Não me canso de lembrar de seu Marcelino, morador do meu bairro, janista doente, que arriscou tudo numa candidatura à vereança e quando viu que não teve sequer um voto, pois ele mesmo havia esquecido de votar em si, saiu dando chute no cachorro, pegou o gato pelo rabo, botou a filha para fora de casa, deu uns cascudos no genro, fez a mulher correr nua pelo bairro e quanto à filha pequeno que tinha quase que acabado de nascer decidiu que – por não ter culpa no cartório já que não estava na idade de votar – seria batizada de Urna e hoje os amigos a chamam de Ninha. O homem ficou tão possesso que perdeu a paciência e desrespeitou até o sub-delegado que veio se interpor ao problema familiar. Tomou a arma da autoridade e descarregou o revólver nos pombos que passavam em revoada. Foi preso. Nunca mais voltou para casa e deixou de lado este negócio de política.
Fico a pensar o que teria acontecido na casa de Ana Cecília, Deltonio Liberato, Dinamene Meireles, Eli Moreira e tantos outros vereadores da capital e do interior que não tiveram voto algum. Parecendo que se esqueceram de votar em si mesmo (pelo menos é o que está na relação do TRE. Pode ser outro tipo de problema, quem sabe). Acredito que são candidatos sub-judice nas mãos da Justiça.
Mas, Bárbara Rehem, Bruno Barros, Cássia Rufino, Maria Iracema, Anderson Muniz e mais uma dezena não venham me dizer que só tiveram apenas um voto, por questões judiciais. O que será que levou os amigos, namorado, marido, mulher, ex-namorados, casos, encostos a não dar o seu voto aos candidatos. Pelo que parece somente eles acreditaram neles mesmos. Com certeza é mais uma destas injustiças que o ser humano fica vitimado.
No caso de ninguém ter votado no candidato, é preciso ter uma natureza de ferro para não fazer como seu Marcelino que saiu chutando o balde. Senão vejamos: com toda certeza cada candidato deste se empenhou em levar grávida para o hospital com seu próprio carro ou pagando táxi no meio da madrugada. Para quantas pessoas do bairro não deve ter emprestado dinheiro, arrumado remédio, ajudado a bater a laje ou fazer um puxadinho, deixando de ir ao supermercado ou à praia. Quantas cestas básicas não devem ter “doado”. Sem falar que tirou filhos de prisão, ajudou marido a voltar para casa, empurrou carro quebrado, torceu para o Vitória, mesmo sendo Bahia, ajudou a carregar despacho para a encruzilhada, deu vestido de noiva para moça pobre ou nem tão moça assim, mas com certeza pobre. Arrumou emprego para trabalhador e advogado para vagabundo. Consolou corno e comeu feijoada azeda elogiando o gosto. E os caras vêm e não votam no candidato. Uma ingratidão.
Será que o candidato não merecia nem mesmo que sua família votasse nele? O cara é órfão de pai e mãe? Os filhos são de outro? A mulher fugiu com um surfista? O marido também? Também me lembro de dona Izildinha, cujo marido decidiu sair candidato a vereador. Ela perguntou para ele qual trabalho tinha feito para a comunidade e ele disse que nenhum, mas que podia dar certo, por considerar o eleitor burro. Conseguiu legenda para fazer número. A mulher contrariada jogou na cara que ele era preguiçoso, não se mexia, não colaborava em casa tendo ela de se acabar lavando roupa de ganho e nem o prato em que comia lavava. No dia da eleição ela foi para a porta da seção eleitoral se vingar com um cartaz: “Votar em Edvaldo? É melhor votar num cágado!”. Ele se revoltou, esbravejou e ficou quieto no sofá. Não queria correr o risco de – além de perder a eleição – deixar escapar a boa vida que levava. Mesmo assim teve mais de 200 votos. Pessoas a quem prometera uma boquinha, uma vaga, uma posição num cabide de emprego quando eleito. Quem entende o eleitor?
Jolivaldo Freitas