O Brasil acaba de empossar vereadores, prefeitos e vice-prefeitos dos seus 5.561 Municípios. Assim, a partir de 1º de janeiro de 2.013 as cidades brasileiras iniciaram novo ciclo político-administrativo, sendo que em muitos casos, por conta da famigerada reeleição, ocorre a continuidade dos atuais gestores.
Agora começam a se descortinar o lado obscuro dos apoios políticos dados na campanha. A ocupação dos cargos é um dos indicativos dos acordos honrados ou não. Também a distribuição das compras, das obras e concessão de serviços públicos, a exemplo das linhas de transporte ou coleta do lixo, são outros indicativos de quem apoiou e porque, ou melhor dizendo, por quanto apoiou o prefeito.
Num regime democrático, é absolutamente normal que se façam coligações entre diversas forças políticas e que as pessoas colaborem com as campanhas eleitorais. No entanto, o Brasil vive o processo acelerado de decomposição ideológica de sua ação política, em que a boa e salutar espertasse estratégica cede cada vez mais espaço a pura esperteza empresarial. Com isto, as coligações já não se formam por afinidades programáticas, mas pelas vantagens que os coligados proporcionarão na campanha e no Governo; as doações de campanha já não têm por estímulo o que o candidato fez no passado, mas o que ele garante ao doador num breve futuro. E assim o País assiste a espetáculos da mais pura politicagem.
Aprendemos desde muito cedo que a gratidão é uma virtude. Mas será que na política o indivíduo tem que levá-la as últimas consequências?
Não há nada de errado no compartilhamento de espaços políticos, desde que isto se dê em bases axiológicas. Nesta perspectiva, a meritocracia tem que ser o princípio mais importante, de modo que os espaços sejam distribuídos segundo a congruência entre o programa do partido com o programa do prefeito para cada área de atuação. E a ocupação do cargo seja feita por quem tenha comprovadamente preparo para o seu desempenho. Se o partido não tem nenhuma política específica para a pasta que almeja, ou a que tem não está em sintonia com a plataforma do ex-candidato, agora prefeito, ou se indica para o cargo quem não tem experiência com o assunto, ou, pior que isto, não seja moralmente idôneo, o Gestor não está obrigado a “honrar” o provável acordo de campanha, sem que lhe caiba a pecha de ingrato.
A palavra gratidão vem do latim gratus, que tanto pode significar agradável quanto agradecido. Ora, para um Prefeito sério e cioso de suas responsabilidades, não deve ser nada agradável lidar com auxiliares incompetentes ou corruptos. Nem poderá esse Prefeito honrado (ainda tem), ficar agradecido a um Partido ou aliado por ter lhe “dado” um presente de grego na pessoa de um secretário despreparado, causador de problemas, malversador de verbas públicas, que vai comprometer a imagem de todo um Governo.
A propósito, como a gratidão encerra um sentimento de dívida, cabe indagar: as “dívidas” do candidato tem que ser pagas pelo eleito? A confusão entre o público e o privado, que vem a ser o patrimonialismo, é a marca indelével da maioria dos nossos políticos e é a raiz da grande leva das improbidades destes.
A eficiência da máquina estatal passa necessariamente pela profissionalização da Administração Pública. E essa profissionalização será tanto maior quanto menor for o patrimonialismo dos seus Gestores. Na medida em que crescer nos Políticos a compreensão de que gerem bens públicos, que eles são meros agentes da soberania popular, também crescerá a forma impessoal de governar.
Finalizo este artigo lembrando de Gaule, o qual afirmou que, para cumprir com as suas obrigações republicanas, o homem Público tem as vezes o dever de ser um ingrato.
Mário Lima – Advogado