O modismo vocabular desta vez é o impeachment. Não se fala de outra coisa, especialmente porque a grande mídia agendou o assunto nas fileiras primeiras dos seus discursos. Não se pode pensar noutra questão porque a sanha nos bastidores políticos e o desinteresse popular pela análise dos fatos, fundidos, são apenas o resquício da desinformação, do uso indiscriminado das notícias e do próprio noticiário que se esmera em criar linhas de raciocínio ilógico. Com efeito, a desinformação e a ausência de conhecimento transformam os afixionados por impeachment em seguidores de uma utópica reação. Reacionários que são, precisam de um banho de ralidade.
O país enfrenta problemas seríssimos de corrupção. Isto impõe ao atual governo a responsabilidade de gerenciar a crise, mas, sobretudo de demonstrar, em meio às suas próprias deficiências a coragem de lidar contra um vício estabelecido na estrutura administrativa, que é a corrupção. A exposição dos crimes e das interlocuções criminosas entre empresas e partidos não foi disparada neste governo, mas é neste governo que ela tem sido esmiuçada. Brasileiro de bom senso não se atreveria a sentir saudade de um tempo em que as tramas criminosas eram guardadas em pastas e arquivos secretos ou escondidas onde a policial federal não ousava chegar.
Vive-se num tempo em que a disputa pelo poder deflagara outros poderes mais complexos e que se interdependem no contexto sociopolítico. A imprensa, o mercado, o governo, a oposição e a opinião pública são marcadores fiéis de uma conjuntura repleta de interesses que quase sempre não confluem. A possibilidade de impedimento da presidente Dilma é a representação da crise sistêmica, pura e intransigente. E que deve acirrar ainda mais o cenário político rumo a uma futura desestabilização de todas forças políticas. Não pensem os adeptos do impeachment que o Brasil será o país das mil maravilhas tão logo se afaste Dilma, caso isso aconteça.
Para a imprensa, posicionada sempre diante dos altares do mercado, a Petrobras está com os dias contados. E pelo crime de irresponsabilidade a presidente Dilma deveria pagar com seu afastamento. Alguém acendeu a pira do incêndio. Nesta semana o advogado José de Oliveira Costa encomendou a Yves Gandra um parecer jurídico para pedido de impeachment de Dilma.Segundo o jurista Dalmo Dallari, o documento é inconstitucional, pois n]ão apresenta fatores determinantes que provem a responsabilidade de Dilma no caso das empreiteiras na Petrobras. José de Oliveira Costa é advogado do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. O tucano negou à Folha de S. Paulo que tivesse solicitado o parecer, mas o que FHC não quis declarar foi seu desejo explícito de pedir apoio popular. Se os oposicionistas tivessem ao menos a voz do povo para marchar, a história seria outra.
Fala-se no aumento da gasolina, na Operação Lava Jato, no aumento da inflação, na quebra da Petrobras. São realidades atuais, mas também fatores definidos pelo discurso midiático em busca de novo adeptos ao esquisofrênico impeachment. Todos estes problemas estão estabelecidos em confronto com a imagem da presidente e do governo. As crises parecem convergir para o Palácio do Planalto. E de lá não sairão facilmente sem que hajam medidas combativas do governo. Entrar na balela do radicalismo não é nada bom em tempos de austeridade. O senso crítico e analítico é responsável por nos fazer compreender os fundamentos da política. Então, não vale a pena sair de casa sem eles.
A promessa de protestos nos próximos dias não pode acompanhar a perspectiva esdrúxula do “Maria vai com as outras” ou “quanto mais gente melhor”. Ressuscitaram a ideia descontextualizada dos Caras Pintadas. Para eles não há nada melhor do que a quantidade e os ícones para produção de sentido. Empreitadas fadadas ao insucesso porque o importante é o entendimento das pessoas sobre o assunto. Saber o que tem sido dito de verdade e o que tem sido publicado para causar espécie. Quem compreende os fatores e o cenário não se arriscaria a mostrar a cara nestes malfadados passeios públicos onde desfila uma elite rude, ignara e indisposta a entender os problemas conjunturais do país.