O ensino domiciliar, também conhecido como homeschooling, já vinha sendo objeto de discussão bem antes da pandemia. O caso emblemático sobre o assunto chegou ao STF em junho de 2016, quando uma família de Canela (RS) impetrou Mandado de Segurança contra ato da Secretária de Educação do Município, que negou pedido para que uma criança de 11 anos fosse educada em casa.
No julgamento, o STF, embora tenha considerado a constitucionalidade da prática de ensino domiciliar a crianças e adolescentes, em virtude da sua compatibilidade com as finalidades e os valores da educação infanto-juvenil, expressos na Constituição de 1988, julgou improcedente o recurso.
A improcedência se deu, não por ser ilegítimo o pedido, mas porque não existia lei especifica que disciplinasse tal situação.A maioria da Corte Suprema entendeu ainda que seria necessária a frequência da criança na escola, de modo a garantir uma convivência com estudantes de origens, valores e crenças diferentes.
Surpreendidos com pandemia do novo coronavírus (Covid-19), fomos obrigados a mudar os paradigmas da educação, e a única saída encontrada foi, literalmente, o ensino à distância, haja vista as recomendações de isolamento social.
Compelido a apresentar uma resposta ágil e dinâmica que diminuísse os impactos educacionais causados pela pandemia, o Governo publicou a Medida Provisória 934/2020, que flexibilizou o ensino básico, fundamental e médio, dispensando as escolas públicas e privadas de cumprir o mínimo de 200 dias letivos, mantendo porém, obrigatória a carga horária mínima de 800 horas/aula no ano.
Fato é, que a mudança repentina deu ensejo à uma modificação unilateral nas regras dos contratos nas instituições de ensino privado, de modo que o ensino, inicialmente contratado para ser presencial, foi alterado para a modalidade online.
Em que pese as instituições de ensino tenham realizado gastos para disponibilizar as aulas virtuais, outros custos foram reduzidos, como contas de água, luz, materiais escolares. etc. Do mesmo modo, e igualmente afetados pela pandemia, pais e alunos enfrentam dificuldades para pagar as mensalidades. Parece justo, portanto, que nesses casos, ocorra uma revisão e repactuação do contrato, para ajustar o preço a ser pago, visando preservar o equilíbrio econômico e financeiro dos contratos.
Situação totalmente oposta ocorreria, se diante da pandemia, certa instituição de ensino não dispusesse de plataforma online para realização de aulas virtuais, causando grande prejuízo ao ano letivo e crescimento profissional do estudante. Ora, deverá o pai/aluno adimplente, continuar a pagar as mensalidades, mesmo sem receber o serviço contratado?
Neste caso, estamos diante da Exceção do Contrato Não Cumprido, instituto de grande aplicabilidade prática, que ocorre quando uma das partes deixa de cumprir sua obrigação devido ao não cumprimento da obrigação da outra parte. Não havendo a disponibilização das aulas online pela instituição de ensino, os pais poderão então, deixar de efetuar os pagamentos, e consequentemente o contrato será resolvido, ou seja, encerrado.
Por fim, chamo a atenção para a impossibilidade de, sob a justificativa de enfrentamento a pandemia, alguém simplesmente querer pôr fim a todo e qualquer contrato anteriormente firmado. Explico:
Se o cidadão, entusiasmado em aprender novo idioma, firmou contrato para compra de curso de inglês integralmenteonline, com término previsto para 2022, e lhe estão sendo disponibilizadas todas as aulas, não há que se falar em extinção do contrato devido ao surto da COVID-19.
Note-se que este contrato é alheio à pandemia e, em razão da sua plena execução, o contrato deverá ser mantido em atenção ao Princípio da Força Obrigatória dos Contratos, podendo as partes, no entanto, ajustarem possíveis descontos devido à situação excepcional a que fomos acometidos.
Esta matéria já é objeto de diversos projetos de lei no Congresso Nacional. Todavia, enquanto não regulamentada, o recomendável é aplicação do bom senso e da boa-fé, buscando sempre o equilíbrio econômico e financeiro do contrato.
Contrate um advogado de sua confiança para garantia dos seus direitos.
*Jéssica Gabrielly Lima
Diretora da Comissão da Jovem Advocacia – Subseção de Conceição do Coité.
Sócia do Escritório Lima & Mota Advocacia e Consultoria Jurídica
Especialista em Direito Ambiental