Envolta em papel de presentes, recebi, na semana passada, a agenda – 2017. Bonita, funcional, cheia de esperanças e sonhos como a juventude costuma ter. Ao seu lado, sobre a mesa está a velha agenda, cansada e um pouco triste por ser deixada de lado, embora ela saiba que é amada por mim.
A velha agenda nada mais é que minha vida. Em suas páginas estão assinalados os meus fracassos, minhas omissões, as esperanças que murcharam, as sementes que não germinaram, as boas intenções, que não foram realizadas. Mas ela guarda também páginas luminosas, momentos divinos. Lá estão os meus êxitos, minhas alegrias, os sonhos realizados, os perigos que ficaram para trás. Lá estão assinalados encontros com Deus e encontros com os irmãos. Algumas palavras lembram momentos difíceis com final feliz.
A nova agenda está totalmente em branco. Compete a mim, em meio às complicações deste ano, escrever alguma coisa. O passado é irreversível, é imutável. Não existe a possibilidade de rasgar alguma das folhas da agenda, ou apagar o que foi escrito. Já Pilatos dizia ao povo judeu: O que escrevi, escrevi. Por outro lado, o passado é um mestre que merece ser consultado, embora as respostas mudem com o passar do tempo.
Em cada ano novo renovamos nosso estoque de projetos e decisões. Se muita coisa não deu certo no ano que passou, é justo apostar todas as fichas no ano que surge. Sou responsável pela nova agenda, mesmo sabendo que ela receberá contribuições dos outros.
A agenda de 2017 está também aberta aos imprevistos. Não vamos enfrentar este ano sozinhos: Deus vai continuar a amar-nos e sua graça nos ajudará a superar os momentos confusos e difíceis. Santo Agostinho lembrava que Deus promete a todos e sempre o seu perdão, mas não garante a ninguém o dia de amanhã.. O escritor Fernando Sabino falava de três certezas que nos acompanham: recém estamos começando, temos muita coisa a fazer e podemos ser interrompidos a qualquer momento.
Cada dia é presente de Deus, é um sinal de seu amor. Com isso Ele quer nosso amadurecimento humano e divino. Os gregos falavam do Kairós, isto é, o tempo de Deus, a passagem de Deus em nossa vida. E o tempo de Deus é hoje. Que a nova agenda nos diga isso todos os dias.
Dom Itamar Vian
Arcebispo Emérito