De um lado, mais de 260 mil trabalhadores, incluindo aposentados e pensionistas, ansiosos para ganhar um pouco mais e fazer o salário render. Do outro, um governo preocupado com a baixa arrecadação e com os rumos da economia.
Justificativas à parte, a proposta que está na mesa de negociações sobre o reajuste linear dos servidores públicos estaduais este ano é o repasse inflacionário de 2014 (6,41%, segundo o IPCA) parcelado em duas vezes: 3,5% em março e 2,91% em dezembro. Se aprovada a proposta em negociação, quem hoje ganha menos de R$ 788 (que é o mínimo legal do país) receberá, no último mês do ano, mais uma parcela de reajuste, de 2,43%, para equiparar o vencimento ao salário mínimo nacional.
Apesar de reconhecer que o cenário econômico não está bom para ninguém, a coordenadora da Federação dos Trabalhadores Públicos da Bahia (Fetrab), Marinalva Nunes, disse que os servidores não abrirão mão dos pilares da campanha salarial de 2015.
O primeiro deles é o reajuste linear, para todos os servidores, de 6,41%, tendo como referência o mês de janeiro (data-base do funcionalismo). “Queremos pelo menos o repasse inflacionário, respeitando nossa data-base”. Ela informou que as perdas salariais dos servidores nos últimos anos variam entre 32% e 63% a depender da categoria. Dessa forma, fica claro que o impasse das negociações não está no índice, mas sim na data-base, ou melhor, no reajuste retroativo a janeiro.
Apesar de ressaltar que ainda não há nada concreto, o secretário estadual da Administração, Edelvino Góes Filho, adiantou ao CORREIO que o governo não tem como conceder o reajuste linear em uma única parcela e tampouco de forma retroativa. “Não podemos prometer aquilo que não está disponível. Se houver retroatividade em janeiro o efeito caixa haverá de qualquer jeito. É impossível. Não cabe no orçamento”, afirmou.
Além da crise econômica mundial, o secretário utilizou como justificativa os acordos firmados na gestão passada com algumas categorias. “Vamos cumprir todas as progressões de carreiras acordadas para este ano, incluindo os médicos, soldados da Polícia Militar, entre outros”.
Segundo ele, para isso, serão desembolsados mais de R$ 380 milhões. “A GAP (Gratificação por Atividade Policial) 5 dos profissionais da segurança pública, que será paga integral em abril, custará mais R$ 100 milhões do orçamento do estado”, acrescentou Góes Filho. Para ele, o fato do governo discutir o reajuste linear já é um avanço positivo. “Estados como Rio, São Paulo, Paraná, Minas Gerais e Rio Grande do Sul não colocaram sequer esse assunto na pauta ainda”.
Outros pleitos – Além dos 6,41% retroativos a janeiro, está na pauta dos servidores
o cumprimento do piso nacional dos trabalhadores. De acordo com a dirigente da Fetrab, Marinalva Nunes, 34 mil funcionários recebem menos de R$ 788 atualmente, sendo 17 mil praças da Polícia Militar (PM), 11 mil inativos (aposentados e pensionistas) e 6 mil técnicos de nível médio. “Ninguém pode ganhar menos do que o salário mínimo. Isso não existe”. Marinalva disse que a última exigência dos servidores é a implantação do piso nacional dos professores, que desde janeiro deste ano é de R$ 1.917,78. “Aqui, os professores recebem R$ 1.860,84”.
Mesmo reconhecendo que o “mar não está para peixe”, ela, que está à frente das negociações, disse não achar justo que essa conta, motivada pela crise econômica, caia apenas sobre a responsabilidade dos servidores. “Como o Judiciário, pela primeira vez, atrasou o pagamento, estamos com as ‘barbas de molho’, mas sempre dispostos a negociar. O que não queremos é pagar essa conta sozinhos”, pontuou.
Vítima dos altos preços, a técnica de enfermagem Tânia Silva diz ter esperança de ver sua conta bancária mas gorda ainda este mês, mesmo com os sinais desanimadores emitidos pelo Executivo estadual, inclusive pelo próprio governador Ruy Costa – que já disse que “prefere ter a reivindicação para o aumento do que ter a reclamação do atraso de salários”.
“A situação não está fácil para ninguém. Tudo muito caro. Hoje, praticamente a gente trabalha, recebe o dinheiro e devolve para o governo. Estamos vivendo para comer”, comenta ela. Funcionária pública há sete anos, Tânia Silva diz que o reajuste de 6,41% é muito pouco, já que não representa ganho real, “mas antes ele do que nenhum”.
Um professor da rede estadual que pediu para não ser identificado pela reportagem, disse não estar tão otimista quanto a técnica de enfermagem. “Não me lembro de tanta demora para anunciar o que eles já sabem. Eles [do governo] estão querendo ganhar tempo com essa história de negociação”.
Para o professor essa falta de transparência significa descaso com a categoria. “Eles não podem esquecer que somos nós, servidores, que fazemos as coisas andarem no estado. Mas, infelizmente, ‘a acorda só parte do lado mais fraco’”, complementa ele, que acredita que vai ficar sem aumento no salário nos próximos meses do ano.
Fonte: Correio24horas