Notadamente, surgem diversos questionamentos acerca das eleições Municipais de 2020, especialmente no que tange o adiamento ou mesmo até a unificação de mandatos em uma eleição geral. Sem dúvidas, para quem está no poder é uma excelente possibilidade, porém para a democracia brasileira, não seria nada favorável, tendo em vista o comprometimento da participação política da sociedade.
Vivemos um momento difícil, prever como será a economia, saúde, política nos próximos dias, bem como os impactos em razão da pandemia do COVID-19 que assola o Brasil e o mundo, seria no mínimo precipitado. Em que pese, estamos num período de isolamento social a fim de cessar a propagação do vírus e como meio de proteção à vida, em especial àquelas que integram o grupo de risco.
Sendo assim, várias propostas de adiamento das eleições Municipais estão sendo apresentadas ao Congresso Nacional, a fim de unificar os pleitos federais, estaduais, distritais e municipais, com a justificativa de que as eleições gera um risco a saúde pública e visa proteger a legitimidade do pleito eleitoral, tendo em vista a atual crise sanitária.
O novo cenário possibilitou a rediscussão do assunto na Câmara dos Deputados que desde 2015 propõem o adiamento das eleições, por oportunismo daqueles que se beneficiarão com a eventual unificação. São decisões significantes que comprometem o nosso processo democrático e, neste momento movidos pela ansiedade e pânico, não mudará a realidade brasileira.
Por outro lado, o adiamento das eleições confunde-se com a unificação de mandato. O adiamento tem por finalidade postergar as eleições pelo tempo mínimo necessário, para que haja possibilidade de diplomação e posse no dia 01 de janeiro de 2021. É a hipótese sustentada por alguns ministros, sendo a alternativa mais viável, caso tenha um novo colapso no número de infectados pelo vírus.
A unificação de mandato por sua vez, posterga o mandato por mais dois anos dos seus representantes, o que acarreta na federalização das eleições. Outra justificativa está no uso do fundo eleitoral no valor de R$ 2,5 bilhões para ações da saúde no combate ao coronavírus.
Entende-se, portanto que a unificação afronta a cláusula pétrea, bem como o processo democrático previstos na Constituição de 1988, tendo em vista ao principio da periodicidade do voto. No entanto, para alterar esse panorama, apenas seria possível através de medida provisória para que fosse modificado o artigo que trata da anualidade das eleições, nas hipóteses de estado de calamidade ou força maior.
As eleições municipais tem uma peculiaridade, neste caso existe uma maior aproximação aos eleitores, refletindo na soberania popular. Os pleitos tendem a ser característico da região atendendo a realidade e proporcionando debates acerca dos direitos políticos e sociais, quando votamos, além de escolher um candidato ou um partido, escolhemos pra onde vamos encaminhar as politicas públicas.
Importante ressaltar que as eleições e a democracia sempre vão exigir um preço. Para uma boa democracia é indispensável uma organização no preparo das urnas, treinamento de mesários, financiamento de campanha, comunicação, etc. Neste sentido, desqualificar a democracia em razão do argumento econômico compromete também a relativização do exercício fundamental ao voto, tendo por consequência o distanciamento da participação popular.
Em síntese, a proposta de unificação de mandatos coloca em risco a democracia brasileira. Precisamos manter o foco no combate à pandemia sem nos esquecermos da manutenção da democracia, o que só será possível quando compreendermos seu valor e, consequentemente, seu custo.
* Isabella Matos – Advogada Eleitoralista
Sócia-fundadora do Castro, Bianchi & Matos
OAB/BA 62.664