Produzir conteúdo e publicar noticia não é mais a essencial atribuição da imprensa brasileira, especialmente neste momento em que a campanha eleitoral suscita a atenção dos cidadãos. A imprensa causa impacto na decisão popular quando oferece a condição de discutir as propostas dos candidatos, por exemplo, ao organizar debates e sabatinas. Os postulantes são acompanhados diariamente até o final do pleito quando os vitoriosos esbanjam alegria nos diretórios e os perdedores lamentam a derrota cercados de faces frustradas. A imprensa está entranhada na movimentação dos candidatos atentos a um equívoco, uma frase célebre para lembrar oportunamente no dia da decisão, uma incoerência discursiva. Como um termômetro autômato ela mensura a qualidade dos enfrentamentos ao mesmo tempo em que insufla ou abafa as polêmicas. Dela depende a valorização das discussões mesmo quando estas são colocadas em campos neutros e inacessíveis. Por isso as vozes sempre incessantes da imprensa lutam numa guerra a favor da democratização da informação no que diz respeito à amplificação irrestrita da produção de conteúdo; luta pelo poder de influenciar a opinião pública.
Um simples deslize em frente às câmeras ou uma frase infeliz publicada na manchete de um grande jornal podem não ser tão incômodos quando uma falha grotesca na participação de um debate nacional exibido pela TV Aberta. A imprensa é responsável por, de certa maneira, monopolizar o debate dos candidatos aos cargos eletivos nas eleições; o sufrágio advindo das mãos do eleitor, frente à urna eletrônica, não nasce senão duma análise anterior embasada e reforçada pelas matérias que se lê, vê e ouve. Todo sujeito neste período goza da referência que lhe concedem os noticiários todos os dias. E sente-se capaz de decidir: o novo presidente deve diminuir a Taxa Selic. Especialistas em tributação e comentaristas políticos, navegantes constantes das redações jornalísticas, podem levar ao conhecimento da população aquilo que ela sequer supunha existir. Mas está no jornal e o fator imprensa decide, sob suas regras, a importância do assunto naquele ou noutro momento.
A história da manipulação da opinião pública por parte da imprensa não adquire vulto na compreensão deste artigo. O fato desta discussão é que não há possibilidade de diminuir a influência da imprensa numa sociedade democrática em que a maioria das pessoas fundamenta suas opiniões a partir do contato com o conteúdo por ela criado. E de certa forma, a estrutura social não poderia prescindir desta condição. A imprensa brasileira é tão responsável pela eleição ou rejeição de determinados candidatos, sejam eles aspirantes ao menor ou maior dos cargos públicos desta república, que não é possível pensar numa disputa sem as polêmicas e discussões, os deslizes (da própria imprensa) e o poder de disseminação da mensagem. Aos poucos a perspectiva ganha o vulto da escolha. Candidatos deixam de ser meros personagens de um enredo fiel às campanhas institucionalizada e midiática para se tornar o destinatário do voto. A relevância aí se encontra.
A cada pleito, de dois em dois anos, a imprensa busca refazer-se. Abusa da tecnologia, dos gráficos computadorizados, dos efeitos e luzes para ilustrar as campanhas. Ilustrando-as transforma o conteúdo em necessidade, a noticia ganha aspecto de alimento para os debates; os debates são nada mais que combustível para a queima das polêmicas, produto incendiário das próprias campanhas. No ciclo eleitoral formado por imprensa, opinião pública e políticos é importante estar atento ao valor do conteúdo. Há várias possibilidades de reconhecer na imprensa a fidelidade dos fatos e nada mais; como também é possível desagradar com algumas ações pontuais nunca esclarecidas, aliás, sempre escusas. Se a imprensa é um importante fator na valorização das informações para as escolhas feitas pelo povo não há motivos para criar alarde e sustentar teorias. A preocupação também não reside mais na polêmica da imparcialidade, porque a moda agora é ser coerente.
Mailson Ramos é idealizador do blog Opinião & Contexto