Sem dinheiro nos cofres e com dificuldade para quitar a folha de pagamento dos funcionários, cerca de 75% das prefeituras baianas decidiram demitir trabalhadores para fechar as contas no final do ano. A menos de dois meses de 2017 acabar e sem previsão de aumento da receita, além das dispensas de trabalhadores, pelo menos 50% dos prefeitos não devem conseguir pagar o 13º integralmente, segundo estimativa da União dos Municípios da Bahia (UPB).
As exonerações de trabalhadores começaram em agosto, quando os gestores perceberam as dificuldades para fechar as contas e pagar os salários. A situação gera um grave problema social, especialmente nas pequenas cidades, onde o serviço público representa a maior fonte empregadora.
Além disso, os prefeitos também temem ultrapassar o limite constitucional de gastos com pessoal – 54% da receita total -, principal fator que leva à rejeição das contas pelo Tribunal de Contas dos Municípios (TCM).
Com o balanço das finanças reprovado, além de pagarem multas, eles ficam inelegíveis. No ano passado, 39% dos prefeitos tiveram as contas referentes a 2015 rejeitadas pelo TCM – 163 casos. Nos julgamentos das finanças de 2016, iniciado em setembro, 28 das 52 contas analisadas foram reprovadas – cerca de 54% do total.
Os gestores ainda enfrentam redução do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), principal fonte de renda de 90% das cidades brasileiras, sobretudo as menores, que não têm arrecadação própria. Segundo a Confederação Nacional dos Municípios (CNM), o repasse do fundo de outubro reduziu 7,5% em relação ao mesmo período de 2016.
Na Bahia, foram enviados em torno de R$ 419 milhões em outubro para as 417 cidades – cerca de 5% a menos em relação ao mesmo mês de 2016.
Mais perdas
No ano passado, os cofres municipais já estavam vazios, mas, em dezembro, as prefeituras baianas receberam em torno de R$ 533 milhões referentes aos recursos do programa de repatriação.
O valor amenizou as dificuldades e ajudou a fechar o balanço do ano. Em todo o Brasil, foram repartidos R$ 4,4 bilhões entre as mais de cinco mil cidades. Mas, este ano, as promessas do governo federal de repasses bilionários da repatriação não foram cumpridas e o valor transferido foi de 5% do encaminhado em 2016 – muito aquém do esperado.
Em Itaeté, no Centro-Sul da Bahia, por exemplo, o município recebeu R$ 861,3 mil em 2016 e só R$ 41 mil este ano. O prefeito Valdes Brito de Souza (PT) ainda não fez o balanço dos cortes, mas diz que serão cerca de 200 demissões na prefeitura.
Outra preocupação dos gestores é que os recursos enviados pela União não pagam os custos dos programas do próprio governo federal. Segundo o presidente da UPB, Eures Ribeiro (PSD), as prefeituras precisam injetar entre 35% e 40% do valor total dos custos das ações federais para mantê-las funcionando minimamente.
“O valor enviado pelo governo federal para Samu e PSFs, por exemplo, não é atualizado há 15 anos. Nesse período, todos os custos aumentaram”, revela Eures, que é prefeito de Bom Jesus da Lapa, no Vale do São Francisco, e também demitiu funcionários.
Os repasses insuficientes são um problema em Santana, no Extremo-Oeste, onde o prefeito Marco Aurélio Cardoso (PP) diz gastar 100% do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) somente para pagar a folha: “E tenho que colocar mais 53% do que vem do Fundeb para complementar e pagar. Está insustentável”.
Ele diz que tem segurado para não demitir, mas admite que a medida é necessária. Em Santana, o 13º será parcelado.
Em Sítio do Mato, o prefeito Alfredo de Oliveira Magalhães Junior (PDT) não sabe como pagar o 13º salário.
Mesmo com as demissões já em curso, ele acredita que não conseguirá fechar as contas. “Este ano, as prefeituras vão entrar em colapso, porque ninguém vai conseguir fechar conta. Tem que demitir, mas os concursados não podemos. Não tem mais de onde cortar”, diz.
Impacto na população
A dificuldade com os repasses federais tem freado a adesão a programas. Eures Ribeiro conta que os prefeitos evitam construir Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) para não criarem novos gastos.
Ele revela que 35 municípios têm unidades construídas e prontas para funcionar, mas os gestores não conseguem recursos para isso. É o caso de Macaúbas, no Centro-Sul. Construída há mais de três anos, a UPA de lá ainda não foi aberta por falta de recursos.
“Tem prefeito que nem quer mais UPA. O problema nem é construir, mas manter. Essa relação de casa grande-senzala do governo federal conosco tem acabado com a gente”, reclama Eures.
Demissões são realidade ainda em Euclides da Cunha, Itaparica e Matina. Em Lagoa Real, o prefeito Pedro Cardoso (PMDB) tenta não demitir.
Em Euclides da Cunha, foram 100 postos cortados em setembro e mais 50 devem sair em novembro, segundo o prefeito Luciano Pinheiro (PDT). “Estamos fazendo um esforço diário e acredito que vamos fechar 2017 com dificuldade, mas dentro dos índices constitucionais”, diz. Em Itaparica, o número de demissões já chega a 150, conforme a prefeita Marlylda Barbuda (PDT).
Plenajemento
Apesar da crise, algumas cidades estão evitando demissões e conseguindo pagar as contas em dia. Ibirapitanga, município no Sul da Bahia, é uma delas. O prefeito Isravan Lemos Barcelos (PSD), reeleito no ano passado, contou que fez planejamento orçamentário na gestão anterior já prevendo o período de “vacas magras”.
Salários, fornecedores e demais obrigações estão em dia. “Estamos conseguindo atender aos limites legais. As dificuldades são muitas, mas estamos conseguindo manter os serviços funcionando sem demitir”, afirma.
Ele diz que a receita para conseguir driblar a crise foi planejar diariamente.
Em Ribeira do Pombal, na região Nordeste da Bahia, as contas também estão em dia. Mesmo com as dificuldades enfrentadas, o prefeito Ricardo Maia (PSD) diz que tem conseguido manter o funcionamento dos serviços essenciais e ainda fazer investimentos em obras para a cidade, a exemplo da construção de escolas e manutenção de vias públicas.
Além disso, o gestor diz que a prefeitura mantém dinheiro em caixa para investimentos e emergências. “Tivemos que planejar muito bem, com uma gestão técnica e buscando a eficiência”, afirma Ricardo Maia.
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