A produção baiana de sisal deve ganhar novos mercados nos próximos meses. Em Valente, a 238 quilômetros de Salvador, a Associação de Desenvolvimento Sustentável e Solidário da Região Sisaleira (Apaeb) foi certificada com a ISO, sigla em inglês que significa Organização Internacional para Padronização.
Com a certificação, concedida pelo Instituto Baiano de Metrologia e Qualidade (Ibametro), a diretoria da Apaeb espera que o sisal seja utilizado, inclusive, pelo setor automobilístico nacional e internacional.
O reconhecimento que amplia as possibilidades de novos negócios é fruto de uma ação do programa Progredir, da Secretaria Estadual de Ciência, Tecnologia e Inovação (Secti), que apoia o Arranjo Produtivo Local (APL) do Sisal. A certificação foi concedida porque se constatou que a Apaeb segue à risca orientações como utilização de equipamentos de proteção individual (EPIs) pelos trabalhadores associados, ausência de trabalho infantil e danos evitados ao meio ambiente.
A produção de 140 máquinas desfibradoras, que evitam a mutilação de quem as opera, viabilizada por meio de um convênio entre o governos estadual e federal, foi outro fator que contribuiu para que a ISO fosse concedida à entidade.
Segundo o diretor-executivo da associação, Ismael Ferreira, o sisal é a principal atividade econômica da região. “Há muito tempo discutimos a possibilidade de novos usos para a fibra. Entre essas discussões está a utilização pela indústria automobilística. Para isso precisávamos realizar todo um trabalho de certificação, inclusive a ISO 9001”.
Peças como parachoques, caixas de vidro, painéis e maçanetas internas poderão ser confeccionadas na produção de automóveis, utilizando um composto que usa partes iguais (1/3) de sisal, polipropileno e plástico reciclado. “Ao ser submetido a um processo de aquecimento, esse material pode ser moldado e transformado em diversos acessórios do veículo”, explicou Ferreira. Ele informou que a Ford já demonstrou interesse em usar o material. “A ideia é que sejam utilizados nove quilos de sisal por veículo produzido”.
Cultura o ano inteiro
No Território do Sisal, 20 municípios desenvolvem a atividade sistematicamente. O engenheiro agrônomo da Secti, Robinson Andrade, é o coordenador do APL do Sisal. “Como não chove muito, a atividade sisaleira é a única cultura desenvolvida o ano todo na região”, observou.
Estima-se que cinco mil produtores tenham participado das atividades promovidas pelo APL, que é apoiado pelo Progredir. São dias de campo, seminários sobre como lidar com as doenças da planta (agave sisalana), entre outros eventos realizados para tocar a produção.
“Desenvolvemos o Progredir com a parceria do Sebrae. Dessa forma, trazemos inovação para o APL, sempre buscando melhorar as instituições e as empresas que atuam no segmento”, afirmou Andrade.
O representante da Secti revelou que três empresas já estão no processo de certificação e que paralelamente está sendo realizado um trabalho que busca adequar outras empresas e associações para a certificação da fibra, melhorar a qualidade da matéria-prima e a competitividade no mercado externo, além da abertura de novos mercados, a exemplo da indústria automotiva, que se apresenta como um possível comprador em potencial.
“Também temos ações de acesso a mercado, como feiras dos grupos de artesanato, consultorias em diversas áreas, sempre visando potencializar as empresas aqui do Território do Sisal que trabalham com a cadeia produtiva”, declarou o engenheiro agrônomo.
De pai para filho
O sisal é uma fibra extraída de uma planta da família das agaváceas. Após a corte das folhas alongadas, a fibra passa pela máquina, que a separa da cutícula e da bainha e, em seguida, inicia-se o processo de secagem ao sol. Quem vê a planta espinhosa, verde-escura, no solo árido e sob o sol causticante, não consegue imaginar que dela podem ser produzidos tapetes, cordas, bolsas, cestos, entre outras peças desenvolvidas pelos artesãos baianos.
Conhecido como ‘Zé de Jorge’, numa referência ao pai, o pequeno agricultor José Elias Lima Lopes começou a produzir sisal ainda na infância, quando trabalhava na roça da família. Ele vive com a mulher, filhos, genro e netos na zona rural de Valente, onde também são criados caprinos e ovinos para complementar a renda.
“Com 11 anos comecei a trabalhar com sisal, carregando fibra. Já fiz todos os processos do sisal. Até hoje, sobrevivo disso. Todo mundo daqui da região sobrevive dele. Nossa região é muito seca, por isso temos que possuir um manejo correto para ter um produto de boa qualidade, senão não temos um preço bom. O que eu produzo aqui vai para a indústria. Lá eles tratam a fibra, fazem todo o processo e comercializam”, disse ‘Zé de Jorge’. Ele ressaltou que o toque feminino também está presente na cadeia produtiva. “As próprias mulheres confeccionam o artesanato e não precisam ir para a cidade procurar emprego. Isso já ajuda a família”.
Liderança na produção
De acordo com dados da Apaeb, a produção de sisal diminuiu nos últimos anos, em função de crises financeiras e questões cambiais. Mesmo com as adversidades, o Brasil continua como o maior produtor mundial da fibra. A Bahia é o estado líder absoluto na produção, com 110 mil toneladas por ano, o que corresponde a 95% da produção nacional.
Atualmente, mais de 500 famílias são associadas à Apaeb, mas outras milhares são beneficiadas pelas ações e pesquisas aplicadas na região. “Nossa associação tem 30 anos de existência. Temos quase quatro mil famílias integradas em 15 cidades da região. Não precisa ser sócio para se beneficiar dos projetos”, disse Ismael Ferreira.
Fonte: Agecom