex-candidato a influenciar suas decisões. Será hora de dar cor e espírito à campanha de acordo com a imagem presentada: Marina deverá abandonar a ideia de condutora de uma mensagem para se tornar mensagem. Correrá o risco de causar um impacto muito positivo ou de desagradar quem até o momento a seguiu.
Os candidatos seguem em ritmo ainda tranquilo. A campanha deve acirrar-se em setembro. Neste período será possível conhecer a verdadeira face dos candidatos em batalha. Entra em jogo o direito inalienável de agredir, em doses metódicas e letais, com efeitos colaterais e/ou extremamente positivos. Em cena aparecem candidatos atores que se revezam na interpretação de vítimas ou vilões; isso pode se alterar em dias ou apenas em horas. Quem bateu num instante, no outro poderá estar desempenhando a sofrível interpretação de injustiçado. E assim sempre acontece com a velha política brasileira. Quem tem nas mãos uma arma infalível pode de repente perceber que a arma será usada contra si mesmo. Política, por mais previsível que seja não se molda às análises e muito menos às pesquisas. Vai passando o tempo e as práticas que parecem arcaicas, sobrevivem à evolução tecnológica, à melhor retórica, ao discurso ensaiado exaustivamente.
Marina Silva, embora rompa claramente com alguns pensamentos de Eduardo Campos, figura positivamente entre seus pares dentro do PSB. Não havia outra escolha a se fazer. Ela resguarda consigo os poucos meses de convivência, mas a grande escolha de ser vice numa chapa envolvida entre duas ideologias políticas que combinam: o socialismo e a sustentabilidade. Isso não significa a vitória, não significa de modo algum a garantia de votos pelo país afora; mas pode representar uma ameaça iminente à campanha de Dilma Rousseff, candidata que lidera todas as pesquisas e é atual presidente da república. No final das contas, o povo é quem toma sob suas mãos a decisão de eleger seus representantes, de se envolver na disputa, de aderir às ideologias e especialmente às simbologias.