Eu era muito pequeno, mas as lembranças nunca se foram. Eu esperava, ansioso, pelos primeiros sinais de que já era hora de começar os preparativos juninos, e ficava eufórico quando meu pai começava a reunir as madeiras que dariam forma e vida à fogueira. Nem precisava pedir pra eu ajudar. Lá eu estava. Noutro dia, íamos para o mato selecionar uns dois pés de São João, árvore comum na caatinga, os quais eram fincados no terreiro da casa com suas belas flores amarelas.
Bandeirolas de papel de seda coloridas e amarradas em cordão cruzavam entre os esteios do varandado, plantas e árvores na parte externa da casa. Era uma festa de cores. Um encantamento para os olhos. Um conforto para a alma.
Detrás da porta da sala principal, um mói de foguetes comprados para homenagear São João, o dono da festa. Na cozinha, ingredientes davam forma e sabor a delícias da culinária típica junina.
Tudo pronto, era noite de São João! Fogueira acesa, rodeada de cadeiras, bancos de madeira para receber os da casa e os prováveis visitantes. Família grande, a festa estava completa. Com o clarão do fogo já iluminando as cores das bandeirolas e aquele céu brilhantemente estrelado, meu pai mexia na fogueira e reservava um espaço com brasa para assarmos milho. Também tinha licor de jenipapo (produzido pela minha avó), canjica, arroz doce e pé de moleque assado na palha da bananeira.
Ah, e toda festa junina da roça de verdade tinha que alguém “pular a fogueira”. Arriscado, até, mas, naquela época, para se tornar comadre ou compadre de consideração, pulava.
A gente, criança, soltava fogos destes industriais, de caixinha, chuveirinhos, traques, cobrinhas… Mas o que fazia sucesso mesmo era a boa e velha esponja de aço (a gente chamava tudo de Bombril). Amarradas na ponte de um graveto ou pedaço de madeira qualquer, ateávamos fogo e rodávamos até a última faísca sobreviver e terminar seu espetáculo. O efeito que aquilo causava era tão bonito, era tão surpreendente que até as crianças, digamos, mais crescidinhas (risos), não resistiam. Na verdade, aquela era uma brincadeira muito mais para adultos. Mas todo mundoterminava caindo na gandaia.
Com o avançar da noite, era tradição visitar uma ou duas casas na proximidade, como também o era receber a visita de amigos. “Feliz São João!”, dizíamos uns para os outros. Aquilo era ritual. E belo, sobretudo por ser verdadeiro.
No outro dia, ao amanhecer, a fogueira ainda tinha vida, e era reavivada pelo meu pai. Enquanto alguns varriam o terreiro e organizavam outras coisas, nós, crianças, procurávamos por fogos não acesos, perdidos sobre o chão com a euforia na noite anterior.
Eu gosto das grandes festas juninas, de receber amigos na cidade, de curtir as canções das bandas famosas. Mas tenho que admitir: eu ainda sou apaixonado pelo São João na roça, porque tudo tinha mais cheiro, mais cor e muito mais sabor.
Nestes tempos difíceis, São João em casa pode ser muito bom!
Josevaldo Campos, jornalista, com as felizes e nostálgicas contribuições da família.