O mecânico André Bernardo Rufino Pereira foi preso injustamente pela segunda vez no lugar de um criminoso morto. Anos antes, os documentos do mecânico foram roubados e usados pelo homem no Maranhão (entenda ao longo da reportagem). A foto acima mostra o momento da prisão, que aconteceu na quinta-feira (23), enquanto ele trabalhava em uma oficina em Goiânia.
“Ele já foi inocentado, estou achando até estranho isso aí. De novo? Na época tinha até uma divergência […] Cara tinha tatuagem ”, argumentou Carlos Eduardo, chefe de André na oficina.
“Bem diferente de mim”, completou André.
“Você tem que ver no Judiciário”, respondeu o policial que cumpria o mandado.
A defesa de André informou que ele foi detido por conta de um erro da Justiça do Maranhão. Em nota, a 1ª Vara de Entorpecentes do Estado do Maranhão detalhou que houve uma duplicidade no cadastro de André no Banco Nacional de Monitoramento de Prisões (BNMP). Segundo a Justiça do Maranhão, o Sistema Prisional de Aparecida de Goiânia sabia da duplicidade e entrou em contato para verificar a autenticidade e evitar a prisão indevida e que já havia um alvará de soltura em favor do André (leia nota completa no fim da reportagem).
Segundo o advogado de defesa Humberto Vasconcelos Faustino, André foi preso por meio do mesmo mandado de prisão cumprido incorretamente em 2022. A Diretoria-Geral de Polícia Penal (DGPP) confirmou que foi emitido o alvará de soltura do mecânico. Ele ficou preso por 7 horas. Da primeira vez, em 2022, foram 16 dias na prisão.
“Dessa vez a gente conseguiu demonstrar ao Tribunal de Justiça do Maranhão que esse mandado de prisão tinha sido cumprido outra vez e, segundo a servidora que me atendeu, ela reconheceu que estava em duplicidade”, informou a defesa de André.
Segundo a Justiça do Maranhão, aconteceu uma “situação excepcional” por conta da existência de dois registros com o mesmo nome, sendo apenas um deles realizado pela Justiça do estado, mas com dados incompletos em um dos registros.
Por e-mail nesta sexta-feira (24), o g1 pediu informações ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) questionando a duplicidade do registro de André no Banco Nacional de Monitoramento de Prisões (BNMP), mas não teve retorno até a última atualização desta reportagem.
Criminoso morto
Como noticiado no g1 Goiás em 2022, um laudo da Polícia Técnico Científica mostrou que Rômulo Sobral da Costa, criminoso que teria se passado pelo mecânico, morreu em 2016. André foi preso pela primeira vez no dia 31 de janeiro de 2022 e o laudo mostrou que Rômulo foi morto no dia 28 de janeiro de 2016, com ferimentos causados por arma de fogo.
Trauma
A foto divulgada no início desta reportagem mostra André sendo revistado e colocado na viatura. Emocionado, o chefe do mecânico lamentou a prisão.
“Aparecia viatura aqui na frente e a gente já ficava afetado por causa do trauma e aí acontece de novo, nem sei como vai ficar a cabeça dele. Muito ruim. É uma pessoa trabalhadora, convive com a gente, pra mim é tipo um filho”, desabafou.
André Bernardo foi preso por meio do mesmo mandado de prisão cumprido incorretamente em 2022, segundo a defesa. Mecânico teve documentos roubados usados por criminoso que morreu em 2016.
Por e-mail nesta sexta-feira (24), o g1 pediu informações ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) questionando a duplicidade do registro de André no Banco Nacional de Monitoramento de Prisões (BNMP), mas não teve retorno até a última atualização desta reportagem.
A primeira prisão
A família de André contou que em 2012 ele teve os documentos roubados em um assalto e chegou a registrar um boletim de ocorrências. Porém, a identidade dele teria sido usada por Rômulo Sobral.
Durante a prisão, Rômulo apresentou o documento de André, mas com a foto de outra pessoa. Segundo a polícia, o suspeito acabou fugindo da cadeia e um mandado de prisão foi expedido pela Justiça maranhense com os dados pessoais do mecânico goiano.
“Achei uma injustiça muito grande. Eu saí para trabalhar e 9h ele me ligou dizendo que estava sendo preso e era para arrumar um advogado para ele. Eu fiquei desesperada, comecei a chorar, não sabia o que fazer, porque a gente sempre trabalhou certinho”, disse Lúcia Aparecida Leite, esposa de André.
Na época, o irmão de André, Antônio Bernardo, ficou revoltado com a situação. “Meu irmão [ficou] preso lá por causa de vagabundo que falsificou o documento dele. Ele [ficou] pagando por algo que não fez, [ficou] no lugar errado. Eu, como irmão, preferia estar no lugar dele e ele solto”, disse.
Nota TJMA
A 1ª Vara de Entorpecentes do Estado do Maranhão esclarece que não houve expedição de um novo mandado de prisão.
Identificou-se a duplicidade no cadastro do senhor André Bernardo Rufino Pereira no Banco Nacional de Monitoramento de Prisões (BNMP), sistema que registra, consolida e integra informações sobre pessoas presas e sujeitas a medidas diversas da prisão em todo o território nacional.
No momento da expedição do mandado de prisão, os mandados foram vinculados a ambos os registros no sistema. No entanto, após o cumprimento, a baixa foi efetuada apenas no registro realizado pela 1ª Vara de Entorpecentes, onde constava o cumprimento da prisão e de competência da Justiça do Maranhão.
Atentos à duplicidade, na tarde de 23 de maio de 2024, o Sistema Prisional de Aparecida de Goiânia efetuou contato para verificar a autenticidade do mandado e evitar detenções indevidas. Na ocasião, também foi informado que já havia um alvará de soltura no respectivo processo e que não existia decreto de prisão em desfavor do senhor André Bernardo Rufino Pereira, além do envio do contramandado no registro RJI 224187500-17.
Ocorreu uma situação excepcional devido à existência de dois registros com o mesmo nome – sendo apenas um deles realizado pela Justiça do Maranhão – mas com dados incompletos em um dos registros, como a ausência de CPF, que reflete na referida situação.
O Poder Judiciário do Maranhão vem unindo esforços com os órgãos de Justiça superiores para minimizar as inconsistências nos dados do sistema BNMP, incluindo mutirões nacionais, e para o desenvolvimento de ferramentas que auxiliem os seus usuários e evitem divergências de informações na base de dados.
CN | g1