Minha amiga atendeu ao meu convite, coisa que venho fazendo há dez anos, para conhecer Salvador. Na primeira vez eu expliquei que viesse de coração aberto e mente quieta, observando apenas o que interessava, que era o patrimônio histórico e o jeito baiano de ser. Que esquecesse o estado físico da cidade, os buracos, a falta de segurança e a vergonha que grassava no semblante do soteropolitano.
Ela não veio, levada que fora por um estágio no Canadá. Há três anos eu disse que viesse, pois a cidade estava ficando limpa, os buracos estavam sendo tapados e tinha até uma iluminação melhor. O governo estadual tinha colocado mais PMs nas ruas e a segurança estava assegurada e até o Metrô, por injunção do governador conseguira atravessar os trilhos de ponta a ponta depois que bateram o pó de anos.
Ela de novo não veio por causa de um filho que nascera. Mas não é que ela decidiu que neste verão sairia de Mariana e viria ver o que a Bahia tem de especial. Juntou a família, as malas, pegou avião, desceu no aeroporto, tomou taxi e foi para uma pousada no Pelourinho. A pequena pousada foi assaltada e levaram tudo. Nem deu tempo de desfazer as malas. Não tive nem tempo de chegar para dar as boas-vindas.
Mas minha amiga é guerreira. Pedi desculpas pelo incidente e ela me disse que já tinha visto coisa pior, quando fez turismo em Cartagena. Foi quando pegou um taxi com algumas amigas e o taxista levou o grupo para uma praia erma e deixou todo mundo lá, fugindo com os pertences. Seu marido trabalhou em Angola e certo fim de semana foi conhecer Cabo, na África do Sul e foi levado num arrastão.
Seu irmão escapou por pouco do Tsunami na Indonésia pois com a passagem comprada foi enviado pela fábrica GM para um trabalho urgente nos Estados Unidos. Escapou. Então fiquei pensando cá com meus botões: será que a família da minha amiga é que é pé-frio? Vejo tanta polícia pela cidade e notadamente no Centro Histórico; vejo guarda municipal, vejo câmeras e seguranças particulares, já andei em tudo que é beco, buraco, quebradas e vielas desta cidade e nunca ninguém me assaltou. Será que a família Faustini (seu sobrenome) atrai ladrão? E tratei de proteger a carteira na cueca.
Para disfarçar meus pensamentos puxei outro assunto e disse que pior seria, atualmente, fazer turismo na Turquia. E o marido dela me diz:
– Não é! Lembra aquele atentado no mercado de Istambul?
– Lembro!
– Por um triz minha irmã não sobrou também.
Foi bem na hora que o sino do Rosário dos Pretos rebimbou. Me arrupiei todo. Será?
Jolivaldo Freitas – Escritor e Jornalista