Existe uma necessidade básica do homem moderno em exibir sua própria imagem como um produto comercializável, aspecto imposto pelo capitalismo e assimilado com a evolução dos meios de comunicação. No entanto, esta exigência transformou-se em apelo às coisas mais supérfluas da sociedade, um recrudescimento da ideia de que tudo deve ser mostrado, doa a quem doer. Criou-se um modus vivendi baseado em câmeras que fazem parte do cotidiano, aptas a fotografar ou filmar desde um corpo preso às ferragens de um carro após um acidente a uma modelo que se desnuda ao vivo num programa de TV. O problema se amplificaria de maneira incontrolável com a participação e auxílio da mídia.
O reality show é a mais visível demonstração de que o individuo moderno deseja se ver sem pudores; e não basta apenas que sejam exibidas imagens normais do cotidiano, mas embates entre participantes, embriaguez, padrão de vida distante da realidade e sexo. Do mesmo mal são acometidas as celebridades. Se por um lado rechaçam a presença dos paparazzi, por outro cultivam manias extremamente excêntricas e que de alguma maneira hão de chamar a atenção do público, vide Britney Spears, cantora americana que foi flagrada várias vezes sem peças íntimas no vestuário.
De certa maneira, a privacidade ficou em último lugar quando o assunto é a vida alheia. Não à toa eclodiram nos últimos anos vários programas televisivos e portais de noticia que sobrevivem de informações sobre a vida de famosos. É extremamente natural saber o que fez determinado ator após uma festa; com quem saiu, se dormiu em seu apartamento ou num hotel. Alguns fatos perduram na agenda destes programas por semanas seguidas, prendendo a atenção do público em assuntos que beiram a ridicularia.
O jornalista que arrisca sua vida subindo um morro ao lado da polícia com a pretensão de acompanhar o surgimento da notícia, além de arriscar sua vida, cria um padrão desumano que os obriga a rastejar, morrer ou matar pela exclusividade, para mostrar aquilo que talvez ninguém tenha mostrado. Por este aspecto, qualquer pessoa vive munida de celular com câmera, numa expectativa quase desesperadora de presenciar um fato que interesse à mídia. O espetáculo pode ser uma fantástica perseguição policial ou a passagem de uma celebridade internacional: não faz diferença.
O desejo de se mostrar triunfou em todos os segmentos da sociedade. Assistir a um show de determinado cantor é comprovar que a estrutura, o palco, as luzes, o balé e o som dispensariam inclusive a presença do artista principal. A ínfima proporção do que acontecia no circo ou no teatro adquiriu proporções inconcebíveis. O homem está diante de um mundo cujas imagens valem ouro e depois não valem mais nada. Dissipa-se a razão, os princípios, a ética, mas nunca o desejo por estar num desses palcos da vida, por mais frívolo que seja, alvejando ou sendo alvejado por flashes.
Mailson Ramos é bacharelando do curso de Comunicação Social | Relações Públicas pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB). É colunista do Observatório da Imprensa e do portal Calila Noticias. Criou e administra o blog Opinião & ComTexto. É autor do livro Anjo Devasso e Outros Contos, publicado pela Livraria Saraiva.