Com a confirmação do impeachment da agora ex-presidenta da República Dilma Rousseff, Michel Temer assume em definitivo o cargo. Apesar de, na comparação com sua antecessora, dispor de maior apoio no Congresso Nacional, Temer não terá vida fácil nos dois anos de mandato que ainda restam. Na opinião de especialistas, ele precisará manter sua base parlamentar em cenários de ajuste fiscal e Operação Lava Jato.
Segundo Débora, Dilma caiu por motivos distintos dos citados no processo. Em seus discursos, alguns senadores chegaram a citar os chamados “conjunto da obra” e “estelionato eleitoral”, endossando a tese da socióloga.
Mudanças
Por isso, ela avaliou que o momento impõe a necessidade de discutir uma reforma política e o sistema de governo do país. “A falta de apoio é margem para um primeiro-ministro cair e não o presidente. Ou observam as regras democráticas ou fica esse perigo que estamos assistindo.”
Para o cientista político Cristiano Noronha, vice-presidente da empresa de análise política Arko Advice, as discussões devem ser sobre o número de partidos e o que ele chama de “loteamento do governo”.
Noronha disse entender que Temer navegará em águas mais tranquilas que Dilma, mas nem por isso terá dois anos fáceis pela frente. Para o cientista político, o novo presidente precisará dar andamento ao ajuste fiscal em meio a novos capítulos da Operação Lava Jato.
“Novas delações premiadas vêm aí. Novos políticos podem ser envolvidos e não se sabe qual partido será atingido. Isso é um fator de instabilidade grande”, completou o cientista político.
Credibilidade
Cristiano citou ainda a importância de ajustar as contas públicas para inspirar credibilidade no mercado financeiro.
Para Débora, a classe trabalhadora poderá sair perdendo com os cortes que Temer eventualmente promoverá. “Espero que não, mas temo que a classe trabalhadora vá perder muito. Em termos de direitos, de acesso às políticas públicas, pelo que é divulgado por aqueles que organizam a política econômica do país, acredito em muitos cortes nessa direção”.
Jogo político
Noronha concorda com Débora a respeito do uso de argumentos estranhos ao processo e utilizados para retirar Dilma da Presidência. Segundo ele, considerar outros fatores além das chamadas “pedaladas fiscais” faz parte de um julgamento em uma casa política.
“Num processo julgado por políticos, eles acabam sendo influenciados por outros fatores. Por isso, a economia pesa, a popularidade e personalidade da presidente pesam. Há uma série de outros fatores que acabam interferindo nessa decisão que é política também. É um processo do jogo”.
O cientista acrescentou que, quando a Constituição deu a prerrogativa de julgamento ao Congresso Nacional, assumiu-se que o julgamento não se daria apenas no mérito jurídico, mas também no político.
Conforme Débora Messenberg, a esquerda do Brasil e do mundo está em crise e precisa se reinventar. “Acho que a esquerda tem de se reinventar no mundo inteiro, não só no Brasil. Depois da queda do muro [de Berlim], temos claramente um projeto liberal e neoliberal em expansão e a esquerda não teve um projeto de fato que enfrentasse. Então, vemos uma série de governos ditos como trabalhistas, mas que acabaram adotando uma política econômica liberal, neoliberal”.