A baixa do Rio São Francisco, causada por uma das piores estiagens dos últimos 100 anos, em Juazeiro, norte da Bahia, fez a escultura “Nego D’Água” aparecer na superfície da areia, quando antes ficava sob a água. A estrutura tem 12 metros de altura.
“Nunca imaginei que eu viria andando para o Nego D’água, porque a gente vinha de barco. Com essa seca toda aí, isso dói no coração e na alma”, lamenta o pescador Erenildo de Souza.
A seca mudou a paisagem das ilhas da região, com muitos bancos de areia e pedras que surgiram no rodeadouro nos últimos anos. O pescador afima ainda que a falta de vazão reduziu a diversidade de peixes no Velho Chico.
“Geralmente a gente pegava quatro espécies de peixe. Agora a gente só pega o ‘pacu’. Então, o ‘curimatá’, o ‘piau cascadura’ e o ‘piau cabeçudo’ a gente não pega mais”, conta Erenildo.
A seca no rio tem mudado também a rotina de quem costuma pegar as barcas que fazem travessia entre Juazeiro e Petrolina. Nas últimas semanas, os passageiros precisam esperar, porque as embarcações estão com dificuldade para navegar. A profundidade no trecho de navegação, que chega a mais de 10 metros em tempos de cheia, reduziu para pouco mais de 5 metros.
“Com a baixa vazão do rio, ficou só o canal de entrar e sair. Semana passada, uma embarcação encalhou e eu tive que transferir os passageiros para outra embarcação”, relata o comandante Gilberto Avelino de Souza Filho.
Com a falta de chuva na nascente do Rio São Francisco, em Minas Gerais, a Agência Nacional de Águas (ANA) e o Ibama autorizaram a redução da vazão da saída de água da barragem de Sobradinho para 600 metros cúbicos por segundo, a menor registrada desde o início de operação da usina, em 1979. O volume de água do reservatório atualmente é de pouco mais de 11%.
A degradação e o uso desordenado da água são outros fatores que contribuem para a baixa do rio. “O que a gente tem é um rio minguante e que muita gente atribui à seca do momento. A seca do momento influencia, mas se nós tivéssemos aquíferos com água, a gente não estaria na situação que a gente está hoje. Se a gente continuar desmatando e impactando o cerrado, a gente vai perder os volumes de água do São Francisco e os especialistas nos dizem que, nesse sentido, o São Francisco vai morrer junto com o cerrado”, avalia o membro de Pastoral da Terra, Roberto Malvezzi.