Desde meninos sabemos que um novo escândalo apaga outro mais antigo. E assim seguimos, dia sim e outro também, malhando um judas de ocasião.
Tudo seria muito simples, e até divertido para alguns (cada qual com seu gosto), se falássemos da obra de Florentino Moreira Sales, Florentino Fogueteiro para os íntimos. Mas não é de bonecos, criados para explodir em nome de nossa repulsa pela traição, de que falamos. Tratamos de pessoas de carne e de osso, as quais, no pleno e livre exercício democrático, conferimos mandatos para a gestão da coisa pública, e que, de repente, a luz do sol revela que cuidaram dos seus interesses e de quem mais com eles houvesse.
Nos anos de chumbo víamos na restauração da democracia o desinfetante da vida pública. Ela veio, mas a corrupção não foi embora. Uma nova esperança nos tomou de assalto com a vitória de um Partido das Esquerdas. Mas aí, nova e mais profunda decepção.
Cuecas e malas revelam que as práticas nefandas são suprapartidárias e fazem parte do código moral de pessoas pertencentes aos mais variados seguimentos e classes sociais, sem distinção de cor, gênero, convicções ideológicas e credos religiosos. E com isto, realça da política apenas o lado de que não convém falar na frente das crianças.
Uma pergunta então não deveria calar: se a corrupção existe no Brasil desde sempre, seja o Governo de Reis, dos Imperadores, de Empresários, Generais, Intelectuais e até de um Operário, onde está o problema? Na democracia? Em absoluto! Confirmando o que dissera Chuchill, de que ela é o pior dos regimes, excluídos todos os demais, nossa experiência democrática conta com pouco mais de três décadas contra mais de quatro séculos de autoritarismo.
Também caiu por terra o mantra de que a corrupção é coisa da direita e das elites econômicas. Então em quem confiar?
Em meio a essa avassaladora decomposição moral do Estado e desconstrução da política, somos o José de Drummond que marcha, mas para onde? Na atual quadra da vida nacional, além da busca de um novo porto, nos deixa atônitos a falta de líderes confiáveis. Então, se não perguntamos onde está o problema ou não temos essa resposta, deveríamos indagar ao menos se erramos ou onde erramos.
Aqui saio da terceira pessoa do plural para me reduzir a minha humilde insignificância e dizer o que penso. É verdade que a culpa é do sistema, mas o sistema é feito e operado por homens e onde está o homem, ali pode estar o erro. Entendo que a questão está aí: nossa ausência ou pouca noção de pertencimento.
Falamos de um sistema, mas não nos sentimos dentro dele. O voto é encarado como um fardo. A política é coisa feita pelos outros. E quando estoura um escândalo, batemos panelas, replicamos postagens nas redes sociais, xingamos até a quinta geração dos políticos, tudo como se estivéssemos num sábado de aleluia.
Discutimos quem vai ser o próximo Presidente numa perspectiva salvacionista. Diante de tudo que tem acontecido, deveríamos enxergar os nomes postos como parte do problema e não como sua solução. Mas ao que parece, preferimos fazer uma aposta ao invés de uma escolha. E se não der certo? Bom, aí malhamos mais um judas. Só que esta é uma atividade explosiva. De tanto malhar judas, poderemos sair de um sábado de aleluia e terminar numa quarta-feira de cinzas.
Mário Lima – Advogado e Procurador do Estado