A Câmara de Vereadores de Caxias do Sul aceitou por unanimidade os pedidos de cassação do vereador Sandro Fantinel (sem partido), em sessão ordinária realizada na manhã desta quinta-feira (2). Com o acolhimento, foi criada uma comissão parlamentar processante para avaliar a cassação. O grupo tem 90 dias para a decisão.
A RBS TV tentou contato com o o vereador Sandro Fantinel, mas até a última atualização desta reportagem, não havia obtido retorno.
Quatro pedidos de cassação foram abertos e analisados nesta quinta. Os vereadores votaram todos juntos e uma única vez.
Na terça-feira (28), Fantinel usou a tribuna da Câmara de Vereadores para pedir que os produtores da região “não contratem mais aquela gente lá de cima”, se referindo a trabalhadores vindos da Bahia. A maioria dos trabalhadores contratados para a colheita da uva veio do estado nordestino. O vereador se referia aos mais de 200 homens encontrados em situação semelhante à escravidão em um alojamento de Bento Gonçalves.
Fantinel foi expulso do Patriota na quarta-feira (1º). Um boletim de ocorrência contra ele foi registrado pelo deputado estadual Leonel Radde (PT) na terça (28). O Ministério Público do Trabalho (MPT) do RS também anunciou que investigará o parlamentar por apologia ao trabalho escravo.
Integrantes da comissão processante
Tatiane Frizzo – PSDB
Felipe Gremelmaier – MDB
Edi Carlos Pereira de Souza – PSB
Pedidos
O primeiro pedido de cassação contra Fantinel foi feito pelo ex-vice-prefeito de Caxias do Sul, Ricardo Fabris de Abreu, na manhã de quarta (1º). No pedido, Fabris diz que “Caxias do Sul e o Rio Grande do Sul são agora vergonha nacional, acusados de serem locais racistas, extremistas e xenófobos”. Ele ainda afirma que o vereador transformou a Câmara de Vereadores em “uma câmara dos horrores, com a tribuna servindo de picadeiro”.
As Defensorias do Estado do Rio Grande do Sul e da Bahia também pediram a cassação do mandato do vereador. No documento, os defensores pedem que “seja determinada a notificação do vereador para que apresente sua defesa e que, ao final, após análise do mérito, seja determinada a cassação do mandato, ante a conduta configuradora de violação do decoro parlamentar e tipificada como crime de racismo na Lei federal nº 7.716/89, bem como, nos termos da legislação vigente pertinente”.
Investigação
O Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul (MPT-RS) abriu, de ofício, investigação contra o vereador por apologia ao trabalho escravo. De acordo com o órgão, Fantinel “culpabilizou as vítimas pela situação, além de promover xenofobia contra trabalhadores baianos” em seu discurso.
Para o procurador e vice-coordenador nacional de erradicação do trabalho escravo no MPT, Italvar Medina, “a fala minimiza, indevidamente, a extrema gravidade da escravidão contemporânea, busca culpabilizar as próprias vítimas pelos ilícitos sofridos, tem conteúdo preconceituoso e, para piorar, estimula a discriminação nas relações de trabalho, em ofensa à Constituição da República, à legislação e a compromissos internacionais assumidos pelo Brasil”.
Durante a fala na tribuna da Câmara de Vereadores, Fantinel sugeriu também que se dê preferência a empregados vindos da Argentina, que, segundo ele, seriam “limpos, trabalhadores e corretos”.
Após o discurso, o vereador afirmou ao g1 que só falou da Bahia “porque é a Bahia que tá envolvida no processo de Bento Gonçalves, se fosse Santa Catarina, eu teria falado Santa Catarina”. Ele acrescentou que se arrepende de ter dito que “a única cultura que os baianos têm é viver na praia tocando tambor”.
O vereador voltou a falar sobre o discurso à equipe da RBS TV, na manhã desta quarta (1º).
“A intenção da pauta na tribuna, ontem, era querer transmitir para os agricultores terem um certo cuidado. Porque existem alguns grupos que estão dando golpes usando a questão da analogia à escravidão. […] Quando a gente está no calor da fala, […] a gente diz palavras que não é o que a gente quer dizer, que não representa a gente”, afirmou.
“A única coisa que eu disse dos baianos é que eles gostam só de tocar tambor e ficar na praia né. Se a gente fosse ter essa conversa em um outro momento, a pessoa iria dizer: ‘ah, é verdade. É a cultura deles, não tem nada de mal’. O problema é que entrou em um contexto que foi interpretado como forma de falar mal deles”, disse.
Repercussão
O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, condenou, através das redes sociais, a fala do vereador de Caxias do Sul, Sandro Fantinel. A posição de Leite foi contra o “discurso xenófobo e nojento” do parlamentar.
“Não representa o povo do Rio Grande do Sul. Não admitiremos esse ódio, intolerância e desrespeito na política e na sociedade. Os gaúchos estão de braços abertos para todos, sempre”, disse.
O governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues (PT) também se manifestou no Twitter: “Eu repudio veementemente a apologia à escravidão e não permitirei que tratem nenhum nordestino ou baiano com preconceito ou rancor”.
“É desumano, vergonhoso e inadmissível ver que há brasileiros capazes de defender a crueldade humana. Determinei, portanto, a adoção de medidas cabíveis para que o vereador seja responsabilizado pela sua fala”, afirmou o governador.
g1