O tema Estelionato Sentimental, ampara sua definição no artigo 171 do Código Penal: “Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento”, no entanto, o presente artigo não pretende tipificar o instituto como uma espécie de crime, mas usar o dispositivo de modo análogo para junto com situações específicas ocorridas no curso do namoro, imputar a responsabilidade civil para o agente causador do dano.
No estelionato sentimental, a responsabilidade civil ocorre de modo subjetivo, ou seja, necessariamente a conduta do agente deve causar um dano e é necessário comprovar a culpa do agente, para que haja indenização. Em análise do artigo 171 do Código penal, deve-se constatar quatro elementos para que possa haver a configuração da responsabilidade civil, como prescreve o artigo 186 do mesmo diploma.
A responsabilidade civil no curso do namoro, trata-se de um tema que começa a “bater as portas do judiciário”, e nesse tocante podemos nos remeter ao princípio da operabilidade do juiz, ou seja dar aos magistrados a possibilidade de interpretar a norma de maneira mais ampla, dando a possibilidade da sociedade ter Justiça, e a um poder jurisdicional capaz de aplicar os valores sociais.
A jurisprudência brasileira tem adotado posições favoráveis quanto a caracterização do estelionato sentimental, condenando a indenização por danos materiais, como observa-se em decisão pronunciada pelo juiz da 7ª vara cível de Brasília, onde houve a condenação do ex-namorado para pagar a autora valores decorrentes de empréstimos e outros gatos realizados na vigência do relacionamento.
Em um relacionamento que durou quase 02 anos, o ex-namorado realizou empréstimos financeiros, empréstimos de carro, fez pedidos de créditos de celular e realizou compras usando o cartão de crédito na namorada – sempre com a promessa de que no futuro esses gastos seriam quitados. Verifica-se em documentos acostados aos autos, que além destes gastos, a namorada ainda realizou quitações de dívidas em instituições bancárias, tais valores devidos pelo réu, comprou-lhe roupas e sapatos; pagou suas contas de telefone; emprestou-lhe seu carro. Os danos materiais provenientes do estelionato sentimental chegaram ao total de R$ 101.537,71.
Portanto, diante da nítida lesão patrimonial que a namorada veio a ter, é justo que a vítima tenha a reparação material dos danos sofridos.
No que concerne aos danos morais, estes foram julgados improcedentes, tendo em vista que o Juiz entendeu como mero dissabor o rompimento da relação, não havendo a sua caracterização. No entanto, em uma análise detida do caso em tela, verifica-se que o ex-namorado contraiu matrimônio com uma pessoa diversa no curso do relacionamento com autora, sendo este fato também um dos motivos pelo qual se deu o rompimento do relacionamento.
Tendo em vista que o dano moral atinge a personalidade do ofendido, a decisão do judiciário é passível de controvérsias. O ex-namorado aproveitando-se da condição que o relacionamento lhe proponha, teve a intenção de induzir a vítima a contrair esses débitos, cabendo também a reparação moral pelo fato de que se relacionou com outra pessoa no curso do namoro, chegando a contrair matrimônio, ferindo o dever de fidelidade que o relacionamento lhe pedia.
A parte autora, mais que a reparação patrimonial, buscava a compensação pela lesão aos seus direitos de personalidade, praticada pelo ex-namorado, sendo eles a intimidade, os sentimentos afetivos, até a própria imagem, tendo em vista que o réu muito além de obter uma vantagem econômica, aproveita-se do afeto, da dedicação, da dignidade que autora impunha na relação.
Da sentença prolatada pelo Juiz de 1º instância, houve apelação, onde a quinta turma do STJ-DF, manteve a sentença que julgou parcialmente procedente o pedido formulado pela parte autora:
PROCESSO CIVIL. TÉRMINO DE RELACIONAMENTO AMOROSO. DANOS MATERIAIS COMPROVADOS. RESSARCIMENTO. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. ABUSO DO DIREITO. BOA FÉ OBJETIVA. PROBIDADE. SENTENÇA MANTIDA.APC 866800 – DF, quinta turma cível, 20130110467950APC, Rel. Des. Carlos Rodrigues, julgado em 08/04/2015, DJe 19/05/2015).
TJDF- Disponível em: http://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/noticias/2014/setembro/ex-namorado-tera-que-ressarcir-vitima-de201cestelionato-sentimental201d, acesso em 28/10/2016.
Em síntese, o estelionato sentimental tutela a proteção patrimonial e também afetiva da vítima, diante das demandas que vem ocorrendo, o poder judiciário começa a formar um pensamento entendo que é possível ocorrer a reparação pelos danos materiais decorridos da fraude afetiva.
A preocupação é no que concerne aos danos materiais, essa inquietação se dar em virtude de que as relações de namoro são passíveis de término, tem-se que observar que existem situações chamadas de típicas nas relações de namoro que não podem configurar o estelionato sentimental, não há uma exploração econômica, tão pouco poderá haver a compensação por danos materiais. Entende-se o zelo na condenação pelos danos morais, pois é sabido que a jurisprudência forma precedentes, então se deve agir de forma cautelosa para que as relações de namoro não se tornem uma contenda judicial.
Isto porque existem situações que podem ser consideradas como típicas das relações de namoro, ou seja, tratam-se de situações econômicas normais que não ensejam o estelionato sentimental. É possível que os namorados possuam gastos uns com os outros, desde de que não haja a falta de honestidade, falta de confiança, o que não ocorrerá a quebra da boa-fé, assim não haverá abuso financeiro.
Outro fator importante é que a simples mágoa pelo termino da relação de namoro não enseja o estelionato sentimental, se não houve uma vantagem ou exploração econômica no curso do namoro, não há o que ser pleiteado na justiça no que se refere a fraude afetiva. O término da relação é encarado como fato da vida, é normal que as relações de namoro acabem quando não há uma intenção de construir uma vida juntos.
No tocante ao prazo para que se busque a reparação decorrente do estelionato sentimental, aplica-se o artigo 206 §3, incisos IV e V do código civil, sendo o prazo prescricional de 03 anos, à contar do fim do namoro.
*Egnaldo dos Santos Oliveira Junior, Advogado. Bacharel em Direito pela Faculdade Ruy Barbosa. Pós-Graduando em Direito Constitucionais e Humanos. Discente do Curso de Licenciatura de História na Universidade Federal da Bahia – UNEB.