A Câmara dos Deputados, que representa os interesses republicanos dos brasileiros, vai começar a nova legislatura de uma forma engraçada, se não fosse patética. Acredite meu senhor e minha senhora que de um total de 513 deputados federais eleitos outro dia, a partir de janeiro apenas 35 deles (o que equivale a meros 6,8 por cento), foram realmente votados. O restante conseguiu o mandato graças à cruel organização política nacional, em que a totalização dos votos dados à legenda, aos candidatos mais expressivos do seu partidos ou coligação, o beneficia diretamente. Não receberam votos suficientes, mas pouco importa. Ficaram com as sobras.
Exemplo risível: o humorista Tiririca cujo lema foi “Vote no Tiririca, pois pior não fica”, e desta vez teve como slogan “Tá cansado de política. Vote no Tiririca”, conseguiu mais de um milhão de votos. Levou em seu rastro candidatos que não passaram de alguns punhados de votos; que não conseguiram alcançar o que se chama de quociente eleitoral (a quantidade necessária de votos para eleger um deputado e que é definido pela divisão do número de votos válidos pelo número de vagas que cabe a cada estado). Na Bahia, Lúcio Vieira Lima conseguiu alcançar o quociente.
Eu estava avaliando como vota o eleitor brasileiro, quando me deparei com um escrito que harmonizava com o meu, elaborado pelo advogado Leonardo Correia, do Intituto Liberal. Ele, como eu ou vice-versa, tem a nítida impressão que a configuração do voto do brasileiro tem a cara, o cérebro e as cicatrizes do personagem Frankenstein. Aquele que nos fazia perder o sono quando criança.
O eleitor não pensa naquilo que está escolhendo. Vota em personalidades variadas, num cardápio variado. Como o comensal mal educado que vai ao buffet e mistura carne, peixe, frango, legumes e torta belga no mesmo prato. O gosto fica à gosto. O eleitor não pensa no conjunto da obra. No completo.
Se ele pensasse na questão republicana, não votaria em candidatos díspares. Ele raciocinaria que se o sistema é centralizador. A principal cabeça da hidra vem a ser a Presidência da República (lembrei do Voto Camarão, mas é outro tema) e que precisa de um corpo harmônico. Basta saber que no Brasil nada se decide em termos político-administrativo sem que passe pelo Governo Federal. Estados e municípios são dependentes do poder central.
Então, entendo que seria mais lúcido quando da prática do voto este respeitar o consenso opcional de se votar harmonizando, rimando, combinado. O voto para o presidente escolhido deveria determinar, neste conceito de poder centralizado, os outros votos. Seria mais inteligente alinhar o presidente com o senador, o governador e os deputados. Isso, sim, permitiria a força necessária para governabilidade do país. Se eu estiver errado me diga. No final de tudo o que temos é a clara visão de que o eleitor não tem o menor compromisso com a identidade ideológico ou com o pragmatismo. Portanto, enquanto deputado for eleito sem precisar nadar, só flutuando na onda, não se pode queixar que no final de tudo, quando chega no back stage de Brasília vira um vale-tudo. “Farinha pouca meu pirão primeiro”, diz o senador, que é replicado pelo deputado: – Farinha não falta.
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Jolivaldo Freitas – Escritor e jornalista