A desvalorização do real superou as perdas do peso argentino, colocando a moeda com o segundo pior desempenho do ano, de acordo com levantamento feito a pedido da por Einar Rivero, sócio fundador da Elos Ayta Consultoria.
A pesquisa considerou 23 moedas globais. Ao longo da semana, até a quarta-feira (19), o real tinha a maior desvalorização do índice.
Mas, nesta sexta-feira (21), a divisa norte-americana fechou em queda de 0,38%, dando um pequeno alívio para o real. O dólar era negociado em R$ 5,441, registrando, ainda assim alta de 1,12% na semana. No ano, a valorização do dólar em comparação ao real vai ainda mais longe: 12,40%.
O que chama atenção é que a moeda brasileira passava por um momento positivo forte no final do ano passado. Entre os fatores que impulsionaram os ativos brasileiros, estava a perspectiva favorável em relação ao exterior.
Alexandre Cabral, professor de Finanças da Saint Paul Escola de Negócios, explica que esse sentimento otimista atraiu os investidores estrangeiros ao país, levando a cotação da divisa norte-americana para baixo. No fim de dezembro, o dólar era negociado na faixa de R$ 4,90.
“[O capital externo] veio para o Brasil com a esperança de que os juros nos Estados Unidos caíssem em março. Se o juro cai nos Estados Unidos, a moeda vai para o mundo”, explica.
Mas Cristiane Quartaroli, estrategista de câmbio e economista-chefe do Ouribank, relembra que o movimento era uma antecipação por um momento que eventualmente não veio a acontecer com o adiamento dos cortes dos juros pelo Federal Reserve (Fed, o BC dos EUA).
“Isso também favorecia as moedas emergentes de forma geral”, explica.
Porém, 2024 começou desfavorável para a realização desses cortes nos EUA. A economia norte-americana vem mostrando resiliência, com um mercado de trabalho aquecido, atividade mantendo força, além de preocupações com a trajetória da inflação.
“Diante deste cenário, e de fatores geopolíticos que também influenciam este movimento, como os conflitos de abril entre Irã e Israel, o Federal Reserve postergou o início do ciclo de cortes de juros”, avalia Berenice Damke, professora do Insper e especialista em hedge, derivativos e gestão de riscos financeiros da Damke Consultoria.
Mas não só de decepções com o exterior se fez a valorização do dólar. A queda do real também foi puxada por fatores internos.
Neste aspecto, Damke aponta o aumento da percepção com o risco fiscal, que até o ano passado não havia pressionado tanto o humor dos investidores.
“Em 2023, a valorização do real refletiu o alívio em relação aos temores fiscais. Mesmo com as incertezas em relação às contas públicas, houve uma percepção positiva sobre o mercado de melhora ao longo do ano, dado a aprovação do arcabouço fiscal, e considerando os esforços da equipe econômica para elevar a arrecadação e atingir a meta de déficit primário zero em 2024”, relembra Damke.
Porém, em abril deste ano, a “montanha-russa” entrou no trecho de descida.
Com a revisão da meta fiscal para 2025 — de um superávit primário para déficit zero —, começaram a crescer os temores sobre a responsabilidade fiscal do governo.
“Para o mercado, a alteração da meta sinaliza uma abertura para a ampliação dos gastos por um governo com dificuldades de elevar receitas”, aponta Damke.
A mais recente investida do governo para manter a arrecadação em alta, foi o envio da medida provisória que visa fechar brechas na legislação sobre crédito presumido PIS/Cofins não ressarcível e na compensação PIS/Cofins limitada.
A medida, contudo, foi mal recebida gerou críticas de parlamentares e dos setores da economia, a ponto de ser devolvida na semana seguinte de seu envio.
Com os juros se mantendo elevados por mais tempo nos EUA, o cenário tende a ser desfavorável para o resto do mundo como um todo. Porém, mesmo que o “externo esteja ruim [para todos], o Brasil fica no fim da fila por causa das razões internas”, diz Evandro Buccini, sócio e diretor de Crédito e Multimercados da Rio Bravo Investimentos.
“As metas vêm piorando muito para os próximos anos. E é um problema que vai até o político-econômico com os ataques do Lula ao Banco Central”, aponta Buccini.
Cristiane Quartaroli reforça que esse risco institucional não é bem visto pelo investidor do exterior, que acaba evitando o mercado pelas incertezas que esse risco causa.
“O risco institucional e fiscal no país piora o nosso prêmio de risco, e aí isso traz pressão para a nossa taxa de câmbio, que é o que a gente está vendo mais recentemente e é o que é causa essa divergência entre o real e as demais moedas emergentes”, aponta a estrategista de câmbio e economista-chefe do Ouribank.
Não obstante, a alta do dólar ante o real, apesar de ser observada desde o começo do ano, ganhou muito mais força em abril.
Perspectiva
De acordo com as projeções do Prisma Fiscal, pesquisa de mercado realizada pelo Ministério da Fazenda, a dívida pública deve se estabilizar apenas entre 2032 e 2033 no patamar de 90% do PIB.
“O sarrafo está bastante alto para as pessoas acreditarem nas possíveis mudanças positivas de política econômica dado tudo que aconteceu. Então, o governo vai ter que realmente mudar de direção para convencer os mercados”, avalia Buccini.
Mas há quem defenda que essa mudança já pode estar acontecendo.
“A gente acredita que o governo vai tomar medidas que sejam, não as ideais, mas que próximas do que sejam necessárias para se ter um controle maior dos gastos, e que possam ajudar a dinâmica fiscal em 2025 e 2026”, aponta Luciano Costa, economista-chefe da Monte Bravo.
E não só pelo doméstico, mas o exterior tende a ficar mais favorável para o Brasil com a expectativa dos analistas de ao menos um corte dos juros nos EUA ainda neste ano, o que deve tirar parte da pressão sobre os indicadores brasileiros.
“Claro que vai depender muito das questões fiscais, mas pensando em pano de fundo macroeconômico e pensando em cenário externo, a gente deveria ver um dólar mais baixo até o final desse ano”, aponta a economista-chefe do Ouribank.
O último Boletim Focus divulgado pelo Banco Central aponta que o mercado vê o dólar cotado em R$ 5,13 no final deste ano.
Fonte: CNN