A imagem do menino Aylan Kurdi, três anos, afogado em um praia da Turquia, chocou o mundo. As ondas tiveram piedade dele e levaram à praia. Os peixes, sempre famintos, o pouparam porque também eles se compadeceram de sua inocência.
A fotografia foi estampada nas capas dos principais jornais. Alguns questionaram a necessidade de tamanha exposição, muitos se sensibilizaram, outros tantos se indignaram. Houve até quem acusasse a imprensa de sensacionalista, e os que, com o coração já anestesiado pela banalização das atrocidades, pouco se envolveram. Resta saber se o poder da imagem fará o mundo mudar sua política.
Aylan é apenas um entre os milhares de inocentes, que são “torturados” e morrem todos os dias. Por mais otimistas que sejamos, não dá para esconder a situação de milhões de crianças no Brasil. Nas grandes cidades, inchadas pela migração do campo, elas se amontoam com os pais em barracos e favelas, quando não se espalham pelas ruas pedindo esmolas. Há crianças exploradas no trabalho. Há crianças prostituídas. Há crianças usadas no tráfico de drogas. Há crianças sofrendo violência dentro e fora de casa.
A situação, no campo, não é menos angustiante. Volta e meia, a televisão estampa diante de nossos olhos, crianças enegrecidas por dentro e por fora pelo pó das carvoarias, crianças roubadas em seu direito de ir à escola para trabalhar na colheita do café, da laranja, crianças mutiladas pelos martelos com que quebram pedras e cocos.
O Dia 12 de Outubro é dedicado á criança. É dia de ternura e de responsabilidade. Cada criança é um Sonho de Deus. Mas este Sonho não vem pronto. Pais e educadores têm a missão, bonita e difícil, de realizar este Sonho. Em cada criança que vem ao mundo dormem possibilidades. Elas podem acontecer ou ficar apenas promessas. Cabe aos pais perceber o potencial de cada uma e ajudar a esculpir este Sonho. Educar significa trazer para fora as possibilidades existentes em cada criança.
Os pais do menino Aylan Kurdi não conseguiram realizar o seu sonho. E quantos pais, no Brasil, vivem o mesmo drama! É bom lembrar Jesus que identificou-se com as crianças, e quando os apóstolos discutiam sobre quem seria o maior, ele “tomou um menino, colocou-o junto de si, e disse-lhe: “Quem acolher este menino em meu nome, é a mim que acolhe, e quem me acolher, acolhe aquele que me enviou” (Lc 9,47-48).
+ Itamar Vian
Arcebispo Metropolitano
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