Num cenário de desespero, muita correria, sangue e mortes, os passageiros se amontoaram na pista e procuravam socorrer os casos mais grave, enquanto chegavam às ambulâncias da SAMU e das Prefeituras da região e levavam para os hospitais de Teixeira de Freitas, Itamaraju, Eunápolis, Porto Seguro e Itabuna. De acordo com a Polícia Rodoviária Federal, o primeiro ônibus bateu no fundo da cegonha, que pode ter reduzido a velocidade ou parado por causa da pouca visibilidade provocada pela neblina e os ônibus que vinham logo atrás não conseguiram parar, provocando o engavetamento.
O condutor de um dos ônibus ainda tentou evitar a colisão, indo para a contramão e acabou atingindo a viatura da CIPE-Mata Atlântica, provocando ferimento leves nos policiais integrantes da guarnição. Segundo um patrulheiro rodoviário que falou por telefone com o CN, todas as vítimas estavam nos ônibus e que a maioria morreu atropelada, pois teriam descido dos veículos e ido para o meio da rodovia, sendo colhido pelos ônibus que vinham atrás dos primeiros veículos envolvidos no acidente.
Cinco vitimas fatais foram identificadas como Humberto Cláudio de Jesus Souza, 44 anos, Marilson Santos do Nascimento, 31 anos, Sebastião Brito Silva, 53 anos, Valmir Ribeiro da Silva, 52 anos, e Maria de Jesus Santos, 21 anos. A sexta vítima, uma mulher, ainda não foi identificada pelo IML.Todos os mortos são da cidade de Itamaraju
Colheita do café atrai trabalhadores do território do sisal – Mais de 1.500 trabalhadores rurais, só do município de Santaluz, segundo estimativa de Sostenes Cunha Alves, que há dez anos trabalha transportando lavradores, migraram nos últimos trinta dias para Minas Gerais, onde por 90 dias, trabalham na safra do café. Só na quinta-feira (24), dois ônibus passaram pelo município recolhendo estes trabalhadores, que pagam R$ 200 de passagem e durante o período que ficam em Minas Gerais, custeia seus alimentos, calculado em R$ 300 mensal e tem que economizar para mandar dinheiro para família que ficam na Bahia.
Os trabalhadores que viajaram na quinta-feira, seguiram com destino ao município de Bom Jesus, distante 1.700 km da região onde residem e encaram a viagem geralmente em ônibus clandestinos, por 30 horas. Eles são convocados por uma pessoa que é tratada de “turneiro”, que se incube de formar os grupos e contratar os transportes, cuja passagem são pagas após 30 dias, quando os lavradores recebem seu primeiro salário.
Sostenes Cunha disse ao CN que não havia nenhum ônibus que transportava trabalhadores do território do sisal envolvido no acidente e que havia ligado para o local onde os lavradores iriam desembarcar e todos haviam chegado bem. Ele acompanhou no início da tarde de quinta-feira o embarque de 30 trabalhadores da região para Minas Gerais e garantiu que os ônibus contratos todos tinham condições de fazer a viagem e foram lotados, deixando inclusive de levar 12 pessoas para não haver superlotação.
José Edmilson Carvalho de Oliveira, 26 anos, residente na região da Nova Campina, distante 30 km da sede de Santaluz, é natural de Conceição do Coité e casou com uma mulher da região, com quem tem dois filhos. Ele foi um dos 12 trabalhadores que deslocaram de suas comunidades no inicio da manhã de quinta-feira (24) e não conseguiram lugar nos ônibus para seguir viagem e passaram todo o dia as margens da BA 120, próximo ao Posto Pouso da Garça, em Santaluz, aguardando um transporte para retornarem outra viagem para Minas Gerais.
O ar de tristeza abateu os trabalhadores que disseram que não tem trabalho na região por causa da seca e a maioria trabalha na destoca dos pastos, que foram dizimados pela estiagem. Juarez Alves de Oliveira, 27 anos, lamentava que tomou R$ 100 a juros para gastar na viagem e teve que adiar para os próximos 15 dias.
Na bagagem que pretendia levar para Minas Gerais, dois sacos de sessenta quilos de farinha, pois, segundo Juarez Alves, era um meio de economizar nas refeições. “Não deixei dinheiro com minha mulher, pois não tinha. Conversei com o dono de mercadinho para vender fiado que mandava o dinheiro de lá”, falou o agricultor.
O presidente do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Santaluz, José Hamilton, esteve com os agricultores que não embarcaram e providenciou o transporte de retorno a suas comunidades. O líder sindicalista lamentou que agricultores familiares tivessem que sair do seu município para buscar a sustentação em outro Estado e lembrou o esforço da entidade para conseguir o crédito emergencial para evitar situação desta natureza.
O problema não se restringe ao município de Santaluz e fonte ligadas as Prefeituras na região produtora de café em Minas Gerais, garantem que passam de 5.000 baianos, na maioria do sertão, trabalhando como bóia-fria. Na terça-feira (22), um ônibus saiu do Distrito de Juazeirinho, município de Conceição do Coité, com 30 lavradores e outro recolheu bóias-frias residentes em Queimadas e Cansanção.
Com o início da safra de café, geralmente no inicio de abril, sendo que este ano choveu bastante na região e começou no mês de maio, perto de um milhão de trabalhadores rurais buscam emprego temporário fora de seus Estados e como aves de arribação, saem com destino fixo e retornam para casa após o término da safra, para refazer a rota no ano seguinte. A maioria vem da agricultura familiar e busca um complemento de renda.
A movimentação acontece longe dos olhos do governo, que não tem estatísticas sobre a migração temporária no campo. A inexistência de dados oficiais evidencia a falta de políticas públicas para enfrentar o problema e no ano passado, o governo federal tentou instituir a intermediação pública na contratação dos trabalhadores rurais, via Sine (Sistema Nacional de Emprego), em parceria com os Estados.
Sem carteira – Também fracassou a tentativa de exigir que a mão de obra rural saísse de sua área de origem com a carteira já assinada. A instrução normativa 76/ 2009, do Ministério do Trabalho, criou a Certidão Declaratória de Transporte de Trabalhadores (CDTT). Em tese, os migrantes rurais não poderiam deixar o local de origem sem o documento com identificação do contratante e o salário.
O ministério admite que pelo menos 90% dos trabalhadores rurais temporários saem sem carteira assinada. A formalização só acontece quando chegam ao destino e na maior parte dos casos eles são transportados em ônibus clandestinos, que circulam pelas rodovias federais e estaduais como se levassem turistas e o próprio trabalhador resiste em colaborar, por medo de que a fiscalização lhe tire a oportunidade de trabalho.
Como se instalam nas fazendas – Nas fazendas, os lavradores ficam em alojamentos do empregador e arcam com a alimentação, compram mantimentos fiado, para pagar no final da safra e os solteiros sonham em acumular dinheiro para comprar uma moto quando voltarem para suas terras, enquanto os casados esperam poder adquirir eletrodomésticos ou reformar a casa.
Por: Valdemí de Assis / fotos Adimário Reis e agências