O povo de Hong Kong tem tudo para comemorar uma vitória que pode ser da democracia, da liberdade de expressão, da liberdade face à autocracia. Com o comunicado da chefe de governo de Carrie Lam, de cancelar de vez a lei da extradição que nos últimos meses foi motivo de manifestações e confrontos entre a população e as forças policiais, entra-se num processo novo, mas tem de tomar cuidado, ficar atento e forte: o governo chinês, com certeza, não vai deixar passar batido. O que está por vir não se sabe, mas que vem coisa, isso vem.
Lam garante que o governo vai retirar formalmente o projeto de lei de modo a afastar totalmente as preocupações do público. Tanto que informou que o secretário de Segurança apresentará uma moção de acordo com as regras, quando o conselho legislativo se voltar a reunir em alguns dias. É uma nova situação. Ela pretende a partir deste setembro, buscar empatia com a comunidade da ilha, visando buscar um diálogo que seja maia direto e dentro das aspirações reveladas pelos manifestantes e ativistas da democracia, liberdade e autonomia. Ela já fez até convite para que pessoas de todas as camadas da sociedade, mesmo com diferentes crenças e origens, venham a participar do diálogo e partilhar pontos de vistas e notadamente as queixas, como forma de encontrar um jeito para resolver o amplo descontentamento da sociedade e procurar soluções. E Hong Kong mostrou sua insatisfação frente aos administradores da ilha e aos líderes de Pequim, que queriam uma brecha para punir quem fosse cativo em função de atividades consideradas “criminosas”.
Lembrando que a lei em questão permitiria a extradição de suspeitos de crimes para a China continental, onde os tribunais são controlados pelo Partido Comunista. O que se espera agora que o governo atente para a relação de reivindicações dos protestadores, a exemplo da libertação dos manifestantes. Também é requerido que as ações dos protestos não sejam identificadas como motins e pede-se um inquérito para apurar a violência policial. Com certeza que os manifestantes não estarão satisfeitos enquanto não ocorrer a demissão da chefe de governo, embora Carrie Lamse recuse à criação de uma comissão de inquérito independente e a anistia aos manifestantes detidos. Ela rejeita. Vai dar problema.
Com certeza Lam tem medo, tanto que vem sustentando o conceito de que a discussão sobre o sufrágio universal para o cargo de chefe de governo e para o parlamento de Hong Kong, itens que os revoltosos vinham pedindo desde o início dos conflitos, só deve se realizar num ambiente favorável e não polarizado. Só não disse favorável a quem. Ela vai desenvolver estudos para que sejam determinados os motivos que levaram à insatisfação popular, fazendo de conta que não sabe. Como se esquecesse que os protestos, iniciados na ex-colônia britânica em maior, foram originalmente motivados pela lei da extradição, mas que acabaram por evoluir para uma campanha pela democracia.
Na realidade sofrendo pressão Lam havia suspendido a proposta desde meados de junho, mas os manifestantes querem mesmo é que peça para sair. Ela tenta resistir, mas com certeza sua atuação não deve estar gradando à cúpula chinesa que não teve coragem de mandar seu exército invadir a ilha. Deve ter lembrado que milhares de empresas com sede no ocidente têm representação na ilha. É bom lembrar que desde 2016 uma nova força vem se impondo em Hong Kong. Uma nova geração de jovens pró-independência que com apoio popular conquistou lugar no Conselho Legislativo (Parlamento). Os representantes da democracia conseguiram quase metade dos assentos. Hoje já se fala em separar Hong Gong da China. Muita água ainda vai rolar nessa ilha.
Escritor e jornalista. Email: Jolivaldo. [email protected]