A Câmara de Vereadores de Conceição de Coité, município localizado no território do sisal, aprovou por unanimidade, em sessão ocorrida no dia 10 de julho, o projeto de criação do Museu Municipal Maria Neves de Freitas (Maria Palheira).
Em entrevista concedida ao Programa Levante a Voz da Rádio Sociedade News FM, na manhã do último sábado (29), o escritor, cordelista e poeta, Carlos Neves, disse que o objetivo “é mostrar ao povo a nossa cultura, a exemplo do repente, Literatura de Cordel e objetos utilizados pelo sertanejo”.
“Pretendemos inaugurar o museu no mês de dezembro deste ano, a lei foi sancionada no dia 19 de julho, estamos em fase de implantação e a ideia do museu é levar para o município a oportunidade de mostrar ao povo a nossa cultura em todos os sentidos e servir de instrumento de pesquisa, extensão e estudo para toda a região, isso é uma multi ferramenta no sentido educacional, educação acima de tudo”, disse.
Segundo Carlos, o museu já existe há mais de 20 anos e abraça tudo que for referente à cultura nordestina.
“Esse museu já existe há mais de 20 anos, foi criado inicialmente para trabalhar com a Literatura de Cordel e o circo mambembe, foram aparecendo outras culturas como samba de roda, forró pé de serra, tradições nordestinas principalmente, e dentro dessas culturas, também resolvemos enquadrar o circo mambembe e o repentismo acima de tudo, porque o repentismo é transdisciplinaridade, fala de todos os assuntos, e como veio do Cordel para o repente, trabalharemos no museu não só questão da antiguidade do material, porque quando se fala em museu pensamos em coisas antigas, mas não é só antiguidade, museu trabalha com coisas antigas, modernas, atuais, é integrativo, interativo, estético por causa da sua formação e também estático por estar em lugar fixo e itinerante por trabalhar visitando as cidade vizinhas”, comentou.
Acervo do Museu
“Quando estava coordenador da Universidade do Estado da Bahia (UNEB) Campus de Conceição do Coité, me deparei com essa questão da literatura popular e criei gosto por isso e implantei esse museu em Coité, já tem um local, um prédio próprio que deixei desde 2005 a disposição para colocar objetos e o cidadão de Nazaré das Farinhas que residia em Salvador chamado “Papada”, repentista, nos cedeu mais de 30 anos de arquivos, estava com câncer terminal e só tinha doze meses de vida, e doou muito material para esse museu, e eu resolvi criar esse espaço, já tivemos muitos eventos com esse museu, faço feiras, palestras e muito trabalho com esse museu, só que o município resolveu abraçar a causa agora e o prefeito de Coité encaminhou o projeto para que pudéssemos oficializar o museu e nesse projeto criarmos uma sede com funcionários, um museu normal e servir para toda a região, não só Coité, temos a perspectiva que isso funcione, venha a ser um trabalho que interaja com outros estados e com o país inteiro, até porque recebemos em 2021, um prêmio federal com menção honrosa do Pedro Melo Franco e o museu já tem uma dimensão internacional, faltava apenas oficializar. Há uma variedade de objetos regionais, você vai encontrar uma diversidade, porque eu escrevi na abertura da apresentação do museu, o seguinte: “Quando resolvi criar esse espaço cultural foi para valorizar o nosso povo plural, acolhê-lo com amor, contar a luta, o labor, a fé, história e tradição mostrando a diversidade, arte e ancestralidade através da educação”, quando colocamos essa abrangência, além de ter os objetos, o museu será para palestras, eventos, lançamentos de livros, concursos e outras coisas que possamos trabalhar no sentido educacional, é uma multi ferramenta que certamente abrangerá as escolas, universidades, associações e todo o povo da região, além dos objetos, porque, como dizia a minha avó: “o que não é contado não é visto”, as pessoas visualizarão e estará lidando com objetos antigos e novos que serviram aos nossos antepassados e que certamente a juventude não conhece, a tecnologia proporciona o contato virtual, mas no museu, veremos presencialmente”, afirmou.
Ao ser questionado porque não se vê a divulgação da Literatura de Cordel nas escolas, o escritor afirma que o museu vem justamente para isso: ensinar aqueles que tem vontade de aprender.
“Uma certa época me perguntaram o que era repentismo, e fica difícil definir, criei uma estrofe que diz o seguinte: “Estudando a fenomenologia para saber o que é ser repentista, descobri que esse tipo de artista é mistério para a antropologia, o seu dom, força e magia enaltece a cultura brasileira, paladino com arte alvissareira, defensor das culturas e do sertão, um sacrário da santa inspiração, comungando a viola altaneira”, ou seja, o repentista para mim é um mistério que não foi desvendado, é uma das coisas mais complexas que vejo na cultura popular é o repente, temos excelentes aprendizes, inclusive aqui em Feira, temos a liderança de repente que era Caboclinho, o seu pai Dadinho e João Ramos que difundiram bastante a Literatura de Cordel e do repente, tenho meu amigo particular “Bule Bule da Bahia”, que diz uma coisa muito interessante, que até citei em um congresso recentemente: “sou como fruta madura que cai do pé lentamente, que quando cai se espatifa e atira fora a semente, procurando terra fértil para ser fruta novamente”. Essa terra fértil a que ele se refere, são justamente essas pessoas que têm vontade de aprender, e o museu vem com esse papel de abrir espaço para oficinas, palestras, entendimento, difundir mais, porque infelizmente a mídia maior não produz isso e quando o faz, limita na fala por questões políticas, gestão de normas, estatutos e outras coisas, e ficamos impedidos de dizer como o repente é irreverente, o Cordel tem a sua sensibilidade, Cordel diverte, adverte, converte e tem esse papel de ser muito mais amplo, ficamos na preocupação de que essa cultura realmente acabe, mas, precisamos incentivar e o museu é essa ferramenta, as escolas precisam aderir as oficinas e as visitas para que possamos criar esse sabor, adocicar as palavras através das rimas das músicas, das criações diversas, tem a questão hip hop no que se refere ao improviso, fazemos essa fusão de culturas para agregar ao currículo escolar disciplinas voltadas para a cultura popular, precisamos muito disso”, concluiu.
Reportagem: Luiz Santos e Hely Beltrão do site conectadonews.