Todo ano eleitoral é a mesma coisa: sempre aparece alguém dizendo que todo ano eleitoral é a mesma coisa. Certamente você se lembra de discursos sobre como os políticos brotam nas comunidades a cada 04 anos, apertando mãos e tomando café. Também não é difícil encontrar alguém falando sobre como a população elege os mesmos charlatões de sempre. Ainda, sempre existe alguém dizendo que o Brasil não tem mais jeito.
Bem, do velho roteiro reincidente das eleições você já sabe. Porém, em meio às peripécias que nossos candidatos aprontam nesse ano tão marcante, existe um assunto muito importante que talvez você tenha deixado passar batido. Esse assunto, meus caros, é responsável por muitas das péssimas decisões tomadas na hora do voto.Estou falando do pensamento em grupo.
DEFINIÇÃO
Pensamento em grupo – ou groupthink, como dizem na gringa – é uma expressão criada em 1972, pelo psicólogo Irving L. Janis, e diz respeito a um comportamento social onde membros de um grupo entram em consenso sobre determinado assunto sem que ocorra uma análise racional e detalhada acerca da questão. Nesse contexto, muitas vezes os membros deixam sua própria opinião de lado e acatam as ideias do grupo, mesmo que essas ideias sejam muito ruins – evitando conflitos e gerando consenso perigoso.
A priori, o groupthink – ou pensamento em grupo – pode parecer algo irrelevante. Fazer parte de grupos, coadunando com ideologias e formas de agir,é algo bastante comum. Entretanto, quando o groupthink acontece, os membros do grupo deixam de avaliar criticamente as informações recebidas e passam a se subordinar a forma de pensar da coletividade. O resultado disso é a tomada de decisões irracionais e antiéticas. Ou seja, quem pensa em grupo, decide mal.
SINTOMAS
Nesse contexto, quando o pensamento em grupo prevalece, as pessoas tendem a manifestar três sintomas:
INVENCIBILIDADE: O primeiro sintoma diz respeito à noção de invencibilidade. Acredita-se que a forma como o grupo age é a melhor. Acredita-se que o comportamento do grupo é inquestionável. Consequentemente, surge a crença de que o grupo é invencível e à prova de erros. Logo, os membros passam a ignorar as consequências de suas decisões.
MENTE FECHADA: O segundo sintoma, por sua vez, é a mente fechada dos membros do grupo. Quando estamos diante do fenômeno do pensamento em grupo, nos deparamos com pessoas que não vão reconsiderar sua forma de agir ou pensar, por mais incoerente e perigosa que seja. Ainda, os “cabeças-duras” sempre irão estereotipar – ou seja, generalizar – os líderes ou integrantes de grupos rivais. Tudo isso sem sequer ponderar o que o outro lado tem a dizer.
PRESSÃO POR UNANIMIDADE: Por fim, o terceiro sintoma diz respeito à pressão pelo pensamento uniforme. Como todos os membros do grupo pensam iguais, qualquer um que demonstrar ideias divergentes, será pressionado pelos próprios membros para aceitar os estereótipos e ilusões compartilhados pelo grupo. O pensamento contrário, portanto, gera rejeição.
O PENSAMENTO EM GRUPO NA ELEIÇÃO
Você está entendo onde quero chegar? Vamos lá.
O período eleitoral aflora os ânimos da população. Em certo ponto, o posicionamento político de grande parte da população se assemelha ao futebol. Os grupos políticos seriam os times. Agora pense: as pessoas costumam mudar de time?
O que eu quero dizer é que os eleitores, durante a campanha – e até mesmo fora dela -, são envolvidos pelo groupthink. É fácil notar a presença dos três sintomas citados acima quando pensamos no contexto de politicagem. Veja:
Pessoas de um grupo político tendem a pensar que aquele grupo é o melhor e que suas ideias são corretas. Portanto, vale tudo para que esse grupo chegue ao poder. Nada pode impedir esse objetivo. Estamos diante da ideia de INVENCIBILIDADE.
Os membros de um grupo político não estão abertos à mudança de pensamento. Tente lembrar qual foi a última vez que, em uma discussão sobre política, na boca da eleição, você conseguiu convencer alguém a mudar seu voto só utilizando argumentos. Ainda, os eleitores de um candidato tendem a “esculhambar” os candidatos rivais, mesmo que não saibam direito o que esse candidato defende. Temos, então, a MENTE FECHADA.
Esse exemplo é clássico. Se um membro do grupo começa a achar que o outro candidato talvez seja melhor, esse membro é imediatamente taxado como vira-folha. PRESSÃO POR UNANIMIDADE.
5. CONSEQUÊNCIAS
Está ficando mais claro?
Precisamos ter muito cuidado na hora de votar, pois é possível que estejamos sob influência do pensamento de grupo. Consequentemente, nossas decisões serão irracionais e ruins. Isso explicapor que a insatisfação com os políticos perdura ano após ano. Sob o efeito do groupthink, somos incapazes de escolher bem. Somos levados pela maré da emoção.
Não está convencido? Pense, então, em Fernando Collor, José Sarney, Eduardo Cunha e companhia. A atuação política desses senhores é, sendo eufêmico, questionável. Então, por que eles permanecem tanto tempo no poder? Pensamento em grupo. Más decisões.
Vejam, meus caros, eu não pretendo acabar com o engajamento político. Longe disso! Entretanto, é imprescindível ter em mente que o pensamento irracional e descuidado, de acordo com a massa, é extremamente prejudicial.
O pensamento em grupo:
Prejudica a análise das alternativas existentes.
Impede a busca aprofundada por informações sobre determinado candidato.
Analisa essas informações de forma tendenciosa.
Faz com que o indivíduo tenha dificuldades em reconhecer os próprios erros e reconsiderar suas decisões.
6. CONCLUSÃO: SE LIVRANDO DESSE MAL
Agora que você ouviu falar no groupthink, você está apto a evitar essa patologia social tão prejudicial. Mas como se prevenir contra o pensamento em grupo? Não é difícil.
Para evitar cair no pensamento em grupo, sempre questione o que o candidato tem a dizer. Também duvide da capacidade do grupo em decidir racionalmente. Outra coisa importante é manter a mente sempre aberta. Não tenha medo de rever suas ideias e decisões, se julgar necessário. Não tenha medo de escolher bem.
Também é importante fazer o papel de “advogado do diabo”. Não se assuste, não estou falando para fazer pacto com o capiroto. Advogado do diabo é aquele que questiona as decisões de forma mais insistente. Afinal, é questionando que você poderá exercer a racionalidade e evitar decisões ruins.
Não seja “Maria vai com as outras”. Não somos gado pastorado por políticos. Pertencer a grupos é fundamental para a vida em sociedade, mas lembre-se que o SEU pensamento é o que conta.
Quem sabe, um dia, o ano eleitoral não será a mesma coisa.
Rafael Verdival – Advogado