Assistindo à votação do processo de impeachment na Câmara dos Deputados, sinceramente, relembrei do programa “Show da Xuxa”, que passava nos anos 90.
Ao serem perguntadas pela apresentadora a quem queriam mandar um beijo, as crianças respondiam: “pra minha mãe, pro meu pai e pra você!”, foi praticamente o mesmo que se ouviu da maioria dos deputados ao proferirem seus votos a favor do impeachment: “em nome da minha esposa, das minhas filhas, dos meus netos, voto SIM!”.
Esquecerem-se completamente que estavam ali votando os destinos do país… Tratava-se do melhor momento para homenagear a família e para fazer pose para as câmeras da TV.
Mas não foi surpresa. Em anos, é a pior composição da Câmara dos Deputados – com Eduardo Cunha na Presidência, não é difícil tirar essa conclusão. Cunha não é Presidente da Câmara dos Deputados por acaso, elegeu-se graças ao aumento substancial de bancadas ultraconservadoras, a exemplo das bancadas da bala (defensores do direito de andarmos armados, como se o problema da violência fosse tão simples), ruralistas (contrários à democratização do acesso à terra) e fundamentalista religiosa (acham que Estado e Igreja se confundem e que os direitos civis devem ser pautados pelo que está na Bíblia).
Ou seja, qualquer governo minimamente comprometido com ideias democráticas e evoluídas enfrentaria problemas para aprovar projetos nessa Câmara dos Deputados. Trata-se de um retrocesso sem tamanho.
Para completar, o Governo não se articulou politicamente para manter uma base razoavelmente fiel ali dentro – bom exemplo disso foi o abandono do PMDB, PP, PR e PSD na votação do impeachment.
Desde o início da crise, o Presidente da Câmara não se poupou de enviar um grande número de “pautas bomba”, o que muito prejudicou o ambiente político e econômico do país.
Num sistema em que o Executivo depende do Legislativo para quase tudo, esse revanchismo agravou ainda mais a situação, culminando com a abertura do processo de impeachment, por vingança.
Dilma não se curvou diante de Eduardo Cunha – nem deveria, diante de quem ele é -, e sofre hoje as consequências dessa postura. No Brasil, e principalmente na política, ser esperto e maleável é sempre bem mais conveniente.
Os políticos que se respeitam são tratados quase sempre como intransigentes e, mesmo que sejam honestos, estão sujeitos ao linchamento político (como no exemplo da Presidenta Dilma).
Quando a mídia é contrária ao Governo é que esse quadro piora ainda mais (quem tem a Globo como agente de desestabilização não precisa de oposição).
Hoje, mais de 80% da população é contrária ao Governo Dilma. A maioria argumenta que é contra em função dos inúmeros casos de corrupção que estão sendo investigados.
Ora, se corrupção é um problema histórico, o fato de hoje haver muitas investigações em curso deveria ser um sinal de evolução. Mas, como o brasileiro, em regra, é apolítico, fica mais fácil de ser manipulado. É porque os homens de bem negam a política que Eduardos Cunha a dominam.
Hoje, o que mais se discute internacionalmente é o que nem os melhores analistas políticos conseguem explicar: como é que um monte de político corrupto, comandados por outro que é réu no Supremo Tribunal Federal sob acusação de corrupção, tem legitimidade para afastar uma Presidente que sequer está sendo investigada?
Um povo que admite isso calado e, pior, que comemora isso, não pode se orgulhar de si mesmo nem reclamar de corrupção.
Comemorar a perspectiva de Michel Temer virar Presidente e Eduardo Cunha virar Vice-Presidente é um pouco demais para quem espera que a corrupção diminua no país. Mas, de uma coisa já se sabe: se Dilma cair, a Lava Jato desaparecerá da pauta do Jornal Nacional, afinal, no PMDB, PSDB, PP e no DEM só tem santo e defensores da família (pelo menos da própria, claro).
Ivo Gomes – Advogado