A polícia de Teofilândia ainda não tem pista de Valmir Bispo Campos, 30 anos, morador no Povoado de Baixão, zona rural do município, filho do fazendeiro Emar Pinto Campos, que é acusado de ter assassinado o sem terra Edvaldo Bispo de Santana de 54 anos, que residia no Povoado Olhos D’água. O crime aconteceu quinta-feira (12/04/12), ás 11h30 no cruzamento da estrada vicinal de acesso ao Povoado do Setor á Biritinga com o corredor que foi recentemente ampliado pela Prefeitura na região da Fazenda Boa Esperança, onde ficavam os barracos dos sem terras que ocuparam a fazenda em 2009.
Segundo depoimento a polícia, Paulo Santos disse que houve uma discussão entre Emar e Vardinho, que não gostou da ação do fazendeiro em cercar o principal acesso das 20 famílias que haviam ocupado a terra e questionava, que ele não era dono da área e se tratava de um terreno improdutivo e insistia em dizer: “você está fechando nosso caminho e isto não está certo, pois você não é dono de nada aqui, foi quando Vardinho foi atingido por um golpe de estaca desferido por Valmir Bispo”, contou Paulo.
Depois de praticar o crime, os três, percebendo que Vardinho estava morto deixaram o local e o corpo do sem terra próximo da bicicleta e caído por cima do facão na bainha, aparentando não ter ocorrido resistência por parte de Azulão.
O agricultor conhecido por Zé Martinho havia passado momentos antes e viu os três trabalhando na construção da cerca e ao retornar, encontrou o corpo de Vardinho ao lado da bicicleta e os três homens não mais estavam no local, deixando apenas a corda que estava sendo usada para esticar a cerca e duas bolas de arame farpado, tendo levado na fuga apenas os instrumentos de trabalho.
Trabalhadores voltam à área ocupada
Após o assassinato de Vardinho, os trabalhadores voltaram à área de conflito na manhã de segunda-feira (16), acompanhado da equipe do CN e do segundo secretário de Política e Agrícola e Agrária do Sindicato dos Trabalhadores Rurais e Agricultores Familiares (SINTRAF), Lírio Rosa de Jesus “Lirão”. Um dos momentos de tensão foi quando o agricultor Antônio Cerqueira Fagundes, “Toinho”, cunhado da vítima, se deparou com a grande quantidade de sangue que ainda existia no local e se afastou dos companheiros e começou a chorar e dizer que este crime não ia ficar impune e confiava na justiça do “céu” e da “terra”.
A terra em questão é a Fazenda Boa Esperança, com duas mil tarefas, situada há 27 km de Teofilândia e 9 km do Povoado Setor. A princípio as terras foram adquiridas pela Empresa Agrícola Santo Amaro em 1981 que pretendia plantar eucalipto, cuja experiência não deu certo e foi contratado José Ovídio dos Santos, morador da região, para ficar tomando conta e alugando para criação de gado, segundo um dos ocupantes, Manoel Santos, 57 anos. Com o passar do tempo, a empresa deixou de repassar o pagamento do contratado, inclusive com carteira de trabalho assinada em 05 de janeiro de 1983, criando especulação em torno da ocupação da área e Ovídio dos Santos, diante dos comentários, cercou uma pequena área de 100 tarefas, onde trabalha e sobrevive com a família.
Este é terceiro grupo que ocupa a área. O agricultor Sílvio Santana, 42 anos, contou que inicialmente um grupo de sem-terras veio de Feira de Santana em 1998 e ficou por um pequeno período na ocupação e no ano seguinte (1999) o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Biritinga organizou outro grupo de trabalhadores, criou uma associação e ensaiou a divisão dos lotes, mas a experiência também não foi à frente.
Em 2003, de forma mais organizada, um novo grupo com 20 famílias procurou a Coordenação de Desenvolvimento Agrário – CDA, órgão vinculado a secretaria de agricultura do estado da Bahia, comunicou a existência da terra e o desejo de ocupar. Foi orientado a criar uma associação e tudo transcorria normal, até o surgimento de um documento, que eles dizem que foi falsificado por Emar Pinto Campos teria comprado 1.420 tarefas de um homem identificado como Amado Ferreira Medeiros.
Emar disse ter uma liminar concedida pelo então juiz Edvaldo Jatobá (falecido) e se sentindo dono, recentemente vendeu 304 tarefas por R$ 60 mil, tendo recebido apenas R$ 30. “A questão agrária aqui na região tem provocado morte. Este é segundo caso, pois na virada do ano 2001/2002, foi assassinado na área de ocupação da Fazenda Varginha, o líder Sindical Edvaldo Lima. Daí a nossa pressa em resolver de forma pacífica e conforme a justiça”, concluiu o agricultor.
A tensão na área é muito grande, pois no domingo de páscoa, quatro dias antes do assassinato de Vardinho, atearam fogo em todos os barracos onde ficam os trabalhadores e seus familiares. O primeiro a chegar para trabalhar na segunda-feira (09), foi José Ferreira, 58 anos, e se deparou com o quadro pavoroso de todos os barracos destruídos pelo fogo e o plantio das árvores frutifica arrancadas. “Aproveitaram que a gente estava comemorando a páscoa na comunidade do Setor, para fazerem esta tragédia, pois se a gente tivesse aqui, isto não acontecia. Durante a semana permanecemos trabalhando e conosco mais de 20 cachorros, já para impedir que estranhos se aproximasse dos barracos”, contou Zé Ferreira.
Decididos a permanecerem na terra, os trabalhadores disseram que vão reconstruir os barracos, continuar a organizar suas roças e criaram uma comissão para ir a Salvador pedir agilidade neste processo a CDA, temendo que possa acontecer outro crime.
Os agricultores disseram também que Emar, pai de 12 filhos, a maioria residente em São Paulo, responde outros processo por causa de questões agrária.
Família pede Justiça
A equipe do CN foi até a residência de Edvaldo Bispo de Santana, na região dos Olhos D’água e encontrou com José, Carlos, Selma, Ailton e Edmilson, cinco, dos seis filhos que a vitima deixou. A viúva Maria Cerqueira e a filha Telma, tinham viajado para a cidade, onde foram resolver assuntos relacionados à bolsa família
Selma Fagundes Santana, casada, residente no Povoado do Setor, onde o corpo do pai foi velado, contou que em outras ocasiões que seu pai se encontrava com Emar acabava em “bate-boca”, por causa das terras. “Esse monstro (referindo-se ao acusado de ter assassinado o pai), mora no Povoado do Baixão e passava sempre pela estrada do Setor ao Quererá (Araci) e quando se encontravam acontecia, casualmente este bate-boca”, falou Selma, enquanto aclamava um dos irmãos que mora em Minas Gerais, veio para o sepultamento do pai e retornou na noite de segunda-feira.
Selma não sabe qual será o destino da mãe, se fica morando na “roça”, uma casa cercada de pés de cajueiros, em um pequeno espaço de terra, de onde a família tira o sustento, com dificuldade, já que Vardinho “se virava” com a venda das raízes de pau do mato ou se vai para o Setor. “Nós não vamos fazer justiça com as nossas mãos, entregaremos a Deus e a Justiça dos homens. Esperamos que ele pague pelo crime, pois meu pai era uma pessoa muito boa”, desabafou.
O líder Sindical Liro Rosa, “Lirão”, lamentou que apenas o Sindicato dos Trabalhadores Rurais e Agricultores Familiares de Conceição do Coité esteja junto com os trabalhadores neste momento de dor. “Só eu de sindicalista estive no velório e no sepultamento e não é assim. Numa luta, todos devem participar e vamos continuar ajudando e orientei as famílias que não desista de lutar pela terra”, falou Lirão.
Segundo o sindicalista, a solução do problema esta bem avançada junto a CDA, inclusive com a inclusão dentro do plano de habitação rural e a do assentamento será em um local dos mais bonitos da região e esta sendo implantado um projeto de energia eólica, que provém do vento e das torres, como experiência, estar sendo assentada. “Este assentamento será uma referência, pois as terras são boas, estão improdutivas, será beneficiada com energia eólica e a CDA tem que adiantar o processo, pois as pessoas querem viver e trabalhar de forma digna”, afirmou Lírio Rosa.
Ao passar pela delegacia de Teofilândia no final da manhã de segunda-feira, Lirão ficou revoltado ao saber que ninguém havia sido preso até o momento, ao contrário das conversas na área da ocupação. O pai do autor suspeito, Emar Pinto Campos e o seu emprego Paulo Santos, foram ouvidos e liberados pelo delegado titular daquela cidade Getúlio Queiroz. “Sabemos apenas que o motivo da agressão foi por causa de uma cerca construída na localidade próxima ao acampamento Santa Virgínia, onde o fato aconteceu”, resumiu um agente que estava de plantão.
Por: Valdemí de Assis / fotos: Raimundo Mascarenhas