Na última quarta-feira (04), foi realizado em Conceição do Coité, um encontro no Fórum Durval da Silva Pinto com o juiz Gerivaldo Neiva, para debater a violência do município. A iniciativa partiu do estudante coiteense do 10° semestre de direito, Wagner Francesco. “O objetivo era debater sobre as causas e os efeitos da violência em Coité, bem como apresentar os números referentes aos homicídios”, disse ele. Wagner afirmou que manifestações pedindo paz, vestindo branco resolvem para a satisfação pessoal, mas na prática é preciso tomar também outras providências.
O Juiz deu início ao bate-papo contando sua trajetória no judiciário e impressões quando chegou em Coité ainda em 1997. “Senti de imediato a desigualdade existente aqui. Não havia espaços para lazer, nos quais as crianças e os jovens pudessem ter interação social. Uma cidade é pensada para os carros e para o comércio e problemática da violência é muito maior do que as drogas ou gangues. É preciso analisar todos os fatores que contribuem para a formação de um cidadão numa sociedade”, reforçou.
Segundo Gerivaldo, há muitos comentários nas ruas que para combater a violência é necessário que haja reforço de policiamento, mas para ele apenas isso não resolve a situação. “Em vinte anos, o policiamento de Coité diminuiu. Porém existem outras questões que devem ser colocadas. Ninguém nasce bandido. O sistema judiciário precisa de reforma. Não está funcionando. O fenômeno da violência urbana está intrinsecamente relacionado com o crescimento desordenado das cidades, pelo forte apelo consumista divulgado pela grande mídia, pela falta de oportunidades sociais (saúde, educação, esporte, cultura, lazer, trabalho etc) para os jovens e, sobretudo, pela forte desigualdade social que caracteriza a sociedade brasileira”, disse ele.
De acordo com o juiz, o primeiro passo é acabar com a ilusão que só as drogas exterminam. Muitos dos jovens que se envolvem com ela, não tem oportunidades de uma socialização. Além de ser excluído, alguns tem problemas familiares, financeiros e por isso consideram quaisquer formas de escapes.
Para Izabela Lima, é necessário uma mudança na sociedade em si. O coiteense é excludente, mesmo não se dando conta, e sente orgulho disso. “Existem pessoas que pagam tranquilamente um valor absurdo em um camarote para festa, mas acha que está pagando muito por oferecer duzentos reais para sua empregada doméstica. Uma mãe de família que possivelmente está ali para sustentar sua casa, não tendo condições de oferecer educação adequada para seu filho, que muitas vezes são os mesmos que caem na criminalidade. É necessário pensar a criminalidade como um ciclo onde vários fatores estão envolvidos, a exclusão social, pôr o sujeito à margem, lhe negar dignidade, são alguns desses fatores. As pessoas daqui se orgulham de morar em um bairro que não é taxado de periférico, como se na periferia só houvesse pessoas de “má conduta” e, mesmo que a empregada doméstica dessas pessoas sendo proveniente da periferia, ou seja: não presta mas deve me servir. Minamos diariamente a auto-estima dessas pessoas e em uma construção maior, isso também agrava a sensação de não pertencimento, de exclusão social e de proliferação da violência. A nossa sociedade em si é separatista e essa realidade também precisa ser mudada”, disse ela.
Segundo Pitty Silva, um dos presentes no encontro, a violência em Conceição do Coité está longe de ser um problema meramente político, há uma grande demanda social. Todos nós, sociedade, devemos estar mobilizados, nos propor a discutir e junto com as autoridades competentes buscar soluções para que nossa juventude tenha possibilidade de um futuro e não ter suas vidas ceifadas da forma cruel que vêm acontecendo.
O número de casos investigados e julgados em Coité são baixíssimos. Segundo Gerivaldo, isso se deve ao baixo número de policiais civis. “Durante o ano de 2016, o Poder Judiciário recebeu 94 Ações Penais ajuizadas pelo Ministério Público local para julgamento. Este número é o exato resultado das investigações concluídas como êxito pela Polícia Civil e que possibilitou ao Ministério Público oferecer a Denúncia ao Poder Judiciário”, afirmou.
De acordo com o juiz, o homicídio de Márcio, que ainda não não há inquérito concluso é apenas um exemplo entre vários que ainda não foram investigados. Pelo levantamento, dos 36 casos que ocorreram, apenas tiveram ação penal, número inferior a quantidade registrada. “Isto significa que a Polícia Civil não teve condições de concluir o Inquérito Policial para indiciar os culpados, impossibilitando que o Ministério Público local ingressasse com a Ação Penal perante a Justiça. Lamentavelmente, portanto, muitos casos permanecerão no rol dos insolúveis e sem culpados para serem julgados pela Justiça”, ressaltou.
Confira na íntegra o relatório feito pela justiça:
Relatório violencia coité 2016
Thaise Ewbank/ Fotos: Facebook