“As comunidades católicas podem, se desejarem, aproveitar o excelente tema da Campanha da Fraternidade deste ano para dialogar com a sociedade, sem medo.”
Passado mais de um ano da chamada Primavera da Igreja, com o Papa Francisco, que não se cansa de promover uma abertura sem precedentes na instituição, a prática católica nas igrejas particulares do semiárido ainda tem muito que melhorar, haja vista que em muitas cidades, os católicos continuam trabalhando para dentro, enquanto o Papa preza pela saída dos cristãos ao encontro das periferias, não apenas físicas, mas também existenciais.
Não é possível dizer que as paróquias da região não fazem nenhum serviço social, pois fazem, entretanto, é ainda um serviço centrado na própria denominação e com leves traços de proselitismo. O que a Campanha da Fraternidade deste ano e a prática do Papa Francisco propõem é diferente disso.
Um Papa que vai a um bate-papo com um ateu famoso chamado Scalfari e que é criticado por receber bem os protestantes está dando um claro sinal de que chegou a hora dos católicos acolherem melhor quem pensa e reza diferente.
Aqui alguém pode dizer que os protestantes e demais fiéis de outras religiões não acolhem bem os católicos, e muitas vezes é verdade, mas por acaso cristão pode se dar ao luxo de ficar preso a birras infantis? Antes deve fazer a sua parte e a parte dos cristãos maduros é colaborar para a concretização de um só rebanho.
Aparentemente, estamos longe disso. As guerras que explodem no mundo moderno têm fundo religioso indiscutivelmente e se o sentido da religião viesse sendo colocado em prática há milênios ela já deveria ter desaparecido, porque o que existe para religar pode ser recolhido quando se faz essa religação, mas em vez disso, em vez de religar a pessoa humana ao Criador, sobram ritos litúrgicos, protocolos e orgulho, dentro de cada denominação.
As comunidades católicas podem, se desejarem, aproveitar o excelente tema da Campanha da Fraternidade deste ano para dialogar com a sociedade, sem medo. O que existe hoje, na região, não é ainda um diálogo, é mais uma sutil imposição de pontos de vista de cada denominação religiosa. Depois todo mundo volta para baixo do seu guarda-chuva institucional e se contenta com encontros sobre encontros, pregações sobre pregações, que de fato podem fazer muito bem ao ego de quem participa, mas as periferias das cidades e das almas continuam lá, mal visitadas, por conta de toda espécie de preconceito e falta de reflexão e orientação.
São agentes e mais agentes pastorais, cheios de fé e boa vontade, mas que não gastam uma fração de seu tempo para estudar como a sociedade moderna funciona, com sua multiculturalidade, como aliás era a sociedade com a qual Jesus se deparou e não consta que Jesus tenha sido indiferente para com os samaritanos, por exemplo, que estavam muito longe de fazer tudo aquilo que a religião oficial queria.
Muito bom seria se a Primavera da Igreja de Francisco florescesse aqui, no sertão, e eu sei que há um ou outro que cultiva esta perspectiva, mas uma boa parte me parece que ainda se detém no ritualismo vazio, na burocracia sagrada, na visão de um Deus implacável e cobrador para com quem não age do jeito que eles gostariam. Parece até que, sendo religiosos como são, desconhecem o quanto Jesus afirma em Jo 12, 47.
Mas não se pode perder a esperança. É como disse o próprio Francisco: “Entre a indiferença egoísta e o protesto violento, há uma opção sempre possível: o diálogo”.