Nascemos e crescemos acreditando ser o Brasil uma nação pacífica. No entanto, como tantos outros mitos, a cordialidade brasileira vê-se ameaçada pelos dados estatísticos da violência. Segundo a Organização Mundial da Saúde, a violência assume caráter epidêmico quando são registrados mais de dez homicídios por cem mil habitantes. E de acordo com o Mapa da Violência divulgado em 2014, no ano de 2012, o correram 29 homicídios para cada cem mil.
Assim é fácil entender o que revelou uma pesquisa realizada em julho de 2014 pelo DATAFOLHA que a violência era entãoa segunda maior preocupação dos brasileiros, perdendo apenas para a saúde. De acordo com o Instituto, 25% dos entrevistados escolheram a questão da segurança pública como o tema principal a ser tratado na campanha eleitoral daquele ano. Consequência do clima de pânico que, com inegável razão, assola o espírito das pessoas, assistimos o debate resvalar para alternativas focadas apenas na vertente repressiva desta complexa problemática social.
Quando analisamos as estatísticas policiais, facilmente identificamos o avanço do tráfico de drogas como o principal responsável pela elevação das taxas de homicídios e de roubos e furtos. A falta de perspectivas da juventude é a fonte alimentadora desta indústria. E aí estabelece-se uma polêmica entre aqueles que propõem as saídas, colocando-se em conflito os defensores do aumento da repressão e aqueles que apostam nas políticas públicas como alternativa ao caminho da criminalidade. Só que, em lugar de se contraporem, as duas opções se complementam, bastando que uma se depure do seu viésvingativo e a outrade sua desmedida indulgência para os, assim por dizer, excluídos.
O justificável medo da violência tem levado as pessoas a comportamentos cada vez mais isolacionistas. As casas são substituídas por apartamentos, cresce a preferência pelos condomínios que ofereçam internamente equipamentos de uso coletivos, tais como piscinas, brinquedotecas, academias, salões de beleza,o carro próprio em lugar do transporte público, etc. assim, vamos involuntariamente renunciando ao direito a ocupar os espaços públicos e, pior ainda, ao que eles nos oferecem: o direito a convivência.
A intensidade com que participamos de grupos nas redes sociais não é a mesma quando se trata das associações de bairros, igrejas, clubes recreativos, sindicatos e associações classistas. Assim, passamos alheios ao que ocorre no nosso entorno. De repente, nos estarrece um caso de violência ocorrido bem ali na nossa porta. E Ficamos naturalmente assustados com a situação, mas não nos damos conta que a insegurança não se instala com um único click, sendo fruto de um processo da ocupação daqueles espaços que nós renunciamos.
Cobramos dos Governos maior repressão a criminalidade, como se apenas a ampliação e o contínuo aparelhamento das estruturas repressivas fosse a única solução para a epidemia de violência que se alastra por todo o País. Ocorre que, conquanto importantes, tais medidas focam apenas a vertente repressiva da criminalidade, na qual o nosso desempenho está muito abaixo de outras Nações, que apresentam índices de soluções de homicídios bem mais elevados que os nossos, o que nos dá a terrível sensação de impunidade. Precisamos, pois, priorizar medidas preventivas das delinquências.
Naturalmente que o enfrentamento das mazelas sociais é indispensável neste combate. Porém, a erradicação da pobreza e a oferta de igualdade de condições para todos não serão alcançadas tão cedo e, enquanto persistirem as nossas contradições sociais, não podemos prosseguir prisioneiros da insegurança. Portanto, paralelamente com as políticas de correção das nossas bases econômicas, devemos adotar outras que nos permitam retornar ao convíviosocial com maior tranquilidade.
Temos a mão como ponto de partida e referencia experiências das Cidades Colombianas de Bogotá e Medellín. Intervenções urbanísticas recuperaram áreas degradadas e lhe deram destinações as mais variadas e, assim, permitiram que suas populações ocupassem espaços então dominados pelo crime organizado. Deste modo, os seus moradores passaram a desempenhar papéis sociais que resultam, na prática, em políticas de prevenção a delinquência.
Por aqui podemos fazer o mesmo ou algo parecido. Por que uma escola tem que ficar fechada nos finais de semana? Suas estruturas podem ser utilizadas para atividades culturais e esportivas, com o que a um só tempo seriam dadas condições para a revelação de novos talentos desportivos e culturais, a população teria o lazer próximo as suas casas e a um custo módico e, melhor de tudo, junto com os seus vizinhos. Das escolas, passaríamos as praças locais, as quais, revitalizadas pelas Prefeituras, seriam administradas pela própria comunidade e destinadas a espaços de convivência.
Ao conviver de forma mais próxima com os seus pares, as pessoas resgatam os laços de amizades já tão desprestigiados, descobrindo suas afinidades. Com o tempo, aprende-se o valor da vida associativa e a importância das instituições sociais, como as Igrejas, os clubes recreativos e culturais. Tais medidas fortaleceriam o empoderamento da população sobre o seu espaço geográfico. Seguindo uma lei da física, o crime organizado perderia suas áreas de atuação, já que dois corpos não podem ocupar o mesmo espaço.
Enfrentar a criminalidade é tanto papel dos governos, quanto da sociedade. Os governos cuidando de sua prevenção e repressão. A sociedade colaborando com as políticas preventivas, reocupando os seus espaços coletivos ao invés do seu recolhimento nas soluções individualistas. Para tanto, tomemos os exemplos vitoriosos de Bogotá e de Medellín, para citar apenas duas Cidades que enfrentaram a violência com saídas coletivas, partindo da premissa de que o contraponto da insegurança é a convivência. Como se vê, não precisamos inventar a roda.Basta apenas a decisão de colocá-la para girar, sabendo que a mão só pode fazer qualquer coisa se seus cinco dedos estiverem comprometidos como trabalho.
ALEX DA PIATÃ – DEPUTADO ESTADUAL