Faz profunda falta um autêntico senso de ecumenismo entre as igrejas que coexistem numa região como o semiárido, aturdida pela violência que predomina sobre a pauta da imprensa regional, sem nenhum gesto conjunto, sobretudo da parte daqueles que se consideram seguidores de Jesus.
O que ressaltam – cada um na sua tribuna, como se ela fosse única – são os sermões, as acusações do pecado individual, com raras e honrosas exceções em que mencionam a omissão das entidades civis e públicas. Parecem, em boa parte, esquecidos de quanto afirma Jo 12, 47 – que Jesus não veio condenar o mundo, mas salvá-lo.
Enquanto, em muitos lugares, nas periferias das metrópoles, conforme documentou a Verbo Filmes, pastores e padres se dão às mãos em caminhadas pacifistas, projetos conjuntos de enfrentamento da violência, nesta região, muitos religiosos contentam-se com gastar seu tempo e seu verbo em garantir novas gerações de fieis para suas igrejas, como se o simples fato de fazer os jovens mais religiosos solucionasse o processo de recrudescimento da violência no interior do país.
Muitos líderes religiosos fecharam-se na defesa de suas regras internas, têm até boas ideias, mas não conseguem levá-las a cabo, porque alguns ainda se acham demasiado presos a uma mentalidade bem intencionada, porém, muito provinciana, chegando a lembrar a época do padroado.
A propósito, perguntaram outro dia a D. Cláudio Hummes o que ele teria a dizer aos novos presbíteros e o jovem cardeal idoso disse o seguinte: “Eu diria que antigamente se acreditava que uma cidade tem três autoridades, que são o padre, o juiz e o delegado, mas não é mais assim.”
As autoridades eclesiais, seja no catolicismo ou não, reivindicam sutilmente para si uma importância que de fato existe, mas é a importância de qualquer cidadão participante e, como cidadãos participantes, os clérigos de diferentes denominações deveriam se sentir menos empoderados pela lógica antiga do poder local e mais pela lógica moderna dos direitos individuais, políticos e sociais, que são para todos.
Dom Cláudio Hummes traz, portanto, uma pista para se fazer religião, compreendendo as profundas mudanças por que passa a humanidade, enquanto o pensamento religioso conservador espera melhorar a realidade por meio da volta aos hábitos do passado, à ideia de superioridade do catolicismo, a observação estrita dos ritos, a defesa da veneração inquestionável às imagens, etc.
Como resultando, tem-se cada vez mais espécies de panelinhas religiosas, com gente que deseja sinceramente fazer o bem – e tantas vezes o fazem – mas fazem muito menos bem do que poderiam, porque pouco se abrem, pouco escutam e mal reagem à visão crítica de quem quer que seja. Estão sempre na defensiva, com medo de suas igrejas deixarem de ser aquilo que sempre foram.
Chega a ser preocupante o silêncio e a inércia das igreja locais, nos tempos difíceis que as cidades enfrentam, com jovens vitimados constantemente pela violência e pela falta de atenção. Enquanto isso, os mais conservadores preferem a pregação fundamentalista, as ações isoladas, a crítica estéril aos governos e, muitas vezes, nem isso.
Frente ao quadro que se delineia, cabe-nos, bem mais que denunciá-lo, criar condições e oportunidade de sadio ecumenismo e macroecumenismo, entre os atores religiosos diversos que compõem a sociedade local. Eles precisam sentar à mesma mesa, analisar os dados e apontar caminhos, em conjunto, porque o isolamento das entidades religiosas não sinaliza um autêntico cuidado para com a paz, que vem a ser um distintivo dos cristãos.