O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o ex-ministro da Fazenda Pedro Malan prestaram depoimento à Justiça Federal hoje (12) como testemunhas indicadas pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de seu filho caçula, Luís Cláudio Lula da Silva – acusados na Operação Lava Jato pelos crimes de tráfico de influência, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
Também foram ouvidos pelo juiz da 10ª Vara da Justiça Federal, em Brasília, Vallisney de Souza Oliveira, o ministro da Defesa do governo Lula, Nelson Jobim, e o ministro da Justiça do governo Dilma Rousseff, José Eduardo Cardozo. Os quatro depoimentos foram prestados por teleconferência.
A Justiça Federal apura a suspeita de que Lula e seu filho “integraram um esquema que vendia a promessa” de interferências no governo federal para beneficiar empresas. De acordo com a denúncia do Ministério Público Federal (MPF), aceita pela Justiça no fim de 2016, os réus participaram de negociações irregulares no contrato de compra dos aviões caças suecos Gripen e na edição de uma medida provisória que prorrogou a concessão de incentivos fiscais para montadoras de veículos.
São réus neste mesmo processo os consultores Mauro Marcondes Machado e Cristina Mautoni, donos da Marcondes e Mautoni Empreendimentos, empresa que representava os interesses do Grupo Caoa (distribuidor brasileiro das marcas Subaru e Hyundai) e da MMC Automotores (Mitsubishi do Brasil). Segundo o MPF, Luís Cláudio Lula da Silva recebeu R$ 2,5 milhões da empresa dos consultores.
Sobre a aquisição dos caças, FHC e Jobim afirmaram que, desde o início do processo de escolha dos aviões que renovariam a frota da Força Aérea Brasileira (FAB), a preferência do Comando da Aeronáutica era pelos caças suecos Gripen NG, da Saab. Ainda durante o segundo governo Lula, autoridades chegaram a informar que já os caças Rafale, da francesa Dassault, tinham sido os escolhidos. A informação, no entanto, foi negada em sgeuida. E só após quatro anos o governo enfim anunciou que tinha optado pelos caças suecos, a um custo inicial de US$ 4,5 bi.
“A competição, no meu tempo, era entre os aviões franceses e os suecos. Ao fim de um longo processo, houve uma reunião no Palácio do Planalto em que a Aeronáutica escolheu os suecos, que estavam mais dispostos a nos transferir tecnologia”, disse o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que afirmou não ter concluído o negócio à época para não deixar a dívida para o governo seguinte.
Em seu depoimento, Nelson Jobim, que comandou o Ministério da Defesa de 2007 a 2011, disse que a decisão de renovar a frota da FAB se arrastou de 1995 a 2013. De acordo com o ex-ministro, um relatório de 2010, da Aeronáutica, pode confirmar que, desde o início, a preferência do Comando da Aeronáutica sempre foi pelo caça sueco. “[Ainda assim] Optamos pelo Rafale, da francesa Dassault, que garantia a total transferência de tecnologia, enquanto o governo francês se comprometia a adquirir aviões da Embraer”. De acordo com Jobim, a opção pelas aeronaves francesas foi feita informalmente em 2010, ano de eleições presidenciais, mas Lula também preferiu deixar que seu sucessor fechasse o contrato e encerrasse o processo.
Questionado pelo advogado de Lula se tinha conhecimento de que o petista tenha agido para influenciar Dilma Rousseff a recuar da decisão anterior e escolher os caças suecos, Jobim disse jamais ter sofrido pressão ou percebido qualquer inclinação de Lula por qualquer concorrente, mas destacou que, após deixar o governo, em agosto de 2011, se afastou totalmente da negociação. “Que eu saiba, a FAB continuava interessada no caça sueco”.
Quando o MPF denunciou Lula, a defesa do ex-presidente afirmou que os acusados não participaram ou tiveram conhecimento dos atos de compra dos caças suecos e que acusá-los de ter interferido no processo significa “atacar e colocar em xeque as Forças Armadas e todas as autoridades que acolheram o parecer emitido por seus membros”.
Setor automotivo
Sobre a edição da Medida Provisória 471/2009, que prorrogou a concessão de incentivos fiscais às montadoras e fabricantes de veículos instalados nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste ao fim do governo Lula, FHC e o ex-ministro da Fazenda Pedro Malan disseram que a renúncia de receitas é uma estratégia comum e válida para promover o desenvolvimento e o equilíbrio socioeconômico entre as diferentes regiões do país. No entanto, segundo eles, a decisão exige tempo para ser discutida com todos os ministérios e interessados no assunto.
“Qualquer decisão desta é complexa. É preciso verificar seus efeitos para a competição, para os estados e municípios”, disse FHC. “Todo e qualquer governo adota algumas medidas que dizem respeito ao desenvolvimento regional. No governo FHC isso era feito para permitir uma descentralização da atividade econômica. Mas o fazíamos atentando para as finanças públicas”, acrescentou Malan, garantindo que, durante sua passagem pelo governo, decisões sobre concessão de incentivos eram interministeriais, frutos de “longo processo de negociação”.
Segundo o MPF, representantes de montadoras automotivas prometeram pagar “vantagens indevidas” a agentes políticos em troca da edição de medida provisória que os favorecesse. Ainda segundo o MPF, a MP 471foi aprovada com velocidade atípica. A defesa de Lula nega a participação do ex-presidente e de seu filho em qualquer ato relacionado à prorrogação de benefícios fiscais. Ainda segundo a defesa do ex-presidente e de seu filho, Luis Claudio recebeu da Marcondes & Mautoni remuneração por trabalhos relacionados à realização de campeonatos de futebol americano no Brasil.
Jornal do Brasil