Não faz muito tempo, um simples pronunciamento de Dilma Rousseff na televisão fazia surgir das varandas da classe média um uníssono panelaço; não menos barulhentas eram as manifestações “contra a corrupção” que tomavam as nobres avenidas das capitais brasileiras.
Por longos meses, a retórica da anticorrupção, do estado corrompido e do sistema político falido compôs um espaço de discussão nas redes da direita e se tornou pauta inarredável da agenda da mídia tradicional.
No grito intenso das convocações por um país sem corrupção, promovia-se a urgência da defenestração do governo petista e da imediata substituição da presidenta da República. Derrubar Dilma era tão necessário quanto saber quem assumiria o seu lugar.
A camarilha golpista que desembarcava do governo encontrou na força das manifestações de direita o caminho para chegar ao poder. E colocaram Michel Temer no Planalto, como promotor da revolução entreguista, neoliberalista e de desmonte do estado de bem estar social.
O governo passou a desmontar sistematicamente todas as políticas sociais desenvolvidas pelos governos anteriores; retirou das catacumbas da Câmara dos Deputados projetos que jaziam empoeirados como a Lei da Terceirização e a Reforma Trabalhista; arrancou do submundo de Brasília a Reforma da Previdência e empurrou goela abaixo a PEC 241 (PEC 55 no Senado), que congelará os gastos públicos em Saúde e Educação por 20 anos.
Entre uma reforma e outra, porém, as denúncias de corrupção se avolumaram. E evoluíram para provas concretas de que boa parte do governo é formada por ladrões de marca maior, bandidos que recebem malas de dinheiro e tramam até para matar delatores antes mesmo que eles delatem.
As gravações reveladas por Joesley Batista são marcas indeléveis da corrupção do governo Temer. A denúncia da Procuradoria-geral da República (PGR) enviada ao Supremo Tribunal Federal (STF) – e depois à Câmara dos Deputados – não deixa dúvidas de que Michel Temer cometeu corrupção passiva. (Leia aqui na íntegra).
Aécio Neves, que pediu ao Joesley R$ 2 milhões de reais para pagar os advogados que contrataria para se defender na Lava Jato, cogitou a possibilidade de matar a pessoa que transportaria este dinheiro. Antes de ela delatar.
Coisa de gangster.
Entretanto, Michel Temer continua ocupando o cargo que usurpou depois de muito conspirar; depois de toda a crise, o PSDB continuou no governo considerando o pacto de que, com a sua permanência, Aécio não seria preso. Hoje (30/06) o pacto foi concluído e Aécio não só não está preso como ganhou de volta o mandato que lhe havia sido retirado temporariamente pelo ministro Edson Fachin.
Antes, porém, a irmã (Andréa Neves) e o primo (Frederico Pacheco de Medeiros) do senador foram libertados e cumprem prisão domiciliar. Os processos de Aécio Neves estão nas mãos de Gilmar Mendes (com que tem notória amizade) e Alexandre de Moraes (que foi filiado ao PSDB).
Tão natural quanto estes ministros do STF julgarem ações de amigos é se reunirem com eles em seus gabinetes. Recentemente Gilmar Mendes se reuniu com José Serra. Gilmar é relator de processo de investigação contra Serra no STF.
Esconde-se sob o cinismo doentio a mais vil das conspirações.
Afinal de contas, as instituições públicas foram sequestradas por este governo que coloca toda a máquina estatal para auxiliar os seus a fugir da Justiça. E atacar sem pudor os inimigos. Sob o silêncio de quem, irresponsavelmente, colocou Temer à frente da nação.
O Brasil escreve a tragédia de uma nação que sonhou ser grande, mas se entregou de corpo e alma às necessidades vãs de uma elite política filiada ao gangsterismo. E hoje assiste às aulas públicas de reabilitação de notórios bandidos com a ajuda do Judiciário.
O país é a sombra do que foi há alguns anos. Rechaçado na Rússia e ignorado na Noruega, Michel Temer retornou ao Brasil com tratados desfeitos. Antes os presidentes desta nação visitavam países com o intuito de assinar tratados e estender relações diplomáticas. Atualmente os miasmas da corrupção rondam o governo moribundo e faz afugentar países amigos.
A primeira-ministra norueguesa Erna Solberg falava que o governo brasileiro deveria apoiar as investigações da Operação Lava Jato. Ironia da história: uma representante do país menos corrupto do mundo aconselhava um presidente investigado a manter as investigações.
Os grandes jornais do mundo como Le Monde (França), The Guardian (Inglaterra), The New York Times e Washington Post (EUA) repercutiram a denúncia contra Michel Temer por corrupção passiva. Ele se tornou o primeiro presidente da história do Brasil a ser investigado no cargo. Esta é a sua grande marca.
Os aliados do governo no Congresso Nacional mantêm o cinismo afirmando que a denúncia é apenas uma peça de ficção. Como se não soubessem que aquela mala rastreada, levada por Rodrigo Rocha Loures, viajou carregando R$ 500 mil num avião da FAB.
Pobre Brasil.
Mailson Ramos é relações públicas e editor do site Nossa Política.