Pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) identificaram, em laboratório, que o antirretroviral atazanavir pode inibir a replicação do novo coronavírus em células infectadas. Os resultados obtidos ainda precisam ser confirmados através de testes clínicos com pacientes para que o medicamento se torne uma possibilidade no combate à doença.
A pesquisadora Milene Miranda, do Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), avaliou que os resultados foram muito promissores, já que o antirretroviral, usado no combate ao HIV, não só inibiu a replicação viral como reduziu o quadro inflamatório das células infectadas.
“Se a pessoa tem um processo inflamatório menor, ela tem um melhor prognóstico”, resumiu a bióloga.
Para a realização dos ensaios in vitro, pesquisadores utilizaram um isolado viral produzido a partir de uma amostra de paciente infectado no Rio de Janeiro. Antes dos ensaios, a metodologia contou com a utilização de análises de modelagem computacional para simular como o atazanavir interage com a enzima usada pelo vírus para se replicar no corpo humano.
O trabalho foi enviado para a revista científica Nature Communications e disponibilizado para a comunidade científica internacional em formato preprint – sem revisão formal por outros especialistas da área -, o que acelera a troca de informações entre pesquisadores, enquanto os trâmites de uma publicação científica seguem paralelamente.
Milene Miranda explica que uma das vantagens da pesquisa com medicamentos já utilizados para outras doenças é a possibilidade de superar mais rapidamente às exigências regulatórias, caso os próximos experimentos confirmem que a substância poderia ser utilizada contra o coronavírus.
“Quando você descobre um novo medicamento, entre descrever uma atividade in vitro e ter esse medicamento podendo ser administrado, isso pode levar 20 anos. Mas, quando se observa um segundo uso para um fármaco que já é utilizado, você consegue agilizar algumas dessas etapa”, afirma ela.
Ação diferente
A pesquisa também mostrou que, nos ensaios em laboratório, o atazanavir apresentou um funcionamento diferente do que a cloroquina poderia ter no combate ao vírus, caso sua efetividade seja cientificamente comprovada. “São mecanismos diferentes de ação que poderiam ser combinados”, disse Milene.
A bióloga adverte, entretanto, que os resultados dos testes não são suficientes para a administração do remédio em pacientes com coronavírus, muito menos devem motivar automedicação. “Nosso principal alerta é que esse é um experimento, não é um ensaio clínico. Ainda tem etapas a serem cumpridas. O objetivo foi chamar atenção para um segundo uso de um medicamento. E não para que se saísse por aí tomando o atazanavir”, afirma. “A automedicação nunca é indicada.”
A pesquisa
Ao todo, 18 pesquisadores participaram do estudo com o atazanavir, o que incluiu o Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde (CDTS/Fiocruz), o Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) e o Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz), com colaboração do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino e da Universidade Iguaçu.
O financiamento da pesquisa contou com recursos da Fiocruz, da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal (Capes).
“A gente chama a atenção para a importância do trabalho de pesquisa, a importância do trabalho colaborativo entre os laboratórios e da importância do investimento. É só com investimento que a gente consegue fazer esses estudos. Investimento pesado em capacitação de pessoal, infraestrutura e insumos”, defendeu Milene Miranda.
Agência Brasil