De vez em quando leio textos sobre acreditar na humanidade.Geralmente tratam sobre atos de altruísmo e coisas do tipo. Em meio à bondade humana expressa através de palavras, o amor ao próximo é tema recorrente. Amar o próximo é legal, dizem os autores. Eu concordo. Porém, não é tarefa fácil.
Não são poucas as vezes que o tal “próximo” testa nossa paciência mais do que controle remoto com pilha fraca. Nesse contexto, o mundo nos provoca tanto que sentimos vontade de mandar o “próximo” para o quinto dos infernos, ao invés de amá-lo. Haja paciência.
Pode ser alguma forma de materialização exotérica decorrente de pensamentos negativos? Pode. Pode ser que eu esteja reclamando demais? Com certeza. Mas, o que interessa aqui é que esse dissabor ao qual somos submetidos habitualmente é real, causa estresse, dá raiva e atrapalha nossa vida. É uma coisa que existe. É uma coisa que todos nós vivenciamos. E de quem é a culpa? Do próximo. Do imediato. Minha e sua.
Não é difícil encontrar, dentro do nosso próprio contexto, situações desagradáveis provocadas por bagunça ou descaso de terceiros. Você vendeu o carro, mas o comprador lhe deu calote?Dor de cabeça.Você precisa falar com o tele atendimento da operadora de celular? Você precisa resolver algo em órgão público, mas o funcionário é daqueles que dificulta tudo? A cabeça explode.É tanta briga que mais parece o Programa do Ratinho.
Porém, o pior de tudo é passar mal (sua mente pira, mas não no corpo sensual). Se você se sente a ponto de vomitar o próprio ectoplasma e arder de febre como se estivesse passeando pelo inferno de mãos dadas com o capeta, aí, meu querido e minha querida, pode preparar o teatro, porque você vai ter que interpretar Buda.
Eu juro para vocês que, durante grande parte da minha vida, pensei que a palavra emergência significasse algo que precisasse ser verificado e resolvido com determinada celeridade, sob risco de dar ruim. Pois bem, descobri que estava enganado. Esperar o atendimento de um hospital (seja público ou particular!) é mais demorado do que enterro de rico. É simplesmente surreal.
Obviamente a demanda é imensa.Mas, sinceramente, é difícil justificaresperas de 317 horas para ser atendido, sendo que o atendimento dura 10 minutos e depois você vai para o soro (e fica mais 421 horas). Veja, não estou falando de pessoas que levaram tiros ou algo do tipo. É vômito, dor e afins.
Parando para pensar, você espera tanto tempo que o seu corpo acaba se curando sozinho.
Além do mais, aquelas pulseirinhas que você recebe (em alguns hospitais, em outros é na base do gogó mesmo) não ajudam em nada. A seleção da pulseira que você usará funciona da seguinte forma, em resumo:
AZUL: Você nunca será atendido.
VERDE: Você pode vomitar no chão (isso já aconteceu com um idoso e ainda demoraram a limpar o vomito), não aguentar respirar, agonizar de dores nos mais variados locais do corpo. Contanto que você não morra nas próximas horas, seu estado é OK.
AMARELO: Você está sem algumas partes do seu corpo, mas não são partes tão importantes, então ainda dá para aguentar.
LARANJA: Você está inconsciente e tem apenas 3 litros de sangue no seu corpo.
VERMELHO: Você já morreu 2x e chegou no hospital sem a cabeça.
Moral da história sobre coisas coloridas: Power Rangers é legal, pulseiras de triagem não são.
Como último exemplo, dos milhões que eu poderia dar (e você também), vou apenas citar os atendimentos por hora marcada. Você agenda, com dois meses de antecedência, uma consulta em determinado médico para às 9horas da manhã. Chegado o dia do atendimento, você chega às 8h45. O médico (ou a pessoa que realizará o atendimento, independentemente da área do serviço) chega às 10h30. Você é atendido às 14 horas. POR QUE MISÉRA ENTÃO NÃO MARCOU PARA 14H???
De quem é a culpa disso tudo que eu falei? Será que SEMPRE há imprevistos que atrasam horas e horas? Será que o sistema SEMPRE está fora do ar? Será que você, PRÓXIMO, sempre está “sem cabeça” para fazer sua parte?
“Ah, você está muito estressado. ”
“Ah, essas coisas são demoradas mesmo”
“Ah, já sabe como é, tem que ir preparado”.
NÃO, pessoal! Não!
É chato ficar reclamando? É! Mas, pelo amor de Deus, são serviços e coisas que tem, sim, capacidade para funcionar de maneira muito mais eficiente. Muitas vezes todos esses transtornos acontecem ou por falta de organização ou porque indivíduos estão nem aí.
A gente tem que encher o saco sim, e se não der certo, tomar qualquer atitude mínima. Deixar de ir naquele lugar que demora de atender. Espalhar para todo mundo quando você for atendido de forma sub-humana. Fazer qualquer coisa que for, mesmo que essa coisa seja reclamar num texto e postar no Facebook.
Ao final das contas, acho que esse texto se aproxima – em algum ponto – dos textos de amor ao próximo. Não sei dizer exatamente como, mas, na verdade, eu só estou falando isso tudo porque eu ainda (mesmo que eu ache ingênuo da minha parte) acredito que alguma alma revoltada como eu pode começar a tomar atitudes também.
Como Dr. Montgomery Montgomery falou em “Desventuras em Série”, se você souber diferenciar os répteis perigosos dos dóceis, você pode se afastar dos nocivos e aí seria possível ficar de boas na Sala dos Répteis.
Então, da próxima vez que um “próximo” desafiar seu amor, não fique apático. Cultive a semente da revolta dentro de você, e, quem sabe um dia, este texto fique obsoleto.
Rafael Verdival – Advogado