Só em Salvador, no primeiro trimestre deste ano, foram registrados mais de mil casos de dengue – fora aquele que o médico diz que é virose e aquele que a pessoa se cura sem nem procurar um posto de saúde – e não tem perspectiva a curto prazo de se acabar com os mosquitos. E eles nos assustam, pouco importando se você mora na periferia ou no melhor bairro da cidade. Estamos todos na mesma barca furada.
O governo estadual está fazendo ampla campanha e dotando suas representações de saúde em todo estado num enfrentamento válido. A prefeitura municipal intensificou suas ações de combate aos mosquitos aedes aegypti e albopictus, transmissores da dengue, zika vírus e febre chikungunya, com a realização dos “faxinaços” em tudo que é bairro da capital, visando eliminar focos e criadouros dos mosquitos. Mas os focos se proliferam igual aos mosquitos porque o vizinho ao lado não faz sua parte. E estamos na mesma canoa furada.
A dengue é uma prova de que somos mal-educados, não temos senso de cidadania e que é cada um por si. De nada adianta realizar nas casas e condomínios, nas ruas e becos, o tal do manejo ambiental, fazer limpeza, remoção e descarte de lixo e tudo o que beneficia ao emissor da doença, se a maior parte da população não está nem aí. Estado e município gastam verbas pedindo que os moradores colaborem, mas tem morador que joga o chamado “pombo sem asa”, que vem a ser o saco de lixo jogado para cima e onde cair está bom.
A dengue e outras doenças são consequentes da influência de determinantes sociais, ou seja, todo o conjunto de valores culturais e pessoais. Não estou sozinho neste tipo de avaliação. Algum tempo atrás o médico José Augusto Brito, coordenador da Rede Dengue Fiocruz, evocou o mesmo pensamento. Ele acha a mesma coisa: “Os determinantes sociais, não controlados, podem ser agentes facilitadores de doenças (…). Educação, saneamento básico, habitação, acessibilidade a água, a retirada de lixo – os principais problemas que perpetuam a dengue no Brasil não estão resolvidos.
Mas ele observa que a população não pode ser responsabilizada, mas sim co-responsabilizada. Quem junta a água onde dá e pode, em áreas ou objetos que viram criatórios do mosquito, é aquela parcela da população que não tem acesso fácil ao abastecimento, e a culpa também é de quem não oferece infraestrutura de abastecimento. Por outro lado quem não cuida da sua piscina, que vira também criatório, é aquela parcela da população que não está sendo devidamente fiscalizado e que ignora apelos e riscos. Ignorância?
Todos sabemos que a dengue é também uma questão educacional, de informação e de formação, e que cabe aos governos a adoção de ações incisivas, permanentes, inteligentes e claras. A partir da conscientização cabe a cada morador fazer sua parte. Mas cadê consciência. Exemplo: você já fez sua parte? Duvido! Como se não seguíssemos na mesma nau fendida. Enquanto isso os mosquitos mostram sua força. E estão vencendo a guerra.
* Jolivaldo Freitas é jornalista e escritor