Para comemorar o encerramento do mês de novembro, dedicado a Consciência Negra, foi realizado durante todo o dia de domingo (30), uma série de atividades com palestras, apresentações culturais e uma plenária da Associação Comunitária do Alto do Jitaí, em Retirolândia, com o objetivo de trocar ideias sobre a importância do local ser reconhecido comunidade Quilombola. O presidente da Associação, Antonio César Silva de Jesus falou ao CN do desejo de ver a comunidade reconhecida como Quilombola, uma luta de mais de mais e 10 anos, quando foi conhecer o povoado de Coqueiros, em Mirangaba, na região de Jacobina, que já tem o reconhecimento.
Nayara Cunha da Silva, técnica do Movimento de Organização Comunitária (MOC), uma das entidades parceiras, explicou sobre as tramitações para legalizar a comunidade e abriu espaço para perguntas dos moradores. As comunidades quilombolas são grupos que possuem uma identidade cultural própria e que se formaram por meio de um processo histórico que começou nos tempos da escravidão no Brasil e simbolizam a resistência a diferentes formas de dominação além de manterem forte ligação com sua história e trajetória, preservando costumes e cultura trazidos por seus antepassados.
Para Amélia Bispo Nascimento, representante da Liga Rede de Mulheres Negras da Bahia e ex-presidente da Associação Paulista dos Portadores de Doenças de Chagas, a política de reconhecimento dos “remanescentes das comunidades dos quilombos”, expressa na Constituição Brasileira de 1988, introduz um relevante debate para aqueles que se interessam por uma reflexão crítica sobre os limites e as possibilidades de interlocução entre o conhecimento jurídico e o conhecimento antropológico no contexto em que ambos estão voltados à defesa dos grupos sociais que contam com garantias constitucionais.
Patrícia Moreira, professora de dança do Serviço de Convivência, com a rainha mirim da festa, Sines Raquel, 5 anos, falou o CN que tem feito sua parte ensinando as danças afros, como forma de manter viva a cultura na comunidade. “Hoje, neste encontro de raças, fizemos diversas apresentações, previamente ensaiadas e estudada pelos participantes. Foi muito bonito”, concluiu.
Um grupo de mulheres também se organizaram, segundo Patrícia, para confeccionarem artesanatos com produtos da região e colocaram para serem comercializados durante todo dia. O grupo responsável por este trabalho é intitulado “Mulheres de Fé”.
A dona de casa Tonhiza Bispo dos Santos, entusiasta pela ideia, já foi a Salvador, visitou a Fundação Cultural Palmares, responsável pela formalização da existência destas comunidades, assessorá-las juridicamente e desenvolver projetos, programas e políticas públicas de acesso à cidadania. Ela disse ao CN que tudo começa com a ata onde os membros da comunidade aprovam, por maioria, o pedido de reconhecimento em plenária no domingo e será encaminhada a Fundação solicitando o Reconhecimento como Comunidade Remanescente de Quilombo, juntamente com o relato histórico com fotos, reportagens e estudos que tratem da história do grupo ou de suas manifestações culturais.
Após o recebimento da documentação na Fundação Palmares, é encaminhada a abertura de processo para posterior análise técnica. Se a documentação estiver correta, o próximo passo é a visita técnica de um membro da Fundação que fará reunião com a comunidade para sanar possíveis dúvidas, conhecer a realidade da comunidade e elaborar relatório. Concluída essa etapa, é encaminhada a publicação do ato de reconhecimento da comunidade como remanescente de quilombo, no Diário Oficial da União. Caso a documentação não esteja completa, a comunidade é informada quanto à pendência.
Um dos moradores mais velho da comunidade, Antonio de Jesus, 96 anos, assemelha-se aos escravos. Analfabeto, solteiro, mora a mais de quatro décadas em uma casa anexo à residência da prima Idelcina Maria Francisca de Jesus, 69 anos. Ao longo da vida, sempre trabalhou na roça, especialmente no sisal, onde foi resideiro. A diferença de “Te Toco”, como é conhecido, é que, desde que se “entende como gente”, contou ele, nunca calçou uma sandália ou sapato.
Dona Idelcina lembrou que recentemente comprou um sapado para ele, ia ao fórum em Valente, “mas ele não conseguiu andar, ficou sapateando no lugar e pedir desculpas ao povo do cartório, mandei ele tirar, ficando bem mais a vontade (Risos)”, concluiu.
Redação CN * fotos: Devdy Willian