- O primeiro Júri no novo Fórum de Conceição do Coité aconteceu nesta terça-feira, 15, e como não podia ser diferente foi bastante concorrido e a sentença só foi lida aproximadamente oito horas depois de iniciado. No banco dos réus estava Douglas dos Santos Jesus, conhecido por ‘Dodô’, acusado de matar sua companheira Sabrina Lima Ramos no fim da madrugada do dia 4 de março de 2018, na casa onde moravam no Bairro Sonho Meu, na mesma cidade [Relembre]. Quatro dias depois, ele se apresentou à Delegacia acompanhado de um advogado [Relembre]. E como havia um mandado de prisão ele foi recolhido e posteriormente transferido para o presídio de Feira de Santana onde permanece atualmente.
A denuncia contra Douglas foi formulada pelo Ministério Público estadual que atuou no sentido de condená-lo por feminicídio, através da promotora de Justiça Poliana Falconery Quintella e na defesa do réu estavam os advogados: Alonso Guimarães, Rosiany Lima e Camila Mota com a missão de convencer os sete jurados, ou quem sabe quatro deles [maioria] para absolvição do seu cliente que confessou ter golpeado Sabrina com uma faca, mas que foi em legítima defesa e não tinha a intenção de matá-la.
A promotora tentou transmitir para o júri que Douglas agiu de forma cruel quando feriu a companheira com a intenção de matar, quando a mesma chegou de uma festa. A magistrada chegou a usar um datashow para mostrar aos jurados e ao público presente, alguns pontos do processo e com o inquérito em mãos se aproximou dos jurados mostrando fotos do crime e questionando se aquele era um tipo de crime sem intenção de matar.
A defesa do réu tentou um caminho contrário afirmando que o mesmo a feriu sem a intenção e agiu em legítima defesa. Quem acompanhou a defesa do advogado Alonso Guimarães percebeu que o mesmo ‘tirou leite de pedra’ quando usou todos os argumentos na defesa do cliente, principalmente ao afirmar que as testemunhas de acusação entram em contradição e que até no trabalho dos peritos houve erros.
Ao final de cada etapa do julgamento ocorreu a votação por parte dos jurados e posteriormente o juiz Gerivaldo Alves Neiva narrou o resultado de sua decisão ao ler a sentença, conforme pode ser lida na íntegra no fim desta reportagem.
O juiz considerou um prazo bastante razoável para realização do julgamento e disse que apesar de cansativo com cerca de oito horas de duração, no final os jurados entenderam pela condenação, recusando a tese da defesa que era de legítima defesa, alegando que a vítima é que teria partido com uma faca e ele apenas teria se defendido. “Mas o conselho não acolheu essa tese, prevalecendo a tese da promotoria do feminicídio por motivo torpe. Ao final a pena mínima para esse caso é de doze anos e considerando essas agravantes, eu aumentei para catorze anos e seis meses, considerando também que a vítima deixou três crianças órfãs”, justificou o juiz.
Ainda de acordo com o magistrado, Douglas terá regime inicial fechado, vale lembrar que já vem cumprindo na penitenciaria de Feira de Santana.
Avaliação da promotora e de um dos advogados de defesa após o réu sentenciado
A promotora Poliana Quintella participou pela primeira vez de um júri em Coité e na avaliação dela foi um trabalho complicado porque no caso de feminicídio envolve uma situação de afeto entre o réu e a vítima e depende de como o jurado vai valorar a questão. “O receio todo é que a linha da defesa seria que o conselho de sentença procedesse em julgamento moral da vítima que levasse a uma possível absolvição, então eles vieram com três advogados com muitas teses de defesa, mas ao final a justiça prevaleceu, porque as provas dos autos eram muito claras pela ausência de qualquer legítima defesa e o conselho de sentença foi bastante coerente e condenou o réu pela pena justa que ele deveria pegar”, afirmou.
O advogado Alonso Guimarães falou para o Calila Notícias também em nome das advogadas Rosiany Lima e Camila Mota que tiveram a preocupação em buscar todas as teses defensivas possíveis e que se enquadrassem durante as narrativas dos fatos para favorecer o cliente. Segundo ele o conselho de sentença é soberano, “mas não impede de a gente buscar um recurso de apelação para tentar anular esse julgamento e buscar redução das penas, a retirada das qualificadoras que ao nosso vê tecnicamente não são possíveis nesse caso. Nós sabemos que a torpeza não necessariamente é vingança e quando deveria ser uma qualificadora de futilidade, então esse erro técnico prejudica o nosso réu e é por isso que nós vamos recorrer e continuar lutando para que a gente diminua a pena e dê uma condição melhor de justiça para nosso cliente”. disse Guimarães.
O CN perguntou sobre que argumento ele vai tentar derrubar este julgamento e ele disse que acredita nessa possibilidade, por conta dos erros que aconteceram durante as perícias técnicas.”Nós temos um laudo que um próprio perito afirmou que o local do crime foi movimentado, foi alterado e a gente não tem como garantir uma condenação com base em um laudo pericial ao qual afirmo que o local do crime não foi preservado e também as testemunhas completamente contraditórias”, afirmou o jurista.
Processo Número: 0005611-94.2018.805.0063
Autor: Ministério Público Estadual
Réu: Douglas de Jesus Santos
SENTENÇA
A representante do Ministério Público nesta comarca ofereceu Denúncia contra Douglas de Jesus Santos, qualificado nos autos, sob acusação da prática do crime previsto no artigo 121, § 2º, I e VI, c/c § 2º-A, I, do Código Penal. Segundo consta da Denúncia, o acusado, movido por sentimento de vingança, em 04 de março de 2018, na residência da vítima, nesta cidade, no bairro Sonho Meu, teria desferido golpes de faca contra a vítima, causando-lhe a morte.
Encerrada a instrução, o acusado foi pronunciado nos termos da Denúncia, cuja sentença transitou em julgado.
Por fim, designada a data para julgamento nesta sessão do Tribunal do Júri.
É o Relatório. Decido.
Submetido a julgamento, o Conselho de Sentença, por maioria de votos, reconheceu a materialidade e autoria do crime. Em seguida, também por maioria de votos, o Conselho negou o quesito genérico de absolvição do acusado.
Em seguida, também por maioria de votos, negou as teses de desclassificação para o crime de lesão corporal seguida de morte e homicídio privilegiado.
Após, também por maioria, o Conselho acolheu as qualificadoras do feminicídio e motivo torpe. Não houve quesitos acerca de outras causas de aumento, diminuição, agravantes ou atenuantes.
Isto posto, passo a dosar a pena.
Restou provado nos autos que o acusado já teria sido preso, processado e condenado pela prática de crime contra o patrimônio perante outro juízo. A culpabilidade e circunstâncias são inerentes ao tipo feminicídio por motivo torpe, mas tendo graves consequências relacionadas à condição de orfandade de três crianças. Não há elementos significativos nos autos sobre a personalidade do acusado ou comportamento da vítima, além das declarações de testemunhas relacionadas a desentendimentos entre eles.
Sendo assim, pela prática do crime de homicídio qualificado definido como feminicídio (qualificadora objetiva), fixo a pena base em 14 (quatorze) anos de reclusão. Em seguida, por motivo da qualificadora de motivo torpe (subjetiva) aumento a pena em 1/6 para torná-la, nesta fase, em 16 (dezesseis) anos e 04 (quatro) meses de reclusão. Para evitar o “bis in idem”, deixo de considerar as circunstâncias agravantes previstas no artigo 61, II, “a” e “e”, do Código Penal.
Por fim, na falta de outras causas de diminuição ou aumento, atenuantes ou agravantes a serem consideradas, torno a pena definitiva em 16 (dezesseis) anos e 04 (quatro) meses de reclusão.
A pena terá regime inicial fechado e será cumprida no presídio de Feira de Santana (Ba), local em que se encontra preso preventivamente o acusado, condição que deverá permanecer, visto que persistem as razões para manutenção da prisão, principalmente para garantir a aplicação da lei penal, considerando que o acusado se evadiu logo após a prática do crime, não lhe sendo reconhecido o direito de apelar em liberdade.
Não houve requerimento e nem se discutiu nos autos a reparação prevista no artigo 387, IV, do CPP. Em vista da pena definitiva, não se aplica o disposto no artigo 387, §2º, do Código de Processo Penal, para definição do regime inicial de cumprimento da pena.
Após o trânsito em julgado, sendo mantida a condenação, adote-se as providências necessárias ao cumprimento da pena com a expedição da guia definitiva.
Antes disso, expeça-se a guia provisória.
Custas pelo condenado.
Arbitro os honorários da defensora dativa nos exatos termos da tabela da OAB.
Os presentes ficam intimados.
Conceição do Coité, 15 de outubro de 2019
Gerivaldo Alves Neiva
Juiz de Direito